Ahhhhh tá…

Do artigo de Mario Ponzi, na edição de 30 de março de 2012 do Osservatore Romano, sobre o encontro entre o Papa Bento XVI e Fidel Castro:

Castro mostrou-se cansado e marcado pelos anos, mas lúcido e vivaz. E quando se encontrou face a face com Bento XVI compreendeu-se como na realidade ele tinha o desejo de o conhecer pessoalmente. Sem dúvida, tratou-se de um encontro autêntico. Castro demonstrou imediatamente uma grande curiosidade de conhecer, de saber. Dirigiu ao Papa uma série de perguntas de amplo alcance. A primeira foi inesperada: mas por que motivo a liturgia mudou tanto? A sua recordação estava fixa no período precedente ao Concílio, e o Pontífice começou a sua resposta precisamente pelo Vaticano II. Os padres conciliares julgaram que se devia mudar a liturgia para a tornar mais acessível aos fiéis, explicou o Papa. Mesmo se isto — acrescentou — criou situações que sugeriram ulteriores modificações, também para dar aos fiéis a possibilidade de penetrar mais profundamente no seu significado verdadeiro e, portanto, de participar de modo mais consciente.

Como diversos articulistas notaram, as missas celebradas em Cuba por João Paulo II (1998) e Bento XVI provavelmente foram as únicas acompanhadas por Fidel Castro desde sua juventude, quando estudante, na década de 30, em um colégio de jesuítas. Impossível não recordar as palavras de Monsenhor Klaus Gamber (em uma obra prefaciada pelo então Cardeal Ratzinger):

Um católico que, durante vinte anos, tivesse ficado longe da Igreja e que quisesse, após uma conversão íntima, praticar de novo sua religião, não reconheceria sua Igreja na atual. Apenas entrando num templo católico – sobretudo se é fortemente moderno – tudo lhe pareceria estranho. Pensaria ter se enganado e ter entrado em outro tipo de comunidade cristã. Quadros e imagens quase desapareceram das igrejas. Normalmente no lugar do Crucifixo em cima do altar há uma indefinível “obra de arte” moderna. O próprio altar se converteu num bloco de pedra desnudo, que mais do que altar parece uma tumba megalítica. Nosso católico não encontrará por ali o sacrário, nem a mesa da comunhão e notará a ausência do aroma de incenso, cujo perfume permanecia durante todo o dia no santuário. E possivelmente também não encontrará confessionários. É que sucedia àquela senhora católica que por amor a seu marido protestante adotou há anos a religião deste último; certamente ela continuava participando da missa em sua Igreja católica, porque ali se sentia na casa de Deus. Faria o mesmo hoje, quando não se distingue, por assim dizer, uma missa católica e uma ceia protestante?

Detalhes do encontro entre o Papa e Fidel.

Canção Nova Notícias – Bento XVI manifestou sua felicidade por estar em Cuba e sua gratidão pelo acolhimento recebido pelo povo e pelo país. Por sua vez, Fidel afirmou que tinha um desejo pessoal de encontrar o Papa e que seguiu todos os eventos desta viagem pela televisão. Houve uma brincadeira sobre a idade dos dois, que são parecidas (Bento XVI completará 85 anos daqui poucos dias e Fidel, em agosto, 86), e o Papa disse: “Sou idoso, mas ainda posso desempenhar meu dever”.

Houve uma troca de ideias, perguntas de Fidel ao Papa para saber dele seu pensamento e informações que desejava, pois, disse ao Pontífice, sua vida é dedicada à reflexão, ao estudo e à escritura desde que não ocupa mais funções políticas públicas. O ex-presidente perguntou sobre a liturgia da Igreja, o que faz um Papa, que por sua vez falou do significado de suas viagens. Falou-se das dificuldades do tempos de hoje da humanidade, dos desafios que se apresentam à ciência, dos problemas ecológicos, como cada religião enfrenta a multiplicidade das respostas. Comentou-se a dificuldade que a humanidade enfrenta quando se afirma a ausência de Deus e a relação entre fé e razão.

O encontro durou meia-hora,mas poderia ter durado muito tempo”, referiu padre Lombardi. No final, Fidel pediu ao Papa que enviasse alguns livros sobre os temas que debateram juntos e se ele já sabia quais eram esses livros. O Papa respondeu que deveria pensar. Também estavam presentes no encontro a esposa de Fidel e dois filhos.

Padre Lombardi fez um balanço desta viagem, afirmando que Bento XVI encontrou nas duas etapas cubanas desta viagem cerca de 500 mil pessoas entre Santiago de Cuba e Havana e que a imagem principal é a do Papa como Peregrino da caridade no Santuário nacional. Destacou o empenho dos jovens, com a vigília realizada esta madrugada.

Uma das perguntas dos jornalistas foi sobre se Fidel pertencia à Igreja Católica. Padre Lombardi respondeu que existe diferença entre ser batizado e participar plenamente de uma comunidade.

Sobre um hipotético encontro com o Presidente venezuelano Hugo Chávez, em Cuba nesses dias para um tratamento de saúde, o porta-voz vaticano afirmou que não houve um pedido para que este evento se realizasse

Sob o olhar de Pio XI, Bento XVI encontra Fidel Castro.

Santa ironia: Bento XVI encontra Fidel Castro sob o olhar de Pio XI, Papa que em 1938 condenou o comunismo como "intrinsecamente mau" na Encíclica Divini Redemptoris. Foto: Reuters.
Santa ironia: Bento XVI encontra Fidel Castro sob o olhar de Pio XI, Papa que em 1938 condenou o comunismo como "intrinsecamente mau" na Encíclica Divini Redemptoris. Foto: Reuters.

Havana (Rádio Vaticano) – Depois da Missa na Praça da Revolução, Bento XVI voltou à Nunciatura Apostólica em Havana onde, neste momento, se encontra com o ex-presidente cubano Fidel Castro, que no próximo dia 13 de agosto completará 86 anos. Fidel Castro já havia encontrado duas vezes João Paulo II: em 1996 no Vaticano e, depois, em 1998 durante a histórica visita do Papa Wojtyla à Ilha caribenha.

Fidel afirmou que “com muita satisfação” saudaria o Papa, assim como já havia feito com João Paulo II, “um homem ao qual o contato com as crianças e com os cidadãos humildes do povo despertava invariavelmente um sentimento de afeto”. “Decidi pedir alguns minutos do tempo do Papa mesmo sabendo que existem muitos compromissos – havia dito Fidel Castro – quando soube que o Papa “apreciaria este modesto e simples contato”.

Sobre o encontro teremos mais informações após a coletiva de imprensa do diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Padre Federico Lombardi. (RB)

“Meu pai, Fidel, não se converterá nunca. Se sente imortal”.

A filha de Castro: “Muitos compromissos; Ratzinger deveria ver os dissidentes”.

Por Paolo Mastrolilli, de Havana | Tradução: Fratres in Unum.com

Alina Fernández, filha de Fidel Castro.
Alina Fernández, filha de Fidel Castro.

« Não creio na conversão de meu pai, por um simples motivo: ele se considera imortal ». A estrondosa fuga de Cuba de Alina Fernández foi há vinte anos, mas a amargura e a desilusão permaneceram imutáveis na voz da filha de Fidel Castro. Alina nasceu em 1956, da relação que então o carismático revolucionário tinha com a bela Natalia Revuelta. Cresceu à sombra desta enorme figura até que, em 1993, escapou desfarçada com uma peruca e com os documentos falsos de uma turista espanhola. Primeiro para Madri, depois Miami, onde seu programa radiofônico “Simplesmente Alina” se tornou um dos pontos de referência para a comunidade dos exilados.

Senhora Fernández, o Papa vai a Cuba e é natural que haja rumores sobre a conversão de Fidel. Eles são críveis?

Há tempo também diziam o mesmo de mim, mas [os rumores] careciam de fundamento. Seria belo que meu pai, doente e de idade avançada, regressasse às raízes da fé na qual cresceu, quando estudava com os jesuítas. Isso devolveria a ele a humanidade que perdeu. Mas não o creio, porque acho que ele se considera imortal.

É um acerto a visita do Papa a Cuba?

Me vêm sentimentos contraditórios. Não há dúvida que meu pai e meu tio Raúl aproveitarão ao máximo esta visita, porque ir a um país significa lhe dar legitimidade. No entanto, para os fiéis, a presença do Papa é muito importante. Quando eu era pequena, ser católico em Cuba era um “handicap” ideológico: tinhas que esconder a tua fé, para que não te perseguissem. Agora já não é assim.

Esta visita pode acelerar a mudança no contexto político?

Não acredito. O povo comum tem menos expectativas do que na viagem que fez João Paulo II, por duas razões: a primeira é a personalidade diferente de Bento XVI, e a segunda é que já não acredita na possibilidade de que a visita de um líder religioso possa gerar uma mudança. Isso se deve, em parte, ao comportamento da Igreja Católica local, que, em certos casos, dá a impressão de renunciar a sua missão natural de defender os direitos humanos para poder negociar com o regime. Assim obteve vantagens para os fiéis, mas perderam o povo. Isto é, em Cuba não existe um Jerzy Popieluszko.

O Papa deveria se encontrar com os dissidentes?

Creio que sim. Não quero criticar à distância, mas acredito que seria importante. Dizem que não pode fazê-lo porque se trata de uma visita pastoral, e por isso o Papa não pode realizar gestos políticos, mas é um argumento contraditório que não se sustenta. Não deveria, como pastor, ver os fiéis que estão contra o regime?

Não houve reformas desde que seu tio chegou ao poder?

Raúl era a melhor pessoa da minha família, inclusive me dirigi a ele para que me ajudasse. Mas é um político pragmático e um ótimo administrador: faz apenas o que serve ao regime. É certo que permitiu o trabalho autônomo, em profissões como mecânico, encanador ou agricultor, mas são coisas pequenas para enfrentar uma crise econômica enorme. Em Cuba não há empresários.

Os cubanos esperam pelo Papa que, após passar pelo México, chega à ilha hoje.
Os cubanos esperam pelo Papa que, após passar pelo México, chega à ilha hoje.

Raúl e Fidel já são idosos: qual a estratégia deles?

Manter o poder. Nada além, nada de transição.

Quando foi a última vez que falou com o seu pai?

Há muitos anos, já nem me recordo quando. Fidel foi a tragédia de Cuba, e eu a sofri mais que muitos outros. Hoje falamos muito do fundamentalismo islâmico, mas também existiu o fundamentalismo comunista, e era feroz: se discutias, eras considerado, automaticamente, um inimigo e um traidor. Com maior razão se criticavas desde dentro da família Castro.

A senhora tentou voltar a Cuba?

Não.

Seu pai está velho e doente, não gostaria de falar com ele?

Não acredito que um dia volte a vê-lo.  Não há interesse, de nenhuma parte. Ele não quer me ver e eu não entendo por que teria de procurar por um homem com que não compartilho 90% do que já fez. Até o amor filial e paterno se desvanece se ninguém o alimenta.

Beatificação de João Paulo II e Cuba: dilema de consciência para os católicos cubanos.

Armando Valladares – Mídia sem Máscara

Não me consta que durante o processo de beatificação deste Pontífice se tenham dado a conhecer publicamente interrogações sobre seu pensamento com relação ao comunismo cubano, pensamento que inclusive parece ir além do campo diplomático e adentrar-se no plano doutrinário, daí a necessidade de consciência de expor, da maneira mais respeitosa e filial possível, as presentes reflexões.

A anunciada beatificação de S.S. João Paulo II, prevista para se realizar no próximo 1º de maio, coloca muitos fiéis católicos cubanos em um dilema de consciência sem precedentes que, por causa de sua fé, da veneração à sua Pátria e do amor por suas famílias se opõem ao comunismo. Com efeito, esses fiéis católicos vêem com perplexidade e com o coração dilacerado tudo aquilo que o referido Pontífice teria feito em algumas circunstâncias, e deixado de fazer em outras, para favorecer direta ou indiretamente o comunismo cubano.

Cito na continuação, resumidamente, alguns exemplos que tive oportunidade de comentar extensamente ao longo dos anos, em diversos artigos sobre a colaboração eclesiástica com o comunismo na ilha-cárcere, e conto antecipadamente com a compreensão dos leitores. Faço-o enquanto fiel católico e enquanto cubano, com todo o respeito possível à Igreja, disposto a ouvir e analisar eventuais explicações de fontes sabidamente autorizadas, que até o momento não são de meu conhecimento, sobre os dolorosos fatos históricos que se concede sucintamente na continuação.

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