Por Um Leitor de FratresInUnum.com – 26 de outubro de 2020
Quinta-feira 22 de outubro de 2020, nos jardins do Vaticano, o cineasta Afineevsky (ao centro da fotogrfia) recebeu o prêmio Kinéo Movie for Humanity Award pelo seu documentário “Francesco”, que ‘promove causas sociais, humanitárias e ambientais no cinema’, conforme a criadora do prêmio, Rosetta Sannelli (2ª da dir. p/ esq.). Afineevsky disse: “Estou orgulhoso de que ‘Fancesco’, finalmente, a seu modo, sirva ao mundo para mudar as mentes e os corações”.
Fazia ele referência ao seu filme ou ao papa? Não sabemos.
* * *
Enquanto, na sacristia, fogo!
Padres, bispos e cardeais bombeiros já entraram em ação para apagar o incêndio que o kamikaze argentino do Vaticano ateou no mundo com sua última bravata.
Sem passar panos, porém, é preciso dizer que a história não é bem assim.
Acima, publicação do Instagram do diretor do documentário, recebido no Vaticano com bolo de aniversário pelo Papa Francisco – atitute de alegria pouco coerente para quem, segundo os cleaners, teria sido traído por ter sua fala editada ou mesmo deturpada.
A tal declaração do Papa que está no centro da polêmica na urbe e o orbe católico – e anticatólico – neste momento, não vem de hoje. O tal cineasta russo, Evgeny Afineevsky, cidadão americano e israelense ao mesmo tempo, autor do documentário em que a tal frase foi dita, não fez mais que editar uma colcha de retalhos de sermões e entrevistas do papa Francisco nos últimos anos. Não faltam entrevistas. Esse papa é tão comunicativo quando minguado e superficial é seu magistério. Ele conversa com estranhos, ele fala sem ensinar, ensina para confundir e confunde criando dissenção.
Tudo começou numa entrevista concedida à jornalista Valentina Alazraki, para uma rede mexicana de televisão em 2019. A entrevista que foi ao ar pode integralmente ser vista aqui.
Assistindo a partir do minuto 56 vemos a passagem polêmica.
Aqui se encontra as transcrições da entrevista.
Como nada é claro vindo desse Papa, que afirma nessa entrevista ser progressista e conservador ao mesmo tempo, constata-se que a essa frase incendiária sobre a suposta “lei de união civil” não consta na entrevista. Pelo visto a entrevista foi editada. E o cineasta russo teve acessos às fitas brutas em que o papa originariamente falava sobre uma “ley de convivencia civil”.
Isso significa mesmo união civil? É o que indicam as legendas em inglês do documentário. Mas nada disso está claro.
Em 2004, Dom Jorge Bergoglio, arcebispo de Buenos Aires, dizia num sermão contra o relativismo moral:
“Hoy enfrentamos un desafío no menos grave que el de las ideologías totalitarias del siglo XX: “es el riesgo de la alianza entre democracia y relativismo ético, que quita a la convivencia civil cualquier punto seguro de referencia moral, despojándola más radicalmente del reconocimiento de la verdad. En efecto, «si no existe una verdad última -que guíe y oriente la acción política-, entonces las ideas y las convicciones humanas pueden ser instrumentalizadas fácilmente para fines de poder. Una democracia sin valores se convierte con facilidad en un totalitarismo visible o encubierto»”.
Não fazia mais que citar Veritatis Splendor de João Paulo II, nr. 101:
“Após a queda, em muitos países, das ideologias que vinculavam a política a uma concepção totalitária do mundo — sendo o marxismo, a primeira dentre elas —, esboça-se hoje um risco não menos grave para a negação dos direitos fundamentais da pessoa humana e para a reabsorção na política da própria inquietação religiosa que habita no coração de cada ser humano: é o risco da aliança entre democracia e relativismo ético, que tira à convivência civil qualquer ponto seguro de referência moral, e, mais radicalmente, priva-a da verificação da verdade. De facto, «se não existe nenhuma verdade última que guie e oriente a acção política, então as ideias e as convicções políticas podem ser facilmente instrumentalizadas para fins de poder. Uma democracia sem valores converte-se facilmente num totalitarismo aberto ou dissimulado, como a história demonstra».
Em 2010 a Argentina discutia a questão do “matrimonio entre personas del mismo sexo”. O Cardeal Bergoglio se mobilizou contra a tal lei. O resultado foi a lei que está aqui. É possível que seja daí que venha o linguajar heterodoxo do papa – a palavra ‘convivencia’ significando ‘união’. E parece que diante de iminência da aprovação do ‘matrimônio homossexual’, o Cardeal Bergoglio fez o possível para, pressionando o governo, não aprovar o “matrimônio homossexual” que, segundo o Papa Francisco na entrevista de 2019, “é uma incongruência”. Diante da inevitabilidade da lei, o Cardeal agiu para impedir a tal lei e mudar o texto para “convivencia social” ou “união civil”.
Em carta daquele mesmo ano, o Cardeal escrevia a um encarregado da conferência episcopal, que organizava uma manifestação contra a tal lei, que ele (o cardeal) apoiava o movimento que pleiteava pelos direitos das crianças a terem um pai e um mãe. Ao mesmo tempo o cardeal externa sua preocupação de a nação argentina deve incluir a pluralidade e a diversidade de seus cidadãos (sic!). Ele diz que sim não se deve igualar as coisas que são distintas, ou seja, ‘união civil’ não é ‘matrimônio’. Ele ainda ressalta que a diferença entre união civil e matrimônio não é meramente terminológica. E diz que uma ‘convivência social’ é necessário que se aceite as diferenças. A íntegra da carta pode ser vista aqui.
Aqui a expressão ‘convivência social’ significa simplesmente SOCIEDADE CIVIL.
Mais uma vez, ainda a inevitabilidade da tal lei, o cardeal endossou em boletim arquidiocesano a posição da conferência episcopal de que:
Si se otorgase un reconocimiento legal a la unión entre personas del mismo sexo, o se las pusiera en un plano jurídico análogo al del matrimonio y la familia, el Estado actuaría erróneamente y entraría en contradicción con sus propios deberes al alterar los principios de la ley natural y del ordenamiento público de la sociedad argentina.
[Se uma união entre pessoas do mesmo sexo fosse reconhecida legalmente, ou fosse colocada em um nível jurídico análogo ao do casamento e da família, o Estado agiria erroneamente e contradiria seus próprios deveres ao alterar os princípios da lei natural e do ordenamento (jurídico) público da sociedade argentina.]
Afinal, ele é contra ou a favor da união civil?
Pelo visto, ele é os dois. Como tem sido em tudo desde que subiu à Cátedra de Pedro. Para o bom jesuíta dialético que ele não deixou de ser, os contrários não se anulam, verdade e mentira não se opõem, desde que ninguém se oponha a ele – o papa.
Desse episódio resulta, além de mais umas dezenas de sedevacantistas e o reforço do lobby gay dentro da igreja em todos os níveis, que VEMOS que o papa não pode absolutamente usar as chaves como quer. Quanto mais absolutista, quanto mais ditador, quanto mais peronista, como ele é, menos poder, menos autoridade, menos verdade, maior a desorientação, maior a confusão. Precisamos de um pontífice que diga apenas palavras de Cristo, não de um presidente que diga o que pensa. Desses aí o mundo está cheio. Nada mais banal do que dizer o que você pensa. Até o mais hediondo dos criminosos condenados diz o que pensa, ou a mais inocentes das crianças. É preciso pensar como Cristo. Falar como Cristo . Viver como Cristo. Morrer como Cristo para ressuscitar com Cristo.Isso é a glória. O resto é fumaça, lodo, estrume, pó.