Coluna do Padre Élcio: “É mais importante ressuscitar para viver sempre”.

Evangelho do 15º Domingo depois de Pentecostes – S. Mateus VI, 24-35.

Por Padre Élcio Murucci, 1º de setembro de 2018 – FratresInUnum.com

Caríssimos e amados irmãos em Nosso Senhor Jesus Cristo!

O Evangelho deste domingo conta-nos a ressurreição de um rapaz, filho único de uma viúva que morava numa aldeia chamada Naim.

jovem_NaimHoje os padres que seguem a Liturgia Tradicional lêem no Breviário um trecho do sermão de Santo Agostinho sobre este Evangelho. Vamos dar um  resumo deste sermão.

Os Santos Evangelistas contam-nos apenas três ressurreições operadas por Jesus: a de uma menina, filha de Jairo, chefe da Sinagoga; a do jovem filho único da viúva de Naim; e a de seu amigo Lázaro de Betânia, irmão de Marta e Maria Madalena.

O santo Doutor comenta as três ressurreições operadas por Jesus como símbolos das milhares ressurreições espirituais. Santo Agostinho diz: “Amplius est ressuscitare semper victurum, quam suscitare iterum moriturum”. É mais importante ressuscitar para viver sempre, do que ressuscitar para morrer de novo.

Vejamos que lição pretendeu dar-nos Jesus nos mortos que ressuscitou.

Ressuscitou a menina logo após ela ter morrido. Ainda estava no seu leito em casa: não havia saído o enterro. Jesus operou o milagre e ali mesmo entregou-a viva a seus pais. Ressuscitou o jovem filho da viúva de Naim. O enterro já havia saído da casa. Já estava fora, ás portas da cidade. Ressuscitou Lázaro, cujo cadáver não só já saíra de casa, mas estava encerrado no sepulcro há quatro dias, e, portanto, cheirava mal.

Santo Agostinho explica as três sortes de pecadores: a defunta filha do chefe da Sinagoga é símbolo daqueles que têm o pecado no íntimo do coração, mas não o puseram ainda em obras. São os que consentem plenamente nos maus desejos graves, como no caso de adultério, sem contudo realizá-los. Estão mortos no interior do coração. No caso, há um morto, mas não saiu para fora. Às vezes, por efeito da palavra divina, como se Jesus em pessoa lhe dissesse: “Levanta-te” este pecador arrepende-se de seu consentimento ao mal e volta a respirar o ar de salvação e santidade. Este morto ressuscita dentro de casa; este coração revive na intimidade de sua consciência. Esta ressurreição da alma defunta, operada em segredo é simbolizada pela que teve lugar no recinto doméstico.

Outros passam do consentimento à obra, por assim dizer, o morto saiu para fora. Sai à luz o que já estava na sombra. Também a este que passou a vias de fato, pondo o mal em obras também é ressuscitado pela voz de Nosso Senhor Jesus Cristo e volta à vida espiritual o pecador que se deixou tocar e comover pela palavra da verdade. Já ia se avançando para o abismo e para a morte eterna. Mas Jesus pára-o, toca-o, restitui-lhe a vida da alma e entrega-o à sua Mãe, a Igreja. Destes pecadores que não só consentem no pecado no interior da consciência, mas o realizam com obras e logo se arrependem, é símbolo justamente a ressurreição do jovem filho da viúva de Naim.

Finalmente, há aqueles que de mal em mal, chegam a enredar-se nos vícios, nos maus costumes, a tal ponto que não vêem por força do mau hábito, a malícia das suas ações e até se gabam de suas más obras. Assim, diz Santo Agostinho, os habitantes de Sodoma. Tão grande era ali o império do nefando costume, que a perversão se lhes parecia honestidade e mais digno de repreensão o censor do que o malfeitor. “Viestes, dizem os habitantes de Sodoma a Lot, para morar aqui, não para nos dar leis”.(que diria Santo Agostinho hoje quando se fazem leis para aprovar e defender os sodomitas?!). Eles, oprimidos pelos costumes malignos estão como que sepultados. Não só sepultados, mas como Lázaro no sepulcro, já cheiram mal. A pedra que cerrava o sepulcro de Lázaro significava a tirania do hábito, que subjuga a alma e não a deixa nem levantar-se nem respirar.

Diz-se de Lázaro que ele era um defunto de quatro dias (quatriduanus est). E, em verdade, a este mau hábito, que chamamos vício, chega-se como que por quatro etapas: primeira: uma suave chamada do prazer à porta do coração; segunda: o consentimento; terceira: a obra; quarta: o mau hábito. Há aqueles que repelem as coisas ilícitas logo que saem de seus pensamentos, para nem sequer sentir o prazer. Há aqueles que, sentindo o prazer, não consentem nele; ainda isto não é a morte, senão uma espécie de início de morte; porém, se ao deleite se junta o consentimento, vem a obra; e esta se torna costume. Neste caso, a gravidade é extrema. Neste sentido podemos dizer: esta alma está morta há tempo e cheira mal. Chega, então, Nosso Senhor, para o qual tudo é fácil; mas, como para dar a entender quão difícil é aqui a ressurreição, Ele, na ressurreição de Lázaro, suspira fortemente, e fala bem alto: “Lázaro,sai para fora deste sepulcro!” Sem embargo, à esta voz possante do Senhor, rompem-se as cadeias da tirania da sepultura, treme o poder da morte, e Lázaro foi devolvido à vida.

Irmãos, observai as circunstâncias desta ressurreição: saiu vivo do sepulcro, mas não podia andar. Diz, então, Nosso Senhor aos discípulos: “Desatai-o e deixai-o ir”. Jesus o ressuscitou da morte; os discípulos soltaram as ligaduras que impediam a Lázaro de andar. Reconhecei que a majestade divina se reserva certa coisa nesta ressurreição. A um consuetudinário (=pessoa dominada pelo vício) se lhe dizem duramente as palavras da verdade; porém, quantos não as ouvem? Depois das reprimendas, fica o pecador sozinho com os seus pensamentos e estes falam-lhe da má vida que leva e o péssimo hábito que o oprime. Enojado de si mesmo, resolve mudar de vida. Eis a ressurreição: ressuscitam, pois, quando começam a ser-lhes odiosos os procederes de antes; embora, porém, voltados à vida, não podem andar; as ligaduras de suas repetidas culpas impendem-nos. É mister, por isso, que ao ressuscitado se lhe desate e deixe caminhar; função esta encomendada pelo Senhor aos discípulos quando lhes disse: “O que desatardes na terra, será desatado no céu”.

E Santo Agostinho termina o sermão mostrando a necessidade da pronta ressurreição espiritual: “Estas reflexões, oh! caríssimos, devem persuadir aos vivos a continuar vivendo, e aos que não vivem, a recobrar a vida. Se o pecado concebido no coração não saiu ainda para fora, haja arrependimento, corrija-se o pensamento, ressuscite o morto na intimidade de sua consciência. Se executou a ideia, tampouco desespere; se o morto não ressuscitou dentro, ressuscite fora. Arrependa-se de sua ação, reviva em seguida, não baixe ao profundo da sepultura, não caia em cima a lousa do mau hábito. E se, porventura, me está ouvindo quem jaz oprimido pela fria e dura pedra, quem já traz sobre si o peso do costume e cheira mal, como morto de quatro dias, tampouco este deve perder a esperança; mui baixo está sepultado, porém, Cristo está em cima. Ele pode desfazer com a força de sua voz as lousas do sepulcro; Ele pode devolver-lhe a vida da alma; Ele os deixará nas mãos de seus discípulos para que o desatem. Façam também penitência estes mortos. Quando Lázaro ressuscitou depois de quatro dias, nada conservou da infecção primeira. Assim, pois, os vivos continuem vivendo, e os mortos de qualquer destas mortes, ressuscitem logo. Amém!

2 comentários sobre “Coluna do Padre Élcio: “É mais importante ressuscitar para viver sempre”.

  1. Sua Bênção, Oh Servo ungido, escolhido e capacitado por JESUS CRISTO, sacerdote Élcio , se me permite, amigo!

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  2. Consideremos as lições da morte: 1ª – Devemos fazer agora o que talvez não possamos fazer na hora da morte; 2ª – Devemos fazer agora o que será indispensável fazer na hora da morte; 3ª – Devemos fazer agora o que se quereria ter feito, quando for necessário morrer.

    FAZER AGORA O QUE TALVEZ NÃO SE POSSA FAZER NA HORA DA MORTE. Há mortes repentinas e mortes previstas com certeza, a menos que haja um milagre. Quantas doenças incuráveis! Pois bem, à aproximação do último momento qual a primeira coisa que se oferecerá ao nosso espírito? Sem dúvida, será a imagem de nossa vida, tal qual tiver sido realmente. Durante a vida, na verdade, nunca se aprofunda as coisas tanto como na proximidade da morte. Frequentemente iludimos nossa consciência, nos desculpamos e, pode acontecer, de a gente fazer vistas grossas até sobre coisas necessárias para a salvação. Deixo-me enganar pelos elogios e não procuro me corrigir de pecados secretos. Durante a vida, quem sabe? a pessoa usou de espertezas para ganhar dinheiro em negócios? Não gostaria que o outro fizesse consigo o que fez com ele. Quantos ressentimentos secretos que certamente extinguiram a caridade no coração! Estarei tranqüilo a respeito das minhas penitências? Sei que pequei, mas fiz a penitência devida? Não haverá confissões mecânicas e por formalidade? Pior: sacrílegas? E como será difícil (caso for possível) fazer uma confissão geral na proximidade da morte para reparar tudo o que durante a vida ou uma grande parte dela, não se teve força e coragem para fazer!

    A saída para todas estas coisas é fazer agora o que talvez não se possa fazer na hora da morte: Fazer confissão geral e extraordinárias(só os escrupulosos não precisam e nem podem se já a fizeram uma vez). Reparar todo dano causado aos bens materiais e/ou espirituais dos próximos; praticar mais a caridade, fazer mais penitência e orações. Em poucas palavras, se tenho a peito a minha salvação, devo dispor a minha consciência de tal sorte, que ela não possa na proximidade da morte, arguir-me de ter sido negligente nos exames de consciência, de não ter tido sincera dor, e de não ter cumprido bem a penitência, de não ter perdoado do fundo do coração aqueles que me ofenderam ou deram prejuízo. Caríssimos, feliz de quem, pelo menos uma vez na vida, tenha feito um santo retiro! Este é o tempo mais favorável, é um tempo de salvação! Uma santa confissão geral feita num santo retiro, não precisa ser repetida nem na hora da morte. Devemos frequentemente fazer atos de amor a Deus durante a vida, para que, nas proximidades da morte, seja esta a nossa exclusiva ocupação.

    FAZER AGORA O QUE SERÁ INDISPENSÁVEL FAZER NO HORA DA MORTE: Quer queiramos quer não, na hora da morte teremos que abandonar tudo. Se não nos desapegarmos agora de tudo voluntariamente, por amor a Deus e, portanto, com merecimento, seremos forçados pela morte a fazê-lo e sem merecimento. Deus, nosso Pai do Céu, pede-nos com toda bondade, que renunciemos a tudo por Seu amor. “Estais mortos, e a vossa vida está escondida com Jesus Cristo em Deus” (Coloss. III, 3). S. Paulo entendia assim que os primeiros cristãos tinham renunciado a todas as sua afeições carnais e terrenas. Os que tinham bens, não lhes tinha apego; se até então antes da conversão, tinham hábitos viciosos, tinham-nos sepultado na água do Batismo. Devemos estar mortos para todos os falsos bens do mundo, para todas as paixões, para todos os vícios. Assim tudo estará em ordem: “As despedidas estão feitas”, dizia S. Francisco de Sales. Mas, como chegar a ter esta morte mística? A oração, o exercício da presença de Deus, a mortificação dos sentidos, a cruz de Jesus Cristo abraçada por amor, são os meios que devemos empregar agora, enquanto é dia, porque, vindo a noite da morte, não se poderá fazer mais nada.

    FAZER AGORA O QUE SE QUERERIA TER FEITO, QUANDO FOR NECESSÁRIO MORRER: Um dos maiores pesares do moribundo é ver o mau uso que fez do tempo, este tempo que, podemos dizer, vale o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo. Então compreende que a vida só lhe foi dada para merecer o Céu. Enquanto a vida dura, podia fazer valer os talentos que Deus lhe deu; podia juntar merecimentos, e, agora, está prestes a ouvir esta sentença: “Já não poderás mais administrar; presta conta da tua administração”. Levarás agora para a eternidade o que tens neste momento. Caríssimos, vivamos e não cessemos de viver como quereríamos então ter vivido. A verdade é que nunca faremos tanto bem, que na hora da morte não desejemos ter feito mais. O avarento nunca julga ter conseguido o suficiente! Por que não pensemos o mesmo em relação ao tesouro no Céu?!

    Quem pensa na morte não peca. Por este meio evitarei todos os pecados e sempre. O pensamento da morte reprime e torna impotentes as duas paixões que ocasionam todos os pecados: a soberba e a sensualidade. E se pecar, não permanecerei no pecado. Penso: se o meu coração deixa de palpitar, o meu corpo cai sobre a terra. E a minha alma cairá, onde? Por conseguinte, vivo sempre no estado de graça.

    O pensamento da morte desapega de todas as coisas perecedoras, e deixa ao nosso coração a liberdade para se unir a Deus. Pois, mostra o nada das coisas deste mundo. Tudo é vaidade e aflição de espírito: riquezas, honras, prazeres, amizades humanas.

    O pensamento habitual da morte concorre para morrer com o coração cheio de confiança: o homem terá a prudência de empregar bem todos os seus instantes; daí, os dias cheios, em que tudo é para o Céu, porque tudo é para Deus. O pensamento da morte fará que eu ande diante de Deus em santidade e justiça, e assim, conduzir-me-á à felicidade de morrer na paz da confiança, na alegria do amor de Deus.

    Caríssimos, deixemos que os mortos enterrem os mortos; que aqueles que são encarregados das coisas materiais, procurem tirar os plásticos dos oceanos. Que os sacerdotes sejam o sal da terra e a luz do mundo, para que possam livrar o mundo da corrupção do dinheiro e da carne; e possam iluminar as almas com a luz da Verdade; que possam salvar as almas pelas quais Jesus morreu na cruz. Amém!

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