Por Padre Pio Pace – Rorate Caeli | Tradução: FratresInUnum.com: O mundo todo pôde ver em suas telas, na viagem papal recente para Saraievo, que a cruz pontifical, que havia quebrado, foi remendada com esparadrapo: “Um símbolo completo!”, disseram, com ironia, os prelados em torno do pontífice. Sim, um símbolo completo. A Igreja de Pedro, no século XXI, aguarda uma encíclica… sobre o meio ambiente. É mau que uma ou duas pessoas estejam sós em um carro porque isso aumenta a quantidade de gases de efeito estufa, assim disse o Magistério da Santa Igreja Católica…
O título que dei a este artigo veio do ensaio A Era do Vazio (em italiano, L’era del vuoto, Luni, 1995), o qual foi escrito, aliás, com um objetivo completamente diferente do meu, pelo pensador francês Gilles Lipovetski. Mas, parece-me expressar bem a impressão mais ou menos compartilhada por todos hoje sobre o atual pontífice, agora que o impressionante “estado de graça” do qual ele gozou por um tempo diminuiu e as massas nas audiências gerais de quarta-feira voltaram aos níveis normais.
Um artigo de Julius Müller-Meininger, no Die Zeit (o jornal de Helmuth Schmidt, que é algo como o nosso Reppublica, só que do Reno), de 30 de abril de 2015, Jetzt hat es auch ihn erwischt, expressa bem o que os jornalistas que eram mais favoráveis a Francisco sentem agora: “O que ele quer, afinal de contas?” Müller-Meininger, que cruelmente ressalta, aliás, que a inconsistência das afirmações pontifícias são cada vez mais abertamente zombadas (“Estar doente é ter uma experiência da nossa fragilidade”), explica porque a mídia está inquieta com relação ao papa. Ele cita o ativista transsexual Vladimir Luxuria: “Eu não o entendo. Ele segue agora uma política da cenoura na vara. Primeiro, as palavras são de abertura e, depois, um ataque contra a ideologia de gênero. Francisco é um impasse. Estou desapontado.”
O impasse é o de uma abertura moral, num sentido liberal ao qual se deve, ao final, ou satisfazer ou negar. A questão que preocupa particularmente Müller-Meiningen é a da proposta feita pelo governo francês de nomear Laurent Stéfanini embaixador para a Santa Sé. Alguém que é muito competente em questões religiosas, um católico praticante, mas um homossexual. Assim como outros embaixadores perante a Santa Sé e membros do próprio corpo diplomático da Santa Sé… exceto pelo fato de que Stéfanini não vive escandalosamente como casal. Ele apenas é conhecido por ter más tendências nas quais – só seu confessor pode dizer, e nunca o fará – ele, às vezes, talvez caia.
Contudo, contra seus assessores na Secretaria de Estado, que observaram que há embaixadores muçulmanos ou comunistas perante a Santa Sé, ou ainda, freqüentadores de diversões sensuais, etc., e que mesmo assim foram aceitos como embaixadores, Francisco decidiu, por sua própria conta, que Stéfanini não receberia o aval da Sé Apostólica. É sem dúvida sua animosidade contra François Hollande, que se equipara à que ele tem por Cristina Kirchner, presidente da Argentina, que explica essa tirada de autoritarismo, típica dele: está convencido que François Hollande nomeou Stéfanini por provocação anticlerical – o que não é impossível. Mas, no mesmo momento em que tem esse ataque de “rigorismo”, Francisco retirou a suspensão da ajuda dada pela Santa Sé à UNICEF, uma suspensão decidida por João Paulo II devido às fortes campanhas em favor da contracepção organizadas ou financiadas pela UNICEF.
É verdade que o bispo Marcelo Sanchez Sorondo, Chanceler da Academia Pontifícia de Ciências Sociais e a mente por trás dessa reaproximação com a UNICEF, é um dos amigos do Papa – o que, na Roma de hoje, que se tronou uma corte mais do nunca, permite todas as coisas e acoberta todos os pecados. Também um amigo do Papa, o secretário da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e das Sociedades de Vida Apostólica, o franciscano José Rodriguez Carballo, que era superior dos Franciscanos de 2003 a 2013, tempo durante o qual questões financeiras impressionantes levaram a Ordem à beira da falência. Também um amigo do Papa, Monsenhor Battista Ricca, a cargo de todas as grandes casas sacerdotais em Roma (via della Scroffa, via della Traspontina, Casa Santa Marta…), nomeado prelado do Banco Vaticano, e que fez uma reputação escandalosa como diplomata no Uruguai. Também um amigo do Papa, o Arcebispo Vincenzo Paglia, presidente do Conselho para a Família, que esteve sob investigação policial por conspiração criminal, obstrução e fraude contra o município de Narni, improbidade administrativa e desvio durante o tempo em que era bispo de Terni. “Quem sou eu para julgar?”
O ponto mais incômodo disso tudo é que não se pode ver uma linha clara de governo. Tem-se a impressão de ensaios – para não dizer teimosia – de um homem que, apesar de sua idade, exerce sua autoridade com paixão, emitindo decisões para todas as direções. Como explicar, por exemplo, o tom aparentemente positivo para com a Fraternidade São Pio X e, por outro lado, o não para os Franciscanos da Imaculada? A atividade é barulhenta e ainda assim confusa; e os grandes pronunciamentos acabam morrendo na praia: ninguém mais acredita numa verdadeira reforma da Cúria, considerando a maneira totalmente ineficiente pela qual o grupo de nove cardeais encarregados trabalha. E com mais razão ainda quando ouvimos o seu presidente, o indescritível cardeal Maradiaga, anunciar, por exemplo, que todas as cortes da Sé Apostólica podem ser unidas em um único corpo…
Sob essas condições, o Sínodo de Outubro poderia parecer como uma Epifania… de vazio. É bem provável que Francisco já tenha descoberto que as teses das quais o Cardeal Kasper fora um dos maiores defensores não podem levar a uma modificação da doutrina da Igreja sem provocar divisões significativas. Alguns acham que ele acreditava, a seu modo teológico impressionista, que fórmulas poderiam ser encontradas, as quais poderiam abrir a porta para uma permissão, em certo número de casos, para que pessoas divorciadas e recasadas acedessem aos Sacramentos da Igreja, usando de misericórida versus “rigorismo”, “pastoralidade” versus dogma.
Mas é muito mais provável que o Papa tenha calculado precisamente, desde o início, o que ele deveria essencialmente esperar dessa imensa empreitada: barulho, muito barulho, uma quantidade imensa de barulho. Muito barulho para nada. Porque, se o Sínodo pura e simplesmente confirmar a doutrina tradicional da Igreja, a imagem de um pontificado que levaria a grandes mudanças irá colapsar. Se, ao contrário, o sínodo agradar os Kasperianos, irá provocar um non possumus da parte de um número considerável de cardeais e bispos. Assim, teríamos duas assembléias do Sínodo dos Bispos, uma considerável massa de literatura eclesiástica, de declarações, de pronunciamentos de imprensa em todos os sentidos, um burburinho não visto desde o último Concílio – tudo para nada. Para nada? Exceto que o ensinamento da Igreja em nome do Evangelho é deixado praticamente em silêncio. Exceto em que o rebanho é deixado desorientado: em campo, os padres que desejarem, darão os Sacramentos calmamente para adúlteros e casais homossexuais e até os abençoarão na igreja.
Podemos, assim, falar de um pontificado de revelação, de consecução. 2015 é o ano do jubileu do Concílio, que terminou em 1965. Já percebeu que não mencionamos mais o Concílio em Roma? Sem dúvida é porque, 50 anos depois, o Concílio Vaticano II foi agora plenamente realizado, encarnado.