Por FratresInUnum.com, 28 de maio de 2020 – Nos anos 80, Chico Anysio criou dois personagens que se celebrizaram na televisão: Caretano Zeloso e Zelberto Zel, uma sátira ao estilo rebuscado dos cantores quase homônimos, que falavam um palavrório difícil, mas que, no fundo, não significava coisa alguma.
Ao assistir o vídeo de Dom Walmor Azevedo, presidente da nossa ilustre CNBB, a lembrança não pôde ser evitada. Mais amante da extravagância verbal que da exatidão dos conceitos, o arcebispo discorreu acerca de três ameaças e três oportunidades para o próximo quinquênio na Igreja do Brasil. Abaixo, apresentamos a descrição dos seis pontos, tais como ditos por ele. Agora, fazemos uma breve análise.
Para ele, a primeira de todas as ameaças é o “crescimento de segmentos conservadores e reacionários”, os quais, sempre segundo ele, levam “à estagnação e ao comprometimento do diálogo construtivo, com preponderância de obscurantismo e escolhas medíocres”. Um pouco mais abaixo, talvez a sua ideia fique mais nítida, quando ele apresenta o desejo de que a Igreja se apresente como “Igreja da Palavra”, produzindo uma “reviravolta” que venha a impedir ou a reagir ao que ele chama de “cristianismo torto”, em face ao que seria a verdadeira missão do cristianismo: “ser vetor do sonho de um mundo novo”.
Mais abaixo, ele ainda deseja “novas feições e dinâmicas na ministerialidade da Igreja”, com “efetivo protagonismo dos cristãos leigos e leigas” e “da vida sacerdotal, liberada de cristalizações que a desfiguram” (entenda-se: o sacerdócio tradicional).
O discurso deste bispo é a demonstração mesma da falência do catolicismo brasileiro, estacionado no horizonte mental dos anos 80, auto-referencial até em suas próprias expressões, completamente insignificante para qualquer pessoa normal. Assim como toda a esquerda é tributária daquele heroísmo imaginário contra uma repressão que, na realidade, apenas se limitou à conservação do poder nominal, enquanto lhes deixava todo o espaço aberto para a revolução cultural, mesmo contra o fato de que toda a população brasileira os tenha deixado falando sozinhos, eles persistem em se imaginarem os grandes revolucionários, e permanecem reféns de um monólogo teimoso, doente, alucinado, que não chegará a lugar nenhum.
O Brasil já é um país protestante. E é por causa deles! Foi o clero que abandonou o discurso conservador; e o povo, que continua sendo conservador, migrou para as seitas pentecostais e fez a reviravolta que eles pretendem reverter, mas sem força alguma. O poder de mobilização dos bispos já era nulo e, agora, com a dispersão forçada dos fieis por causa dessa interminável quarentena, se tornará ainda mais impossível. E eles não conseguem enxergar!
Qualquer pessoa que frequente a maior parte das paróquias católicas do país sabe que, em sua maioria, são frequentadas por idosos. Nas grandes cidades, as dioceses são formadas por um clero idoso, que continua repetindo aqueles mesmos chavões de décadas, pois foi a única coisa que conseguiu aprender em sua formação deficiente.
Eles pretendem reverter o crescimento do “cristianismo torto” não apresentando um “cristianismo reto”, mas um “cristianismo” (muito entre aspas) calculado para atender as “interpelações fortes vindas do impressionante volume de mudanças em curso na cultura mundial”… A que diabos se refere o arcebispo? À gay culture, ao multiculturalismo, ao ecologismo que protege árvores enquanto defende a matança de fetos, ao feminismo que pretende proteger contra o alegado feminicídio a todas as vozes do feminino (mesmo as dos homens que se declaram mulheres)? Mas, para isso, não precisa haver Igreja. E é isso que a população está gritando, migrando, aos milhares, para os cultos protestantes pentecostais (note-se que as próprias igrejas protestantes liberais estão numa pior crise ainda, o que mostra que o problema é, sobretudo, ideológico).
A maior ameaça para a Igreja não é nada disso que menciona o arcebispo. Infelizmente, a maior ameaça é o próprio clero modernista, mesmo. Ele alega o protagonismo dos leigos como resposta… Ah, mas não dos verdadeiros leigos! Estes bispos gostam apenas daqueles leigos clericalizados por eles, ideologizados, imagem do seu próprio passado militante e esquerdista. Para eles, a multidão de leigos que quer ser católica precisa ficar em casa ou, senão, mudar-se para a primeira porta de garagem que se abra à sua frente.
É triste, mas é a realidade. Por trás de toda a parlenga de Dom Walmor há apenas um episcopado que fala sozinho e é aplaudido por sua corte. Eles terão de sacrificar a população inteira ao protestantismo para perceberem, então, que estavam errados.
(Abaixo, a transcrição das três maiores ameaças e as três maiores oportunidades da Igreja, segundo Dom Walmor Oliveira de Azevedo:)
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Três ameaças
1) Crescimento de seguimentos conservadores e reacionários, levando à estagnação e ao comprometimento do diálogo construtivo, com preponderância de obscurantismo e escolhas medíocres, com força de justificação de desigualdades existentes e neutralização da força magistral da doutrina social da Igreja.
2) Dificuldades para reverter situações com funcionamentos pesados, que custam muito, comprometendo a sustentabilidade e o compromisso com a preservação ambiental, por insistências e cristalizações advindas do intelectualismo, fazendo perder sensibilidade humanitária e relacional, com ganhos de adesões e presença. Por isso, o peso precisa ser revisto, de modo marcado, como é característica deste terceiro milênio, pela leveza.
3) Fragilizações de processos de evangelizações e serviços na defesa e promoção da vida, perda de forças próprias, com comprometimento da inegociável credibilidade, em razão de incongruências e incoerências no âmbito moral, seja no âmbito da gestão, em suas nuances todas, como também no específico do testemunho, como bem primeiro da pertença eclesial e da autenticidade do discipulado no seguimento de Jesus Cristo.
Três oportunidades
1) Escuta de interpelações fortes vindas do impressionante volume de mudanças em curso na cultura mundial, com apelos humanitários, sobretudo oriundos dos clamores dos pobres da terra e das possibilidades tecnológicas-midiáticas, para efetivação de um novo modo de presença pública, referindo-me também a biotecnologias, oportunizando adequações e novas respostas.
2) A Igreja precisar usufruir mais decisivamente do seu próprio tesouro doutrinal e de fé, particularmente como Igreja da Palavra, ganhando esta centralidade, podendo fazer uma reviravolta religiosa na direção de não permitir ou de reagir aos desdobramentos vários do cristianismo torto, que está em amplo crescimento na sociedade brasileira, recuperando do cristianismo a sua força como vetor determinante do sonho de um mundo novo, solidário e fraterno.
3) À luz da mistagogia evangélica – uma espiritualidade profunda, contemplativa – com rica inspiração de tradições e experiências bimilenares na nossa Igreja, conquistar novas feições e dinâmicas na ministerialidade da Igreja, com efetivo protagonismo dos cristãos leigos e leigas, com qualificação maior da vida consagrada, com sua profecia, e da vida sacerdotal, liberada de cristalizações que a desfiguram, com propriedades para arrastar pela força do testemunho.