Por Sandro Magister, 4 de janeiro de 2017 | Tradução: FratresInUnum.com: É ler pra crer. Este é o ataque do editorial de hoje na primeira página do “L’Osservatore Romano”:
“Sabemos que Aleppo não se liberta com bombas. É necessário ainda libertar Aleppo e a Síria da pobreza, das alterações climáticas que há alguns anos levou suas mulheres e homens a migrar do campo, que desestabilizaram o equilíbrio demográfico e desencadearam as primeiras revoltas na Síria e depois a guerra”.
O autor desta análise impressionante da crise na Síria é Carlo Triarico. Mas, aos leitores do jornal do Papa ninguém informa que ele é o presidente da Associação para a agricultura biodinâmica, ou seja, o método de cultivo inventado há um século pelo exotérico austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), com base em um ritual de adubação homeopática feito com chifres de vaca e tripas de cervo macho, que deveriam atrair as forças espirituais, cósmicas e astrais às plantas, fazendo-as revigorar. Um método que em novembro passado, em uma carta aberta ao ministro da Agricultura italiana, quase todas as sociedades científicas que operam no setor agrícola desqualificaram como simples “magia”, depois de um congresso em Nápoles organizado exatamente pela associação presidida por Triarico.
Mas, já por ocasião daquela conferência, “L’Osservatore Romano” havia dado espaço não às críticas dos cientistas, mas às lodes do mesmo Triarico, em um artigo de 28 de Novembro, no qual ele reivindicava com orgulho ter organizado, no mês anterior de fevereiro, também uma conferência sobre a “Laudato Si”, a encíclica ecologista do Papa Francisco.
E ainda no mesmo artigo, Triarico escreveu exultante que na conferência napolitana haviam participado centenas de militantes desses “movimentos populares” que o papa tinha recebido, no dia 5 de novembro, no Vaticano e que são os seus favoritos, como prova de que “está crescendo no mundo um grande movimento de inovação pela casa comum”.
Porém, não é o suficiente. Por ocasião da fusão entre a Bayer e Monsanto foi também a Triarico que o “L’Osservatore Romano” confiou a reprimenda apocalíptica, em um artigo na edição de domingo, 18 de setembro.
Voltando ao editorial de hoje, o resultado dessa incrível estréia é todo um hino às virtudes milagrosas da agricultura biodinâmica “para acabar com a fome, criando condições para a resiliência camponesa às mudanças climáticas”, e em seguida, por tabela, a migração e as guerras, não só na Síria, como também em outros países já atingidos – ele diz – através desse método de cultivo: “Jordânia, Irã, Egito, Argélia, Eritreia, Etiópia, Yemen”
Em poucos dias, 9 de janeiro, o Papa Francisco fará um discurso de início de ano ao corpo diplomático junto à Santa Sé, no qual irá delinear sua visão geopolítica e as vias para se alcançar a paz.
Daqui até lá, é de se esperar que nenhum embaixador imagine que a receita da Igreja para se alcançar a paz no mundo de hoje seja o editorial do jornal do Papa.