Por Dr. Rodrigo Pedroso
A UJUCASP (União de Juristas Católicos de São Paulo) passa por mais uma crise. Tudo começou com a notícia do evento “Igualdade de gênero, educação e expressão” realizado pela PUC/SP, no último 31 de maio, às 19h. Estava previsto que o evento seria aberto pela própria reitora da Pontifícia Universidade Católica, contando com uma bancada comprometida unanimemente com a defesa da ideologia de gênero e da legalização do aborto. No evento, também seria lançado o livro Gênero e Educação – Fortalecendo uma agenda para as políticas educacionais.
“Por mais de uma vez, tive oportunidade de dizer que a Universidade é um espaço de livre discussão de posições e idéias, É da essência mesma da Universidade que assim seja. O que me decepciona é que muitos dos nossos são professores ali e não se manifestam nestes temas em que temos posição clara! Preferem o silêncio, a ausência, a crítica estéril, intra-muros, à boca pequena, ao invés de comparecerem e debaterem, na mais rica tradição universitária! Quando celebro os mártires ou os apóstolos, sempre me lembro e me pergunto se estaria preparado para suportar “os cárceres e flagelos” que acompanharam suas vidas. Assim, senhores e senhoras, estão todos convidados a comparecerem ao evento e assumir posição!
Padre Rodolpho.”
A resposta do pe. Rodolpho motivou os seguintes comentários do dr. Rodrigo Pedroso, advogado e também membro da UJUCASP:
“Revmo. Padre Rodolpho
Caríssimos confrades
Com todo o respeito, sinto-me obrigado a não apenas divergir do posicionamento do Revmo. Pe. Rodolpho, como também manifestar minha perplexidade.
Sem querer entrar no mérito do direito canônico, porém mesmo perante o direito positivo secular tal posicionamento é carente de sentido.
É certo que a universidade é um espaço de livre discussão de posições e ideias. Entretanto, não se pode omitir que toda liberdade humana, pelo menos em sentido moral e jurídico, é necessariamente limitada pelas características próprias da instituição em que se desenvolve. E, perante o direito positivo brasileiro, a PUC/SP é uma instituição confessional de ensino, tal como prevista no art. 20, III, da LDB.
Conforme o referido dispositivo da legislação, confessional é a instituição privada de ensino, instituída por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específica, sem fins lucrativos, que incluam na sua entidade mantenedora representantes da comunidade.
Portanto, conforme a definição legal, as instituições confessionais de ensino, no direito brasileiro, apresentam uma peculiaridade que limita em seu seio a livre discussão de posições e ideias. Uma instituição confessional de ensino, por definição e por imposição legal, não pode ser neutra, ela existe para promover uma doutrina específica, uma determinada visão de mundo. A discussão de posições e ideias numa instituição confessional de ensino não se pode dar nos mesmos termos que numa instituição laica, até porque se presume que a instituição confessional já assumiu posições sobre algumas coisas, que são, portanto, indiscutíveis e inegociáveis. Numa instituição confessional, a livre discussão de posições e ideias deve desenvolver-se dentro do quadro delimitado pela doutrina por ela adotada e promovida.
A resposta do Revmo. Pe. Rodolpho é falha não apenas por desconhecer totalmente este importante ponto do direito positivo brasileiro, como também por não corresponder aos fatos denunciados. Efetivamente, o que se anuncia na PUC/SP não é um debate pluralista e igualitário entre defensores e impugnantes da ideologia de gênero, em paridade de armas, o que já seria escandaloso numa universidade católica, por meter em pé de igualdade o falso e o verdadeiro. Pelo contrário, trata-se de um evento de pura promoção da ideologia de gênero, em que todos os seus palestrantes estão comprometidos com ela. Entre eles está a prof. Silvia Pimentel, veterana do abortismo nos meios jurídico-acadêmicos brasileiros e especialmente na PUC/SP (aliás, é mais uma vergonha para a PUC/SP que essa mulher seja docente lá) e representantes de diversas ONG’s abortistas.
E, caso algum dos nossos cometer a imprudência de seguir o conselho do Revmo. Pe. Rodolpho, comparecendo ao evento e lá assumindo posição, sabemos que seremos acusados de perturbar o simpósio, dirão que nossa manifestação não estava prevista, isso se tiverem a bondade de não nos insultar, agredir e cobrir de escarros. De fato, os defensores da doutrina supostamente promovida pela instituição oficialmente confessional estarão na plateia, no piso, no chão, enquanto os seus inimigos estarão pontificando na mesa, com apoio institucional. Pelo jeito, Revmo. Padre Rodolpho, o senhor não é bom de conselhos e o venerável Cardeal-arcebispo deveria meditar no assunto.
Voltando à legislação, a definição legal do art. 20, III, não é à toa, porque a mesma LDB autoriza, em seu art. 77, a destinação de recursos públicos às instituições confessionais de ensino.
Nesse sentido, quando uma instituição confessional de ensino perde a sua identidade, ela torna-se uma fraude e uma fraude que pode receber recursos da Fazenda Pública. Não dá para nos indignarmos com a corrupção da Lava-jato, da JBS ou de não sei mais o quê, se não tivermos a mesma indignação quando uma instituição se mascara de confessional sem o ser, mas com isso adquirindo prerrogativas na legislação brasileira, como o direito de receber fundos públicos. Aliás, de acordo com a Lei Federal n. 8.429/1992, tal comportamento poderia caracterizar ato de improbidade administrativa, com a responsabilização de todos os que, mesmo não sendo agentes públicos, induziram ou concorreram para a sua prática, ou dele se beneficiaram.
Graça e paz,
Rodrigo R. Pedroso.”
Aos comentários de Pedroso reagiu o pe. Rodolpho renunciando à diretoria eclesiástica da UJUCASP, com as seguintes palavras:
“Considerando as palavras do ilustre Dr Rodrigo Pedroso, e outras que se fizeram ouvir nestes dias, tomo a decisão de entregar meu cargo de Diretor Eclesiástico da Ujucasp ao Eminente Cardeal que me nomeou. Com certeza este sodalício necessita de um Diretor mais “ortodoxo” do que este pobre Sacerdote. Mantenho minhas atividades na PUCSP, como Secretario Executivo da Fundação mantenedora, agindo conforme meus princípios e conforme meu espírito aberto, democrático e cristão verdadeiro, que como Jesus com a Samaritana, ao invés de condenar, mostra a Água Viva da salvação a todos os corações ressecados pelo pecado. Prefiro assim fazer do que partir para o apedrejamento! Proclamo a Boa Nova e não a Lei Mosaica! A todos os irmãos e irmãs desejo Paz e Bem!”
A seguir, a Dra. Ana Paula de Albuquerque Grillo, consultora jurídica chefe da mantenedora da PUC/SP também tornou pública a renúncia a seu cargo na diretoria da UJUCASP.
Entretanto, apesar dos enfáticos termos de ambas as renúncias, no último 2 de junho a UJUCASP divulgou uma nota, atribuída a seu presidente, informando que, tendo ouvido o cardeal moderador, sua diretoria estava mantida, com todos os membros em exercício de seus respectivos mandatos.
Esperam-se mais novidades nos próximos dias, pois não parece que a singela nota emitida pela diretoria será suficiente para superar a nova crise por que passa a UJUCASP.
* * *
Leia também: