Missa Nova: Mais Variedade para os Católicos.

Revista Time – edição de 26 janeiro de 1970

Tradução de Roberto F. Santana

Por quase quatro séculos  — de 1570 até o Segundo Concílio do Vaticano, em 1963 — a Missa Católica Romana era tão imutável e inalterável como o movimento da Terra. De Manila até Minneapolis, a linguagem na maior parte da Missa era o latim murmurado baixinho, pontuado por um ocasional “Dominus Vobiscum”. As mãos do sacerdote, de costas para a congregação, postas precisamente no ângulo prescrito em cada momento crítico da liturgia. Somente em pequenos enclaves de inovação litúrgica, em torno de mosteiros, colégios e nos territórios de missões, outras formas foram introduzidas delicadamente.*

Então, como se o eixo polar houvesse mudado, veio a libertação do Concílio Vaticano II. A missa foi invadida por tambores, violões, conjuntos de mariachi; liturgias experimentais foram celebradas no vernáculo. Houve comunhão sob “duas espécies”, o pão e o vinho, um privilégio que os leigos de rito latino não tinham a séculos. (Protestantes costumam receber tanto o pão e o vinho, mas os católicos acreditam que o pão, o corpo vivo de Cristo inclui o “sangue” também.) Agora, o Vaticano e as muitas conferências nacionais de bispos estão em processo de adoção de uma missa nova oficial que combina a tradição de longa data e alguns dos melhores novos experimentos.

Diferentemente da missa antiga, um produto da Contra-Reforma do Concílio de Trento, que delineou cada palavra e movimento da liturgia em meticulosas rubricas de 57.000 palavras, a missa nova é mais uma série de opções do que um conjunto de regulamentos. Quatro alternativas da “oração eucarística”, por exemplo, podem ser escolhidas para a parte mais sagrada da missa, a consagração do pão e do vinho. Embora as palavras de consagração (“Este é o meu corpo… Este é o meu sangue…”) sejam idênticas em cada versão, as quatro diferentes orações eucarísticas são concebidas, na frase do Papa Paulo, para salientar “os diferentes aspectos do mistério da salvação “. Uma versão particularmente eloquente descreve Cristo como “um homem como nós em tudo, mas sem pecado. / Para os pobres, proclamou a boa notícia da salvação, / para os presos, a liberdade, / e aos tristes, a alegria” . Desenvolvimentos na teologia eucarística também são aparentes nas instruções para a missa nova, que enfatizam o carácter de “banquete pascal,” um encontro ” do povo de Deus, para celebrar o memorial do Senhor”.

A forma de comunhão reflete a nova teologia também. A hóstia, tradicionalmente, nos EUA, um pequeno e fino disco feito de farinha, deve ser agora mais parecido com um pão, de modo que ele possa ser quebrado e partilhado por sacerdotes e pessoas em uma reedição mais vívida da Última Ceia. O vinho pode ser bebido diretamente do cálice, tomado com uma colher, tomado por “indução” (mergulhando o pão no vinho), ou mesmo sorvado através de canudos de prata.

Primeira Aliança. Outras inovações irão parecer familiares aos protestantes e judeus. No início da missa, o padre cumprimenta as pessoas com: “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós”, um velho favorito dos protestantes que vem de São Paulo (/ / Coríntios 13:14). A oração começa com o ofertório, a tradução da frase que tradicionalmente abre as bênçãos judaicas: “Bendito és Tu, Senhor, Deus de toda a criação.” É dada maior atenção nas leituras bíblicas na missa para a dívida do cristianismo com a primeira aliança com Deus do judaísmo. Em vez de duas leituras, a epístola familiar e o Evangelho do domingo, as missas agora irão incluir três, um do Antigo Testamento, uma das Epístolas ou outro livro do Novo Testamento, e um dos Evangelhos.

Agradando os protestantes. Muitos não irão sentir falta das omissões do antigo rito: acabaram os repetitivos sinais da cruz, orações redundantes, genuflexões sem fim. O que foi adicionado, com uma forte ênfase na participação dos fiéis, é particularmente importante para uma Igreja em que a participação dos fiéis tem sido, por muito tempo, passiva. Os leigos agora oficialmente abrirão a missa com um cântico de entrada, irão iniciar o ofertório levando o pão e o vinho ao altar e irão compartilhar com o celebrante e uns com os outros um “sinal de paz”, pouco antes da Comunhão, um aperto de mão ou um abraço amigável.

Apesar de tais “inovações” refletirem uma prática cristã mais autêntica do que a liturgia do Concílio de Trento, com suas muitas adesões medievais, a missa nova já despertou alguma resistência. Algum tempo depois que o Papa Paulo promulgou a versão básica latina em abril passado, dois antigos conservadores do Vaticano, o Cardeal Alfredo Ottaviani, 79, e Antonio Cardeal Bacci, 84, emitiram um comunicado de imprensa próprio chamando a Missa de “ultrajante” e “um atentado claro ao dogma… moldada para agradar aos mais vanguardistas protestantes.” O pontífice respondeu que esperava que os católicos “prontamente aderissem” ao novo rito, mas estendeu o prazo para a sua utilização obrigatória para 28 de novembro de 1971 (primeiro domingo do Advento, quando começa o ano litúrgico).

A prorrogação, entretanto, não foi para apaziguar os bispos relutantes, mas para dar tempo às conferências episcopais nacionais para considerarem as opções e elaborarem traduções em vernáculo. A Itália, obediente, já está usando o novo rito, e os bispos de países de língua inglesa também serão capazes de implementarem bem antes do prazo. Enquanto o novo Missal estava em preparação, um Comitê Internacional de Inglês na Liturgia já estava no trabalho há quatro anos. Ele preparou uma tradução comum em inglês da Missa para onze países de língua inglesa e cerca de 40 outros territórios, principalmente territórios missionários, onde o inglês é usado. Nos EUA, quase todos os bispos aprovaram uma versão revisada em novembro, assim como todas as outras hierarquias de língua inglesa. Na Grã-Bretanha,a missa nova começará, em muitas dioceses, no primeiro domingo da Quaresma; nos EUA, no Domingo de Ramos, 22 de março; outros já estão usando. Na maioria dos países, o novo rito deve vir sem nenhuma surpresa, já que muitos bispos têm vindo a adotar reformas fragmentadas, permitidas pelo Vaticano.

Espaço para a mudança. A versão revisada em inglês já foi enviada para as editoras católicas nos EUA. Sua linguagem é, na maioria dos casos, nova, extraordinariamente essencial e compreensível, de um inglês internacional, direto e muitas vezes poético. Alguns países estrangeiros, como o Japão, optaram por elaborar as suas próprias traduções a partir do inglês, ao invés do texto latino.

Uma parte da tradução em inglês ainda não será oferecida aos católicos dos EUA, a nova versão ecumênica do Pai-Nosso, que diminui as diferenças existentes entre as versões protestante e católica, começará apenas com um “Nosso Pai nos céus”. Existem outras mudanças na oração: “Perdoai as nossas ofensas” (“Perdoai as nossas dívidas” na maioria das versões protestantes) torna-se simplesmente “Perdoa-nos os nossos pecados.” “Não nos deixeis cair em tentação” se torna “Não nos trazeis à prova” (prova final antes da Segunda Vinda). Bispos norte-americanos decretaram que a versão antiga ainda irá ser utilizada nas missas nos EUA, embora com uma doxologia “estilo protestante”. – “Porque o reino, o poder e a glória são teus, agora e para sempre” agora vai seguir logo depois de uma oração do celebrante.
Outras reformas litúrgicas podem muito bem vir a tempo. O prefácio do próprio Papa à “nova ordem da Missa” incentiva “legítimas variações e adaptações”, e todas as instruções dão uma ênfase notável na adaptação da liturgia para os costumes locais e necessidades. ” O espírito do novo Missal,” conclui o jesuíta CJ McNaspy “, liberta mais do que restringe.” Enquanto o Papa pretende claramente que a missa nova seja um modelo , McNaspy e outros estão confiantes que o caminho ainda está aberto para a Missa se desenvolver ainda mais.

* Em um desses experimentos, na paróquia Corpus Christi de Manhattan, perto de Columbia, o padre George Barry Ford introduziu uma procissão no ofertório e teve sua congregação rezando a missa em voz alta em Inglês há 34 anos.

Nota: A foto não corresponde à edição; somente para efeito ilustrativo.

19 comentários sobre “Missa Nova: Mais Variedade para os Católicos.

  1. “O espírito do novo missal, liberta mais do que restringe”…
    Realmente liberta, liberta tudo o que há de mais perverso na imaginação do homem.
    Paulo VI, ao contrário do que alguns consideram, não foi um inocente manipulado pela astúcia de Bugnini, ou, pior ainda (o que chega a ser de um ridículo atroz), a teoria de que, quem na verdade teria promulgado o Novus Ordo Missae, fora um sósia do Papa(!), pois o verdadeiro Paulo VI estaria refém, incomunicável, submetido à sedação medicamentosa.
    Interessante como a “criatividade” litúrgica propagada pela Missa Nova e seus corifeus,assemelha-se às fábulas que os neocons difundem para salvar a imagem de um Papa que, sem dúvida nenhuma, sabia muito bem o que estava fazendo e assinando.

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  2. Qual era realmente a intenção dos padres ao redigir a Sacrossanctum Concilium?

    Se não foi a de ter a missa nova, por que não se levantaram contra?

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  3. Enquanto o Papa pretende claramente que a missa nova seja um modelo , McNaspy e outros estão confiantes que o caminho ainda está aberto para a Missa se desenvolver ainda mais.

    Enquanto um Papa n acabar logo com esse caixa 2 protestante, ela só vai desenvolver; parece espírita isso, eles que dizem que desenvolvem no terreiro a cada sessão. Missa nova? TÔ FORA!!!

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  4. Interessante, e triste.

    Leiam “O Reno se lança sobre o Tibre” e “Acuso o Concílio”. São perólas de pessoas da época que nos mostram a maldita arquitetação liberal para invadir a Igreja, no concílio pastoral, e da luta de alguns poucos verdadeiros católicos na luta pela Tradição.

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  5. Mais uma vez, mais uma evidência clara:

    A Missa Nova foi feita com a intenção de se tornar mais protestante.

    Qual é o medo de admitirmos isto? Há muitos tradicionalistas que ainda relutam, que possuem escrupulos e que insistem em querer a Missa Tridentina por questão de mera preferência e gosto…sendo que é uma questão de obrigação. Pois muitos dizem: “Mas as duas são missa…” Sendo que isso ninguém contesta…o ponto é que para a Missa Tridentina, afirmamos que é Missa sem medo….para a Missa Nova, fica a pergunta: É missa…por quanto tempo?

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  6. Antonio, eu não sei por você, mas para mim há muito tempo já há evidência o suficiente de que o Concílio Vaticano II foi somente o estouro de um terremoto que estava há muito se preparando e cujo único objetivo era protestantizar não só a Missa, mas toda a Igreja.

    O problema é que fora tudo muito bem arquitetado, de sorte que este sim conseguiu enganar até os eleitos! Hoje vivemos mergulhados numa crise de quase 100 anos (pois isto começou antes do concílio) e numa necessidade emergente de que surja um Papa santo (não basta um Papa razoável como Bento XVI, é preciso um santo) que seja hábil e forte para separar o joio do trigo da Igreja.

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  7. ATENÇÃO:
    NOTÍCIA OFICIOSA IMPORTANTE:
    O pároco da Igreja Nossa Senhora Aparecida, RJ mandou que seus fiéis ao final da missa rezassem pelo Pe. Marcelo Rossi. Ele estaria sendo coagido a encerrar a apresentação ao vivo de suas missas transmitidas pela Rede Vida de Televisão. Um familiar meu foi confirmar isto com o padre ao fim da missa, e perguntou:
    -Padre, de onde teria vindo esta ordem? Do Brasil ou de Roma?
    -De Brasília, da CNBB.

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  8. Para mim não existe “igrejas” e sim a única fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo a Igreja Católica Apostólica Romana e não existe duas formas de missa e sim a única forma que é a Missa de São Pio V ou tridentina.

    Quanto mais leio sobre o Vaticano II , João XXII e Paulo VI, mais se torna evidente para mim que foi sim por essa abertura ao mundo moderno que satanás entrou na cúpula de são Pedro e introduziu tanta divisão no coração da Igreja.

    Rezemos para que surja um Papa santo que acabe com toda essa crise atual que está minando a fé de tantos eclesiásticos e leigos pois o sonho do CVII de abraçar o mundo moderno foi um fracasso total.

    Viva Jesus e Maria ! Viva a Missa Tridentina!

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  9. Padre Marcelo sem aquela Missa show na televisão?

    Que ótimo!

    Tomará que seja confirmada essa notícia mais tarde.

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  10. Rezemos para que o padre Marcelo Rossi tenha suas missas canceladas pela Rede Morte. Aliás, a própria emissora poderia ser cancelada também, e seguida pela CNBB.

    ——————–

    40 anos depois, os frutos são: a Igreja está em situação ainda pior, muito menos influente, muito mais esgotada, com crises agudas em todos os setores, exceto no que se refere aos grupos mais tradicionais, que teimam em não registrar estatísticas ruins…

    A história está julgando o Vaticano Segundo. (II)

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  11. Essa “reforma litúrgica” constitui, e ainda é, um verdadeiro desastre para a Igreja de Cristo. Eu, em toda a minha insignificância, só posso rezar para que os católicos saibam que a verdadeira Missa é a que repete incruentamente o Sacrifício de Nosso Senhor no Santo Altar,a Missa de Sempre, Missa de São Pio V; é esta a verdadeira Missa e não a Missa Nova de Paulo VI.
    Deus nos salve!

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  12. Caro Jucken,

    Concordo com você. Provas documentais de muita coisa que você disse se encontram no livro “O derradeiro combate do demônio”.

    Salve Maria,
    Antonio

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  13. Acho que a notícia da liberação da Missa de Sempre em 2007 impactou mais, tanto é que foi sonegada até por sítios de conferências episcopais. Foi algo inesperado, os modernistas ficaram surpresos.

    Os enfeitadores e defensores da missa nova dizem que o correto é celebrá-la assim e assado, MAS se é o próprio Paulo VI que mandou improvisar…

    O resto de bom senso do laicato católico rejeitou a abundante variedade do rito paulino e preferiu o caminho reto e estreito da liturgia de sempre. Só discordo num ponto da matéria: a Missa gregoriana-tridentina podia ser igual em sua essência, mas não em sua plasticidade – em certas regiões as alfaias eram de tal tecido, em outra a casula do sacerdote tinha tal detalhe; na França o clero só saía em procissão rumo ao altar depois do Gloria Patri do Intróito, na Espanha o cantochão tinha mais vibrato; uns altares eram góticos, outros barrocos; em determinado lugar a polifonia era de um jeito, noutro de outro, e por aí vai. A Santa Missa não tem obrigação nenhuma de “empolgar” o fiel, mas não é o murmúrio enfadonho como a acusam os modernistas. Enfadonha tornou-se a missa nova, uma surpresa sem graça a cada domingo.

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  14. Salve Maria.
    Ontem dizia a Madre e a irmãs, que esse estrago todo, serve de prova – aos que tem dúvida – da morigem divina da Igreja, não fosse isso já teriam destruído. Pois, a bagunça é grande.”Portæ inferi non prævalebunt”.

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  15. Essa notícia está deveras defasada, pois tem um notório quê de preconceito (“Apesar de tais “inovações” refletirem uma prática cristã mais autêntica do que a liturgia do Concílio de Trento, com suas muitas adesões medievais”). Ademais, muitas das “mudanças” aí citadas não foram implementadas, se é que foram cogitadas.

    A linha desse artigo me fez lembrar o anticlericalismo tipo “O Globo”, com ataques indiretos e exposições de casos isolados e maximização de opiniões discordantes como se fossem autênticos clamores populares.

    Hoje, não me deixo enganar nem pela literatura rad-trad tampouco por fanáticos da RCC: o verdadeiro Novos Ordo é a Santa Missa celebrada pelo Papa, como se vê na TV, não as tristemente célebres “missas show”.

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