Assim interpreta os últimos acontecimentos do pontificado de Francisco seu amigo próximo, o editor do jornal La Reppublica.
Por Eugenio Scalfari, 31 de janeiro de 2016 | Tradução: Gercione Lima – FratresInUnum.com: Eu queria escrever sobre a Europa de hoje e a crise que a está devastando, apesar da indiferença que tem permeado as suas instituições e a chamada classe dominante que a administra; uma crise que pareceu mais evidente na reunião de sexta-feira entre Angela Merkel e Matteo Renzi, em Berlim.
Eu falarei disso em um momento, mas primeiro tenho de fazer algumas observações sobre o encontro no Vaticano entre o Papa Francisco e Hassan Rohani, o presidente do Irã, e também sobre o pré-anunciado encontro que terá lugar em 31 de Outubro na Suécia entre Francisco e os representantes das igrejas protestantes de todo o mundo para celebrar a Reforma Luterana de meio milênio naquele mesmíssimo dia em que Martinho Luthero cravou sobre a porta da catedral de Wittenberg suas teses que partiram ao meio a religião cristã.
Quinhentos anos durante o qual foram desencadeadas guerras religiosas, massacres, fogueiras, tortura infligida a ambos os lados e com o apoio de vários governantes que usavam para a própria vantagem política essas trágicas guerras religiosas. Somente um tentou o caminho da reconciliação em 1541 e foi Carlos V de Hagsburgo, imperador da Alemanha e da Espanha, mas a tentativa falhou e as guerras religiosas continuaram a derramar sangue na Europa.
O clímax foi atingido na noite de São Bartolomeu, em 1572, quando os huguenotes (protestantes franceses) liderados pelo rei de Navarra, pelo príncipe de Condé e pelo Almirante de Coligny, foram massacrados por soldados de Catarina de Médici e seu filho Carlos IX de Valois. Eram vinte e três mil vítimas do massacre em Paris, e depois continuaram durante séculos.
Em 31 de outubro, aquele racha que dividiu em dois o catolicismo será celebrado e superado. Francisco já pediu perdão aos Valdenses, que precederam em muito a divisão Luterana e pedirá perdão também a Lutero e a seus descendentes e o perdão será mútuo, porque os protestantes também têm sua responsabilidade por tanto derramamento de sangue. O objetivo de ambas as partes é superar essas divisões tornando-se fraternos novamente em nome de Cristo. Os ritos e a liturgia permanecem distintos, mas a fraternidade será aberta no âmbito de uma Igreja pastoral e missionária que, com uma abrangência dessa magnitude, à qual devem ser adicionados uma grande parte dos anglicanos e, no futuro próximo, também as Igrejas ortodoxas do Oriente, se tornará a religião numericamente mais difusa nas Américas, Europa, Rússia, África, Ásia e Austrália.
Mas, não nos esqueçamos da visita à sinagoga de Roma feita pelo papa Francisco e do encontro com Rouhani [presidente do Irã] no Palácio Apostólico no dia 26 passado. O comunicado divulgado com a anuência de ambas as partes diz o seguinte: “Durante o colóquio, foram evidenciados os valores espirituais comuns e depois se fez referência às boas relações entre a Santa Sé e a República Islâmica do Irã. O colóquio também revelou o papel importante que o Irã desempenha, junto com outros países da região, para promover soluções políticas adequadas para os problemas que enfrentam o Oriente Médio, como o combate à propagação do terrorismo. A este respeito, foi alertado para a importância do diálogo inter-religioso e a responsabilidade das comunidades religiosas para promover a tolerância e a paz”.
Duas iniciativas: com os luteranos e protestantes e outra com o Irã islâmico, das quais saem reforçadas a liberdade religiosa, a convergência humanitária, bem como as repercussões políticas dessas iniciativas, em grande parte tomadas pelo Papa Francisco, que em várias vezes eu defini como profético e revolucionário. Na base do seu pensamento e de sua ação está sempre a fé em um Deus que ninguém havia antes proclamado com o vigor de Francisco e que representa a excomunhão dos fundamentalistas de todos os tipos e do terrorismo e guerras que esses fundamentalismos alimentam.