Apresentamos a intervenção do Professor Roberto de Mattei por ocasião do Congresso Litúrgico realizado no mosteiro beneditino de Notre Dame em Fontgombault, França, 22-24 de julho de 2001. Com o tema “Cristo é o sujeito da liturgia, não a comunidade”, o congresso reuniu bispos e autoridades eclesiásticas, tendo como seu principal conferencista o então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal Joseph Ratzinger. Dentre os participantes do mundo “tradicionalista” podemos destacar Dom Gérard Calvet, abade de Le Barroux; Mons. Camille Perl, da Comissão Ecclesia Dei; e Padre Arnoud Devillers, então superior da Fraternidade São Pedro.
Roberto de Mattei, historiador italiano renomado, professor de História do Cristianismo na Universidade Européia de Roma, é autor de várias obras, com destaque para sua biografia do Beato Pio IX e seu último livro “La liturgia della chiesa nell’epoca della secolarizzazione”. Também discursou no congresso realizado em Roma, sob patrocínio da Comissão Ecclesia Dei, por ocasião do primeiro aniversário do motu proprio Summorum Pontificum; na oportunidade, Prof. De Mattei teve seu artigo “Il rito romano antico e la secolarizzazione” publicado no L’Osservatore Romano.
Considerações sobre a Reforma Litúrgica
por Roberto de Mattei
Tradução de Marcelo de Souza e Silva
Fonte: Revue Item
Eminência,
Reverendíssimos Padres Abades,
Reverendos Padres,
Minha intervenção como vós bem podeis imaginar, não será a de um liturgista nem de um teólogo, mas a de um homem de cultura, de um historiador, de um católico leigo que tenta situar os problemas da Igreja no horizonte de seu próprio tempo.
Nesta perspectiva, eu me proponho a desenvolver certas considerações sobre as raízes históricas e culturais da Reforma litúrgica pós-conciliar. Com efeito, eu estou convencido de que quanto mais este quadro for esclarecido, mais a compreensão e a solução de problemas complexos que temos diante de nós serão facilitadas.
Todo problema, e o da liturgia não é exceção, para ser tomado em sua essência, deve ser efetivamente situado num contexto mais vasto. Aquele que quereria estudar a arquitetura gótica, por exemplo, não poderia negligenciar sua relação com a Escolástica medieval tão bem ilustrada por Erwin Panofski, assim como para se compreender a arte figurativa dos séculos XIX e XX, seria necessário recorrer aos estudos de Hans Sedlmayr, que dela retém a dimensão ideológica profunda. Assim, um discurso sobre a arte deve ir além da arte, um julgamento técnico-estético não basta; assim também, um discurso sobre a liturgia deve ir além da própria liturgia, tentando encontrar o sentido derradeiro dela mesma. Porque a liturgia não é somente o conjunto de leis que regulamentam os ritos. Estes ritos, em sua variedade, remetem à unidade de uma fé. Sem este conteúdo, o culto cristão seria um ato exterior, vazio, desprovido de valor, uma ação não sagrada, mas “mágica”, típica de certas concepções gnósticas ou panteístas do mundo. Neste sentido, foi bem dito que: “o culto, compreendido em toda sua plenitude e profundidade, vai muito além da ação litúrgica”.
Em suas fórmulas, em seus ritos, em seus símbolos, deve refletir o dogma. O dogma, disse-se, é para a liturgia o que a alma é para o corpo, o pensamento para a palavra. É, pois, necessário tornar íntima e profunda a relação entre a liturgia e a fé, que foi tradicionalmente expressa na fórmula lex orandi, lex credendi. Neste axioma nós podemos encontrar uma chave para a leitura da crise atual.
O texto parece muito interessante. Li ontem a noite já um tanto cansada, mas pretendo ler novamente. O autor faz ponderações moderadas e bem fundamentadas que podem servir para despertar o interesse dos conservadores pela urgência do resgate litúrgico.
Quero ler novamente o último parágrafo onde ele fala da “Reforma da Reforma” versus o receio dos católicos tradicionais de serem passados para trás. Como estava muito cansada ontem não prestei a devida atenção, mas creio que esse é um ponto importantíssimo sobre o qual temos que refletir. Se entendi direito ele crê que a Reforma da Reforma é um estágio para o resgate mais sóido da Tradição, sem contudo abandonar o Rito Antigo. Também gostei muito da explanação sobre os demais ritos. Parece-me que ele segue uma linha semelhante ao do Cardeal Cañizares.
Agradeço ao Marcelo Souza pela tradução, foi preciosa para nós.
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Excepcional. Impressiona a sobriedade do prof. de Mattei. Diante de partidários do novus ordo “bem rezado” ele defende tão vigorosamente a missa tradicional e vai no cerne da questão: os problemas da nova missa são intrínsecos ao rito. Sobriedade ao pedir respeito mútuo entre tradicionalistas, que devem aceitar as autoridades da Igreja, e às próprias autoridades, que devem “respeitar a consciência” dos tradicionalistas. Mas tudo sendo possível apenas ambos os lados compreendem a “reforma da reforma” como uma etapa em direção à restauração litúrgica e não como um jogo de cena para trazer os tradicionalistas para a missa nova em sua versão light, sem abusos.
Reforço o que disse a Maria, as traduções do Marcelo são sempre muito boas. Obrigado, Marcelo!
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