Coluna do Padre Élcio – Distinção ardilosa: combater o comunismo, não, porém, os comunistas.

CARTA PASTORAL prevenindo os diocesanos contra os ardis da seita comunista. Escrita em 13 de maio de 1961 pelo então Bispo da Diocese de Campos, D. Antônio de Castro Mayer, de saudosa memória (continuação).

Por Padre Élcio Murucci – FratresInUnum.com, 6 de abril de 2019.

Passemos a considerar outros ardis que o inimigo semeia em nosso caminho.

Há uma distinção que não raro ilude a boa fé dos não comunistas. É a que se costuma fazer entre comunismo e comunistas. Todos os ódios se voltariam contra aquele, e para estes só haveria tolerância e compaixão. Distinção semelhante se faz com frequência entre o erro e os que erram, segundo a frase atribuída a Santo Agostinho: “Interficite errores, diligite errantes”. Sem nos determos no verdadeiro pensamento do Doutor da Graça  –  bastante inteligente para perceber que o erro não tem existência senão por alguém que o professa, e por isso mesmo só desaparece com a conversão ou com o desaparecimento desse alguém  –  sem nos determos, portanto, na consideração do verdadeiro sentido do axioma atribuído a Santo Agostinho, observamos que, aplicado ao comunismo, ele é sempre perigoso.

Pio XI

Com efeito, em outras heresias há a possibilidade de se encontrarem pessoas de boa fé, que, tendo se enganado na busca da verdade, aceitam todavia os primeiros princípios da razão, e cuja conversão, portanto, pode ser eficazmente auxiliada por uma elucidação ideológica. Não assim no comunismo. Este, negando o princípio da contradição, torna impossível uma discussão de ordem intelectual. Por isso mesmo, Pio XI, a “Divini Redemptoris”, praticamente não distingue entre o comunismo e os comunistas. Assim, menciona os princípios do comunismo como aparecem nas instituições e métodos dos bolchevistas (cf. A. A. S., vol. 29, p. 69); a doutrina dos comunistas (p. 75); os preceitos que
estes difundem (p. 69); os erros e meios violentos dos bolchevistas (p. 76); do mesmo modo, quando atribui aos comunistas o princípio da tirania da coletividade (p. 71); refere-se outrossim ao evangelho que os comunistas, bolchevistas e ateus anunciam (p. 72); ao poder político como meio de que os comunistas se apoderam para conseguir seu fim (p. 72); e em geral, onde normalmente se falaria de comunismo (como aliás se vê em várias traduções da “Divini Redemptoris”), o Papa não usa o termo abstrato para indicar a doutrina, mas o concreto que aponta as pessoas dos comunistas, aos quais ele diretamente acusa (p. 77).

De onde é lícito deduzir um especial cuidado do Santo Padre em prevenir os fiéis contra a pessoa dos sequazes de Marx, apontando-lhes o engodo que representa essa distinção entre comunismo e comunistas. Podemos, pois, concluir, e na conclusão fazer uma paterna advertência aos Nossos amados filhos em Jesus Cristo. Os verdadeiros comunistas rejeitam os primeiros princípios da lógica e os próprios fundamentos da ordem moral; são pessoas por cuja conversão se deve rezar, sem dúvida, e muito, mas em quem não se pode, de maneira nenhuma, confiar, e cuja ação se deve temer e combater.

Há comunistas e comunistas

Uma distinção melhor caberia entre comunistas e comunistas. Pois, de fato, nem todos os que se encontram sob o jugo soviético na Rússia e satélites podem ser considerados comunistas. Há, nessas infelizes nações, um número enorme de indivíduos, a maioria, que gemem debaixo do domínio cruel a que os comunistas os submeteram pela força. Esses tais só com uma grave injustiça se poderiam chamar de comunistas. Eles detestam o regime que sofrem em silêncio porque não lhes é facultado externar seu pensamento. Além desses, quer nos países de atrás da cortina de ferro, quer nos do chamado mundo livre, não são poucos os que aderiram ao partido comunista sem lhe conhecer toda a perversa doutrina e iludidos por enganosas esperanças. Deles, muitos o abandonaram já (na França, de um milhão de aderentes que contava o comunismo em 1945-1946, não restam hoje mais do que duzentos mil), outros ainda não se animaram a esse passo decisivo. De verdadeiros comunistas sobra uma pequena minoria (4 % da população na Rússia, porém ativa a audaz, que poderosamente coadjuvada pela boa fé de muitos não comunistas, e intencionalmente por não poucos dos chamados cristãos progressistas, cuja mentalidade só na aparência difere da  marxista, constitui o maior perigo atual para a civilização cristã (cf. Enc. “Divini Redemptoris”, ibid., pp. 66 e 76).

Tenhamos, pois, compaixão dos que sofrem sob o despotismo vermelho, bem como daqueles que a seita iludiu. Ao mesmo tempo, estejamos sempre em guarda contra os manejos e ardis dos comunistas. À vigilância juntemos a oração para que Deus nos proteja e os converta. Todos sejam abraçados pela caridade de nossa alma, traduzida em preces, sacrifícios e boas obras.

Dupla vantagem em expor a tática comunista

Quisemos, com a exposição da tática e dos ardis dos marxistas, proporcionar-vos, amados filhos, duas vantagens: de um lado, esclarecer-vos sobre o modo de combater o terrível inimigo; de outro, prevenir-vos a respeito do triste papel desempenhado a favor dele por aqueles que se dizem, muitas vezes, seus adversários. Cumpre ainda pôr em relevo a malícia do comunismo, considerado em si mesmo, e não mais em seus ardis e suas táticas.