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Olhemos primeiro para o caso do Cardeal Mindszenty, acusado de enganar o povo Húngaro e colaborar com os inimigos, os Estados Unidos. Em sua exposição sobre o aprisionamento do Cardeal Mindszenty, Stephen K. Swift graficamente descreve três típicas fases no “processamento” psicológico de prisioneiros políticos. A primeira fase é dirigida a extorquir a confissão. A vítima é bombardeada com perguntas dia e noite. É inadequadamente e irregularmente alimentada. Não lhe é concedida quase nenhum descanso e permanece na câmara de interrogatório por horas sucessivamente enquanto seus inquisidores se revezam. Fome, exaustão, vistas embaçadas e doloridas sob lâmpadas fortíssimas, o prisioneiro torna-se pouco mais que um animal caçado.
- “… quando o Cardeal estava de pé por sessenta e seis horas [relata Swift], ele fechou seus olhos e permaneceu calado. Nem mesmo respondeu as perguntas com negações. O coronel encarregado do turno bateu no ombro do Cardeal e lhe perguntou por que não respondia. O Cardeal respondeu: ‘Termine tudo. Mate-me! Estou pronto para morrer! ’ Disseram-lhe que nenhum mal lhe aconteceria; que poderia terminar tudo isso simplesmente respondendo a certas questões.
- “… Pela manhã de Sábado ele dificilmente poderia ser reconhecido. Pediu por outra bebida e desta vez recusaram-lhe. Suas pernas e pés se incharam de tal maneira que lhe causavam intensa dor; caiu diversas vezes”
Aos horrores que as vítimas acusadas sofrem “de fora” devem ser acrescentados os horrores “de dentro”. Ele é perseguido pela instabilidade de sua própria mente, que não pode sempre produzir a mesma resposta a uma questão repetida. Como um ser humano com uma consciência, ele é perseguido por possíveis sentimentos de culpa escondidos, por mais piedoso que fosse, que minam sua compreensão racional de inocência. O pânico do que sofre lavagem cerebral é a total confusão que ele sofre sobre todos os conceitos. Suas avaliações e normas estão destruídas. Já não pode mais crer em nada objetivo exceto na lógica ditada e doutrinada daqueles que são mais poderosos que ele. O inimigo sabe que, muito além do exterior, a vida humana é feita de contradições interiores. Ele usa esse conhecimento para vencer e confundir aquele que sofre a lavagem. A contínua alternância entre os interrogadores torna ainda mais impossível crer num pensamento concatenado. Dificilmente a vítima se ajustou a um inquisidor quando ela tem que mudar seu foco de alerta para outro.
Ainda, esse conflito interno de normas e conceitos, essa contradição interna de ideologias e crenças é parte da doença filosófica de nossos tempos!
Como um ser social, o Cardeal é perseguido pela necessidade de bons relacionamentos humanos e companheirismo. A sugestão constantemente reiterada de suas culpas o empurra para a confissão. Como um indivíduo sofredor ele é chantageado por uma necessidade interna de ser deixado sozinho e despreocupado, mesmo que por poucos minutos. De dentro e de fora ele é inexoravelmente levado a assinar a confissão preparada por seus perseguidores. Por que ele deveria resistir ainda mais? Não há testemunhas visíveis para seu heroísmo. Ele não pode provar sua coragem moral e retidão após sua morte. O coração da estratégia da lavagem cerebral é retirar toda esperança, toda antecipação, toda crença no futuro. Ela destrói os próprios elementos que mantém a mente viva. A vítima está absolutamente sozinha.
Se a mente do prisioneiro se mostra muito resistente, narcóticos são dados para confundi-la: mescalina, maconha, morfina, barbiturato, álcool. Se seu corpo sofre um colapso antes de sua mente capitular, ele recebe estimulantes: benzedrina, cafeína, coramina, todos para ajudá-lo a preservar sua consciência até confessar. Muitos dos narcóticos e estimulantes que ultimamente ajudam a induzir a dependência mental e leva à confusão podem também criar uma amnésia, comumente um completo esquecimento da própria tortura. As técnicas de tortura conseguem o efeito desejado, mas a vítima esquece o que realmente aconteceu durante o interrogatório. Os clínicos que fazem trabalho terapêutico com derivados de anfetaminas que quando injetadas no sistema sanguíneo ajudam pacientes a se lembrarem de experiências há muito esquecidas, são familiares com a habilidade das drogas de trazer um tranqüilo esquecimento do período durante o qual o paciente era drogado e questionado.
Após, a vítima é treinada para aceitar sua própria confissão, tal como um animal é treinado a fazer pequenos truques. Falsas admissões são relidas, repetidas, marteladas em seu cérebro. Ele é forçado a reproduzir, de memória, várias e várias vezes as ofensas fantasiadas, detalhes fictícios que finalmente o convencem de sua criminalidade. No primeiro estágio ele é forçado à obediência mental por outros. No segundo ele entra num estágio de auto-hipnose, convencendo a si mesmo dos crimes fabricados. Conforme Swift: “As perguntas durante o interrogatório agora tratam com detalhes da ‘confissão’ do Cardeal. Primeiro, suas próprias afirmações são lidas para ele; então, afirmações de outro prisioneiros acusados de cumplicidade com ele; após, elaborações daquelas afirmações. Às vezes o Cardeal estava melancólico, outras enormemente perturbado e excitado. Mas ele respondia todas as perguntas de bom grado, repetia todas as afirmações uma, duas, até três vezes quando assim lhe era pedido”. (Lassio)
Na terceira e última fase do interrogatório e lavagem cerebral, o acusado, agora completamente condicionado e aceitando sua culpa imposta, é treinado a lançar falsos testemunhos contra si mesmo e outros. Ele não tem que se convencer mais através da auto-hipnose; ele apenas fala “a voz do seu senhor”. É preparado para um julgamento, completamente amaciado; torna-se cheio de remorsos e desejoso de ser sentenciado. É um bebê nas mãos de seus inquisidores, nutrido como um bebê e tranqüilizado por palavras como um bebê.
(The Rape of the Mind, The Psychology of Thought Control, Menticide, and Brainwashing. Joost A. M. Meerloo, M.D; The Techniques of Individual Submission; Chapter One – You too would confess)