Coluna do Padre Élcio: Sobre Problemas do Apostolado Moderno – o empregado, seu salário e a propriedade.

Por Padre Élcio Murucci – FratresInUnum.com, 11 de maio de 2019

Caríssimos, transmitirei, se Deus quiser, em algumas postagens,  as 11 proposições (de 70-80) falsas ou ao menos perigosas acompanhadas de imediato das proposições certas respectivas e das explanações. São excertos da Carta Pastoral Sobre Problemas do Apostolado Moderno, que contém um catecismo de verdades oportunas que se opõem a erros contemporâneos.

Dom Antonio de Castro Mayer
Dom Antonio de Castro Mayer

As 11 proposições fazem parte do VIII capítulo deste catecismo. Esta carta pastoral foi escrita em 06/01/ 953 por D. Antônio de Castro Mayer, então bispo da Diocese de Campos, RJ, hoje de saudosa e santa memória. “Defunctus adhuc loquitur”. Embora escritas na metade do século passado, são inteiramente oportunas essas considerações, porque o comunismo e o socialismo, embora por vezes se procurem  mascarar, porém, são sempre os mesmos, pois intrinsecamente maus; enquanto, por outro lado, a doutrina autêntica da Santa Madre Igreja é perene e viva, porque é a VERDADE, isto é, a PALAVRA DE JESUS CRISTO que permanece para sempre.

A proposição falsa ou ao menos errônea será escrita em itálico;  a proposição certa, em negrito.

Demos, pois, a palavra a D. Antônio de Castro Mayer:

72 – [Errado]:  O regime do salariado é contrário à dignidade do homem, e intrinsecamente injusto. A condição de trabalhador traz naturalmente consigo um direito à participação na propriedade da empresa, na sua direção e nos seus lucros.

[Certo]:  O regime do salariado é inteiramente consentâneo com a dignidade do homem e do cristão. O contrato de trabalho não traz como consequência necessária a participação do trabalhador na propriedade, na direção ou nos lucros da empresa.

EXPLANAÇÃO

Leão XIII, o Beato [São] Pio X, Pio XI (cf. “Quadragesimo anno”, A.S.S. 23, p. 199) e Pio XII ensinam que o regime do salariado em si é justo, e conforme à dignidade humana. A economia malsã do século XIX e do século XX tirou ao regime da salariado o seu verdadeiro caráter. Segundo a doutrina da Igreja, as relações entre patrões e operários revestem-se de um caráter familiar. Os empregados eram, outrora, considerados membros integrantes da sociedade doméstica, que se compunha das sociedades conjugal, familiar e heril. A palavra “patrão”, proveniente de “pater”, pai, e a palavra “criado”, derivada da noção de que os fâmulos eram formados e educados na própria casa, lembram bem este caráter. É o bastante para mostrar que nada há de deprimente na condição de empregado assalariado. Mesmo na atmosfera industrial e comercial, o caráter familiar dessas relações deve persistir. A Igreja quer que os patrões e operários sejam entre si, na medida do possível, como membros de uma mesma família, pais e filhos que colaboram para o bem-estar comum.

Do ponto de vista da justiça, o salário é um sistema de remuneração satisfatória, desde que realize as condições estabelecidas por Pio XI: suficiente para manter honesta e dignamente o operário e sua família. Na honesta e condigna manutenção inclui-se a folga necessária para que o operário previdente possa formar pecúlio, e melhorar a situação própria e da família, de maneira que também participe do aumento de bem-estar que o progresso da técnica e da produção traz à sociedade (cf. “Quadragesimo anno”): “As riquezas que se ampliam com desenvolvimento econômico-social, devem ser distribuídas entre as pessoas e as classes de maneira que se salve o que Leão XIII chamava de utilidade comum a todos, ou, em outras palavras, de maneira que permaneça incólume o bem comum de toda a sociedade” (A.A.S. 23, p. 196).

A participação do operário nos lucros da empresa é apresentada por Pio XI e Pio XII como recomendável, nunca, porém, como obrigatória (cf. Alocução ao Katholikentag, acima citada). Em certos casos, pode produzir bons frutos. Mas não é uma panaceia a ser aplicada sempre. E sobretudo não pode ser imposta por lei a todo um país. O mesmo se deve dizer da participação do operário na propriedade da empresa, ou na direção desta. Quanto a este último ponto, o sentido em que a doutrina católica admite esta participação é tal, que retém nas mãos do proprietário de empresa o poder de decisão e a responsabilidade de todo o andamento da fábrica ou estabelecimento de comércio (cf. Pio XII, Alocução ao 9º Congresso da União Internacional das Associações Patronais Católicas, A.A.S. 41, p. 285).

A sentença impugnada, levada a suas últimas consequências normais, representaria abolição da desigualdade de classes, termo último sonhado por todos os revolucionários.

73 – [Errado]: Segundo Santo Agostinho, o único proprietário das riquezas é Deus. O homem não passa de gerente. As riquezas pertencem, pois, à coletividade e o proprietário não possa de mero administrador delas para o bem comum.

[Certo]:  Segundo Santo Agostinho, o supremo proprietário das riquezas é Deus. Daí decorre que o proprietário deve fazer uso de seus bens segundo a vontade soberana de Deus. Deus, porém, não se identifica com a coletividade. Se o domínio de Deus sobre todas as riquezas é absoluto, o domínio da coletividade não o é. Transferir os direitos de Deus para a coletividade equivale a divinizar o Estado e imolar o indivíduo.

EXPLANAÇÃO

A sentença impugnada é estatólatra. E por isso chega a conclusões que só numa concepção estatólatra seriam admissíveis. De fato, o regime de propriedade individual procede da ideia de que o Estado não é um deus, nem um fim em si, mas apenas um meio. Pelo que a posição de proprietário consiste no exercício de um direito pessoal e próprio, e não no exercício de um direito delegado pelo Estado. E por isso é que dizemos que o proprietário de nenhum modo pode ser confundido com um mero gerente.

O que caracteriza o gerente, com efeito, é o exercício de direitos que não lhe são próprios, mas que lhe foram delegados. E este é o motivo porque a distinção entre proprietário e gerente é corrente em todas as legislações de países não comunistas (cf “Quadragesimo Anno”, A.A.S. 23, p. 196).

Um comentário sobre “Coluna do Padre Élcio: Sobre Problemas do Apostolado Moderno – o empregado, seu salário e a propriedade.

  1. Salve Maria
    A explanação é bastante coerente, mas, existem aspectos importantes sobre o capitalismo e a forma assalariada de trabalho e também sobre a concepção de propriedade pré e pós capitalismo que devem ser observadas para não cairmos em uma posição frouxa com relação à imoralidade da economia capitalista. Me parece que os católicos, diante dos horrores históricos dos socialismo (mais recentes), se esqueceram dos horrores históricos do capitalismo (que são mais antigos). Com a atual dicotomia revolucionária (direita e esquerda), os católicos infelizmente, para fugir da esquerda, passaram a adotar uma posição direitista que é liberal e contrária à Fé e moral católica. Cabe lembrar que mesmo o conservadorismo liberal é condenável posto que nele a Fé é apenas um acidente, e quando convém, essa ideologia passa por cima dos dogmas sem nenhum escrúpulo.
    Mas em todo caso, o senhor deixou claro que o trabalho assalariado está de acordo com a moral católica desde que cumpra-se certos requisitos, conforme está exposto na Rerum Novarum. Todavia, sem uma compreensão de fato do mecanismo do capital, corre-se o risco de cair em um certo relativismo moral, visto que a marca determinante do capital não é o pagamento assalariado nas condições da Rerum Novarum, muito pelo contrário, são raríssimos os casos em que se observa os aspectos morais necessários no momento da determinação de um salário.
    O fato é que o conceito de propriedade, em conformidade com a doutrina católica, foi destruído para dar a origem à uma nova concepção de propriedade segundo a ideologia liberal capitalista. Isso deu-se não apenas por meio da propaganda para moldar os costumes, deu-se mesmo na forma legal, basta ver as leis Inglesas do século XV até o XIX e a França a partir da Revolução, que verás como o conceito de propriedade foi modificado.
    Enfim, há muito a ser dito, estou escrevendo um livro a respeito para relembrar os católicos, conformados com o capitalismo, aplicado em suas duas vertentes, socialista ou liberal, de que este sistema econômico é realmente contrário à moral católica, além de ser anti natural do ponto de vista do direito.
    Peço vossa benção e orações para minha família! Parabéns pelo trabalho.

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