Segundo imprensa brasileira, o comitê organizador recebeu uma doação para o evento encerrado a fim de saldar parte da dívida de 28 milhões de euros.
Por Vatican Insider, 4 de janeiro de 2014 – Tradução: Fratres in Unum.com – A imprensa brasileira informa hoje que o Comitê Organizador da JMJ 2013 (arquidiocese do Rio de Janeiro) recebeu uma doação de 3,6 milhões de euros (]proximadamente 11 milhões de reais] do Papa Francesco para ajudar a cobrir a dívida deixada pelo grande encontro de jovens no mês de julho do ano passado.
Segundo a auditoria da empresa Ernst&Young – informa o blog Il Sismografo -, a Jornada Mundial da Juventude do Rio encerrou com uma dívida de 28,3 milhões de euros (equivalente a 91,3 milhões de «reais»).
Uma parte importante da dívida foi paga com proventos da venda de um importante imóvel da arquidiocese (alugado para uma clínica) e também com doações (4 milhões de euros), assinaturas, licenças comerciais e outras receitas menores. A dívida de 28,3 milhões de euros era composta dessa maneira: 6,26 milhões de euros para fornecedores e 22,92 milhões de euros para várias despesas gerais.
Dívidas da Jornada Mundial da Juventude: A articulada colunista Mônica Bergamo, da Folha de São Paulo e da Band News FM, afirma que Dom Orani Tempesta, Arcebispo do Rio, contactou inclusive o lobistaconsultor (de grandes empresas que dependem do governo) José Dirceu, condenado à prisão por sua atuação no caso do Mensalão, para pedir ajuda. Seria importante que a Arquidiocese viesse a público esclarecer este fato.
Por dívidas, organizadores da Jornada Mundial da Juventude venderão cemitério
Por Mônica Bergamo | Folha de São Paulo – Depois de se desfazer do prédio do hospital Quinta D’Or, no Rio, para saldar dívidas da visita do papa Francisco ao Brasil, os religiosos que organizaram a Jornada Mundial da Juventude preparam outra tacada: vão colocar à venda o cemitério do Catumbi, na mesma cidade.
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O espaço é de uma ordem religiosa, que espera arrecadar cerca de R$ 80 milhões com o negócio. Os recursos seriam repassados como empréstimo para o Instituto Jornada Mundial da Juventude. Estima-se que o rombo da festa estrelada pelo pontífice ultrapasse os R$ 100 milhões.
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A venda do cemitério deve esbarrar em alguns percalços na atração de investidores. O local tem muitos jazigos eternos. E ainda precisa de autorização para construir crematório e cemitério vertical.
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O aperto é tão grande que dom Orani Tempesta, arcebispo do Rio, pediu ajuda até a José Dirceu para resolver os problemas. O religioso é amigo de Evanise Santos, ex-mulher do petista, com quem almoçou recentemente e também conversou sobre o assunto. O ex-ministro aconselhou os religiosos justamente a vender patrimônio, escapando de juros de empréstimos bancários.
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[Atualização – 6 de setembro de 2013, às 15:23]
José Dirceu e o vermelho da Igreja
Por Lauro Jardim – Veja| Além de José Dirceu, conforme Mônica Bergamo revelou hoje na Folha de S. Paulo, Gilberto Carvalho também está se movimentando para ajudar a Igreja, que tem dívidas de 100 milhões de reais deixadas pela Jornada Mundial da Juventude (JMJ).
Entre os encontros que Dirceu teve para ajudar a tirar o vermelho da JMJ, um foi com o advogado Sérgio Bermudes e outro com dom Orani Tempesta.
Folha de São Paulo – A Arquidiocese do Rio está se desfazendo de parte do patrimônio da Igreja Católica para tentar saldar a dívida deixada pela Jornada Mundial da Juventude.
Um prédio em São Cristóvão, bairro da zona norte da cidade, está sendo vendido para a Rede D’Or de hospitais por R$ 46 milhões. No imóvel funciona, desde 2001, o hospital Quinta D’Or.
O prédio pertence à Casa do Pobre de Nossa Senhora de Copacabana, entidade ligada à igreja. Estava alugado à Rede D’Or desde a inauguração do hospital.
Com o fim da Jornada, em 28 de julho, o arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, procurou empresários para conversar, em busca de uma solução para a dívida –cujo montante não foi revelado.
Uma das ideias que surgiram dessas conversas foi a venda do prédio onde, até os anos 80, funcionou o Hospital São Francisco de Paula, da Ordem de São Francisco dos Mínimos.
Há duas semanas, foi assinada uma escritura de promessa de compra e venda entre a Casa do Pobre de Nossa Senhora de Copacabana e a Rede D’Or.
Procurado pela Folha, o vice-presidente do comitê organizador da Jornada, dom Paulo Cezar Costa, hesitou em dar detalhes sobre a negociação. “Isso não está totalmente concretizado.”
Mas o bispo reconheceu que está sendo feito um levantamento dos imóveis da igreja que poderão ser usados para quitar as dívidas.
“Não pensamos em vender muitos imóveis, até porque nem temos muitos imóveis para vender.” A direção da Rede D’Or confirmou à Folha a compra do prédio.
Pouco antes do início da Jornada Mundial da Juventude, o comitê organizador estimou que o custo do encontro internacional de jovens católicos, que teve a presença do papa Francisco, pudesse custar até R$ 350 milhões, dos quais pouco mais de R$ 100 milhões viriam dos governos federal, estadual e municipal.
Segundo a igreja, a principal fonte de receita da Jornada estaria nas inscrições de 427 mil peregrinos, que pagaram entre R$ 100 e R$ 600 para ter direito a pacotes que incluíam alimentação, transporte e hospedagem.
A Arquidiocese do Rio, no entanto, não informa qual foi o valor arrecadado.
“Ainda vai levar algum tempo para chegar aos números definitivos da Jornada”, disse dom Paulo Cezar.
O pai e sua filhinha, anencéfala, de Caicó, RN, que levaram as ofertas ao Santo Padre na Missa de envio da Jornada Mundial de Juventude 2013. A mãe, ao saber ao longo da gravidez que uma de suas filhas era anencéfala (são gêmeas), recebeu a orientação médica sobre o seu suposto direito ao (inexistente) aborto “legal” (como prevê o infeliz PLC 3/2013). A mãe disse não.
Que Nossa Senhora Aparecida livre o Brasil do flagelo e da maldição do aborto.
Alguns avestruzes, se esforçando para não enxergar, insistem que não se tratava de copos plásticos na administração da Sagrada Comunhão durante a Missa de envio da JMJ 2013. Bem, temos imagens em alta resolução que provam o fato. Clique para ampliar:
Por Catarina Maria B. de Almeida – Fratres in Unum.com | Desde que ouvi falar que a Jornada Mundial da Juventude seria aqui no Rio, veio-me à mente algumas imagens de versões anteriores, onde a dança, o canto, a imodéstia e a exaltação dos sentimentos juvenis se sobrepunham à catequese sólida e ao fomento da fé e cultura católica. Contudo, uma vez que teríamos a nossa própria versão da JMJ, pensei que o melhor a fazer seria vê-la de perto, para ter uma ideia melhor formada sobre um evento tão portentoso. Não participei da JMJ como peregrina ou voluntária, sendo, portanto, meu relato impressões pessoais de uma simples observadora católica. Afinal, de uma forma ou de outra, a JMJ afeta e envolve a vida dos moradores das cidades por onde passa, quer sejam peregrinos ou simples habitantes. Assim, enumero abaixo os tópicos que mais me chamaram a atenção nesta Jornada.
ASPECTOS POSITIVOS EM UM MUNDO CARENTE DE AMOR E TERNURA
Alegria e simplicidade
Creio que para os habitantes do Rio, a primeira impressão da JMJ, independente de religião, é o clima da cidade durante o evento. Por quase uma semana fomos todos envolvidos em uma atmosfera de alegria, leveza e simplicidade juvenil. Se nas semanas anteriores estávamos tensos com os rumos dos protestos de rua, os relatos de vandalismo e saques em várias capitais do país, de repente, os jovens trouxeram ao Rio de Janeiro precisamente o oposto. E não foi só a alegria contagiante dos jovens, mas também certa benevolência e cortesia por parte da população carioca. Nunca durante esses dias tivemos notícias de confusões e tumultos causados pelos peregrinos. Eles tiraram de letra até mesmo os percalços de um sistema de transporte caótico e aceitaram com resignação a transferência de última hora do local da Vigília de Oração e Missa de Envio, suportando o que para nós cariocas adultos teria sido motivo de muitos resmungos e xingamentos.
Ternura
Para utilizarmos uma palavra tão cara ao Papa Francisco, gostaria de ressaltar também que não raras vezes o aspecto afetivo se fez presente durante a JMJ, deixando-nos com sentimentos ambivalentes. Abraços sinceros de jovens locais e internacionais foram partilhados, bem como a solicitude dos voluntários, que incansável e gentilmente prestaram todas as informações e ajuda possível, o que nos leva a refletir o quão necessitados somos de atenção e carinho. Ainda que essas trocas afetivas tenham ocorrido com prazo de validade reduzido, não podemos negar que essa “onda de ternura” nos faz bem, especialmente se temos problemas na família, no trabalho ou se vivemos em ambientes religiosos inóspitos (e quem for fiel ligado à Tradição entenderá muito bem o que estou dizendo). Pessoalmente, apercebi-me olhando para muitos jovens com certo sentimento maternal – mocinhas e rapazes que poderiam bem ser meus filhos ou sobrinhos.
Milhões de fiéis lotam a praia de Copacabana na fria noite do dia 25 de julho para participar da festa de acolhida com o Papa Francisco. A grande maioria assiste ao show pelos inúmeros telões sequencialmente dispostos ao longo da praia.
Socialização e interação com outras culturas
Esse foi um aspecto interessantíssimo que observei durante a JMJ – o interesse geral por saber de onde o outro procedia, o que se fazia em sua cidade ou país, aspectos culturais específicos e etc. Alguns jovens inclusive utilizavam caderninhos para anotar dados dos companheiros de jornada recém conhecidos, possivelmente, para fazer algum contato posterior pela Internet. Como em todas as JMJs, muitas novas amizades serão consolidadas após essa Jornada e até mesmo namoros e casamentos dela resultarão, o que penso ter mais a ver com as estatísticas naturais do que qualquer outra coisa. Afinal, trata-se de milhares de jovens em pleno frescor de beleza e exuberância da juventude.
ASPECTOS ALTAMENTE QUESTIONÁVEIS QUE COLOCAM O SENSUS CATHOLICUS EM ESTADO DE ALERTA
Euforia
Igualmente aos aspectos positivos descritos acima, a JMJ, indubitavelmente, teve seus pontos fracos, e não foram poucos. O primeiro, em minha opinião, foi ter sido transformada em dogma. Ai de quem, se dizendo católico, diga algo contra a JMJ, sua organização, os eventos oferecidos aos jovens, os artistas contratados (ainda que sejam defensores públicos de agendas anticatólicas) ou até mesmo palavras informais do Santo Padre. “Ah! Isso não é coisa de católico! A JMJ está atraindo os jovens e mostrando o rosto vivo da Igreja!” “Curta a vida, curta o Papa!” é o lema, o que pode ser traduzido por “Não encha a nossa paciência falando mal da Jornada!”
O clima de euforia foi sentido já na chamada pré-jornada, em que não se falava de outra coisa nessa arquidiocese a não ser a JMJ. Por um lado, até entendo, pois era necessário mobilizar, angariar recursos, conquistar a mídia e as pessoas para o voluntariado e hospedagem, e isso se faz através de uma intensa máquina de marketing e propaganda. Por outro, causou-me estranheza que esse enfoque exclusivista tenha deixado de lado o combate a temas urgentes, como a defesa da vida dos nascituros e o matrimônio entre um homem e uma mulher, que foram para debaixo do tapete justamente no momento em que projetos de lei altamente nocivos à vida e à família avançavam e eram votados sob o silêncio sepulcral dos bispos do Brasil. Pouquíssimos foram os prelados que se manifestaram de forma ativa e clara sobre esses tópicos. Nem mesmo o Santo Padre foi incisivo a esse respeito. Na iminência da sanção ou repúdio presidencial ao projeto abortista PLC 03/2013, o máximo que ouvimos dele foi um apelo de proteção “à vida, que é dom de Deus, um valor que deve ser sempre tutelado e promovido”, o que pode ser entendido de maneira ampla, especialmente, quando anteriormente ele fizera referência ao cuidado com os idosos e pobres. Será que um engajamento maior por parte da hierarquia com respeito a esses temas atrairia a antipatia da mídia e dos jovens e atrapalharia os interesses da JMJ? – indago-me.
Tradicional peregrinação para a Vigília de Oração com o Papa Francisco, no dia 27 de julho, na praia de Copacabana. Milhões de fiéis de diversas nacionalidades fazem o percurso de 9km da Central do Brasil até Copacabana. No meio do caminho teriam que parar no Aterro do Flamengo e enfrentar longas filas para pegar seus kits refeição (caixas com alimentos industrializados, que serviriam de almoço e jantar). Segundo uma voluntária, esse é o menor percurso de uma JMJ, cuja distância costuma ser de 13km.
Histeria coletiva
Creio que na História da Igreja nunca tivemos um caso de tamanha comoção popular. Papa Francisco, cuja presença é realmente impactante, deixou a muitos não somente eufóricos, mas até histéricos. Posso estar equivocada, mas não consigo lembrar de outro papa que tenha sido ovacionado com tanta unanimidade, especialmente, pela mídia secular, espíritas, evangélicos e pessoas de outras denominações religiosas. Na chegada ou saída dos eventos de que participava, uma multidão incomensurável de católicos e não católicos invadia as ruas e avenidas para saudar-lhe com gritos, palmas e fotos. Os comentários, inusitados para um Sumo Pontífice, eram os mesmos: “o papa é fofo”, “o papa é pop”, “o papa sabe evangelizar, não importa a religião”. Em pouco tempo uma foto do fotógrafo Luca Zennaro da Agência EFE, em que o Papa Francisco aparece à frente de um microfone com uma lua estrategicamente posicionada atrás de sua cabeça como uma auréola tornou-se viral na Internet.
O Papa João Paulo II certamente atraiu o carinho de milhões de fiéis por seu carisma e simpatia, mas era igualmente bastante criticado por sua defesa intransigente da vida dos nascituros e do matrimônio cristão, atraindo, assim, a ira de setores esquerdistas e liberais. O que houve então para essa ausência inesperada de críticas por parte dos tradicionais inimigos da Igreja? Até mesmo o Fantástico, famoso programa da Rede Globo, que sempre se destacou por alardear escândalos na Igreja, apresentou uma entrevista com o Santo Padre a um jornalista “bonzinho” e comportado, que lhe fez perguntas customizadas, evitando as famosas indagações sobre a posição da Igreja em relação ao aborto e ao casamento gay. Que pasa? Em minha humilde opinião, penso que esse fenômeno tem a ver com o caráter humanista e não confrontador de suas declarações. Aspectos como a ternura, a busca de valores éticos, o socorro aos pobres, o fim da corrupção, inclusão, estilo de vida simples e pobreza dos sacerdotes, especialmente após o famoso escândalo do Banco do Vaticano, são sempre bem-vindos para pessoas de todas as religiões e, em geral, não molestam a mídia.
Papamóvel aberto, marca registrada do Papa Francisco, é deixado às portas do Teatro Municipal após encontro com intelectuais na manhã do dia 27. Dali o Papa seguiria para o Sumaré em carro de passeio, a fim de almoçar e descansar até a vigília de oração. A ostensiva força policial foi incapaz de conter um minúsculo grupo de criaturas ensandecidas autodenominadas “Vadias”, que perpetraram atos de blasfêmia, ultraje e vilipêndio a símbolos religiosos, e atentado violento ao pudor na praia de Copacabana sob o olhar perplexo e passivo dos fiéis.
Omissão sintomática da crise na Igreja
Para mim, ficou claríssimo que doravante será cada vez mais difícil falarmos em crise na Igreja. Se com Bento XVI a tendência era um foco nos problemas ad intra, com Francisco, salvo questões menores de ordem burocrática (reforma da cúria, IOR, etc), a ênfase está na missão, isto é, uma abordagem ad extra do papel da Igreja. Certamente, alguém que ouse tocar nesse tabu será aconselhado a procurar um psicólogo para tratar de sua “síndrome de profeta da desgraça”.
A todo momento ouvimos até mesmo de católicos que se dizem alinhados com a Tradição que os números falam por si e que dois a três milhões de pessoas encheram as areias de Copacabana. \o/
Alguns ainda alardeiam que a JMJ foi o maior evento da Igreja Católica nos últimos anos. Se, por acaso, questionamos o conteúdo religioso da JMJ, logo nos respondem que os jovens tiveram catequese intensa por três dias, que participaram de orações nos atos centrais, nas santas missas e etc. etc.
Ainda que essa cifra inclua pessoas sem religião, pessoas de outras religiões ou católicos não praticantes que apenas simpatizam com a pessoa do Papa Francisco, isso não importa. O que importa é que três milhões foram aos atos centrais ver o Papa!
Não descarto a utilidade dessa participação fenomenal como ferramenta de promoção do catolicismo aos olhos pagãos, mas é importante avaliar se após a JMJ esses mesmos três milhões de fiéis serão fortes o bastante para forjar mudanças em seus países e combater o laicismo avassalador. A Igreja provou que tem poder de fogo. Só Ela é capaz de organizar tamanho evento e envolver um tão grande número de pessoas.
Quererá Ela arregimentá-las para eventos light e inconsequentes ou para efetivamente formar um exército de combatentes e promover uma re-catolização do Brasil Só o tempo dirá.
Ainda que saibamos da ideologia reinante na maior parte de nossas dioceses, suas práticas litúrgicas e doutrinais, bem como da sistemática omissão de temas cruciais da doutrina e da moral cristã, isso não importa. O que importa é que os peregrinos tiveram catequese durante três dias! A Igreja é viva! Os jovens estão sendo atraídos pela Igreja! “Não sejam exagerados, vejam os frutos”, nos responderão com suas trombas devidamente armadas.
Então, o que dizer da JMJ 2013: evento jovem ou evento católico?
Em vista de tudo o que temos presenciado na Igreja nos últimos anos e, mais especificamente durante a Jornada, creio que, embora Deus seja verdadeiramente onipotente e derrame suas graças onde Ele bem quiser, não deixando sem resposta orações sinceras e corações contritos e humilhados, e considerando ainda os benefícios auferidos em nível particular durante a Jornada, como, por exemplo, confissões, missas (até mesmo no rito tradicional, como destacamos aqui e aqui), testemunhos de vida edificantes e etc, a JMJ representa, em uma análise ampla e geral, como um todo, um afastamento flagrante da Tradição da Igreja, no que tange à doutrina da Fé e Moral ali explicitadas, não tanto pelo que foi dito, mas pelo que foi omitido. Não é necessário se delongar sobre práticas litúrgicas bizarras, com abusos litúrgicos graves, inclusive nas cerimônias principais, bem como em comportamentos inadequados por parte de fiéis desorientados – ovelhas literalmente sem pastor.
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Ensinamentos sobre os Novíssimos (aliás, magistralmente tratados pelos jesuítas clássicos, em seus famosos Exercícios Espirituais de Santo Inácio), a importância da castidade, o terrível flagelo do aborto, o pecado das uniões civis de pessoas do mesmo sexo ou até mesmo o ‘casamento gay’ precisam necessariamente de ser ministrados pela hierarquia. Em entrevista a diversos jornalistas no voo que o levou de volta a Roma, ao ser indagado porque ele não falou do aborto e da posição do Vaticano em relação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, o Santo Padre respondeu simplesmente o seguinte: “A igreja já se expressou perfeitamente sobre isso. Eu não queria voltar sobre isso. Não era necessário voltar sobre isso, como também não era necessário falar sobre outros assuntos. Eu também não falei sobre o roubo, sobre a mentira. Para isso, a igreja tem uma doutrina clara. Queria falar de coisas positivas, que abrem caminho aos jovens. Além disso, os jovens sabem perfeitamente qual a posição da igreja.”
Como assim, Santo Padre?
Poderíamos, com esse argumento, eliminar todas as homilias, bem como todas as catequeses da própria JMJ, pois sobre todos os assuntos abordados a Igreja já se pronunciou de maneira clara. Com todo respeito, amor e submissão ao Sumo Pontífice, ousaríamos ainda questionar: se o propósito era “falar de coisas positivas, que abrem caminho aos jovens”, porque a condenação incisiva – e justíssima — ao tráfico e a descriminalização de drogas? Por que a exclusividade a esse crime? Abordá-lo não é, absolutamente, falar de coisas positivas, ainda mais no Rio, que tanto sofre com isso. Seria talvez porque há certa unanimidade sobre o assunto, que não é tão polêmico e não se choca com interesses estatais como, por exemplo, o aborto?…
Podemos até admitir que a esmagadora maioria dos peregrinos da JMJ sabe ou já ouviu falar que a Igreja é contra o aborto, contra a prática da sodomia, as uniões civis de pessoas do mesmo sexo e etc., mas será que eles realmente sabem que esses atos ofendem a Deus e põem suas almas em risco? Por que de uma hora para outra, a palavra “pecado” tem de ser banida do diálogo com os jovens? Será que eles sabem que além de serem contrários a essas coisas em nível pessoal, são chamados a combatê-las na esfera pública?
Será que não estamos abandonando o conceito de Igreja Militante para aderirmos ao de Igreja Sorridente?
Noite do dia 27: Bispos em momento de descontração atendem ao apelo de um jovem instrutor para que também participem do maior flash mob já realizado no planeta. Na manhã seguinte, minutos antes da Missa de Envio, a dança seria repetida não só pelos leigos, mas também por vários sacerdotes devidamente paramentados. Como diz o ditado: “Quem está na chuva é pra se molhar.”
Em seu discurso ao Conselho Episcopal Latino-Americano, no Rio de Janeiro, o Santo Padre reclama da “clericalização dos leigos” e que essa é uma posição cômoda para muitos padres. Nesse ponto ele está certíssimo. Por outro lado, o que os leigos deveriam fazer em situações de tão grande necessidade com a atual, em que as mais altas esferas hierárquicas se esquivam dos temas polêmicos? Para quem sobra o “trabalho sujo”? Não fora o incansável esforço de leigos pró-vidas, que se esforçaram para que os peregrinos tivessem kits pró-vida em suas mochilas (um feto em PVC representando um bebê de 12 semanas e um folder explicativo em três idiomas), os jovens sairiam da jornada do mesmo jeito que entraram com respeito ao maior flagelo da humanidade atualmente.
A parte as questões morais, transbordou na JMJ o famigerado “Espírito do Concílio” impregnado pelo falso ecumenismo denunciado na Encíclica Mortalium Animus. Muitos foram os indícios nesse sentido, que culminaram com a resposta do Santo Padre ao repórter Gerson Camarotti na supracitada entrevista exclusiva ao Fantástico. Nessa entrevista, ele ressalta a importância dos valores éticos e da defesa da realidade humana. Acabar com a fome e dar educação aos pobres – sem dúvida, obras de misericórdia muito meritórias – são valores que devem sobrepujar as diferenças religiosas. Novamente, ficamos sem uma clareza sobre a necessidade de aderir à Fé Católica para a salvação de nossas almas e quais os limites para a cooperação entre católicos e pessoas de outras religiões sem que se passe a impressão de indiferentismo.
Rio de Janeiro: Missa na Praia de Copacabana. Imagem de Vinícius Farias.
Em suma, o Santo Padre nos ensinou valores importantíssimos. Devemos acolher respeitosamente tudo o que ele nos pede de bom e verdadeiro. Todavia, não podemos ignorar que algumas omissões ao longo da JMJ poderão ter consequências gravíssimas para a vida dos católicos e para os esforços de evangelização. Ele nos pede oração. E, se essa já é nossa obrigação filial, agora mais do que nunca devemos rezar pelo Vigário de Cristo na Terra.
Rezemos pela Igreja, pelo Santo Padre e por cada um de nós, para que o Bom Deus nos ajude na busca de santidade. E que Ele nos dê a sabedoria para vivermos e transmitirmos a fé católica com clareza e na sua integridade, sem medo de ir contra a corrente, nesses tempos de turbulência.
Francisco surpreendeu ao falar sobre os gays e condenar o preconceito, mas a mensagem mais forte foi deixar polêmicas de lado.
O Globo – Para os católicos conservadores, que distribuíram réplicas de fetos em garrafinhas na vigília de Copacabana, foi um “silêncio comprometedor”. Já os progressistas, que marcharam na orla por uma Igreja mais tolerante, preferiram chamar de “silêncio libertador”. Ao tangenciar assuntos polêmicos, como o aborto, a eutanásia e a união civil entre pessoas do mesmo sexo durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), o Papa Francisco faz história sem abrir a boca. Mostrou aos católicos que, ao não condenar e repetir a velha retórica do Vaticano, abre caminho para o debate interno de temas até então considerados tabus.
Para os que ainda duvidavam do significado do silêncio do Papa, o retorno a Roma acentuou a guinada. Confrontado pelos jornalistas com as denúncias de lobby gay no Vaticano, respondeu com humildade: “Se uma pessoa é gay, procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-la?”. Sobre o aborto, sua resposta estava nas entrelinhas: “A Igreja já se expressou perfeitamente sobre isso. Eu não queria voltar. Não era necessário voltar a isso, como também não era necessário falar sobre outros assuntos”.
— Ele não está querendo reiterar posições. Não se afasta da doutrina tradicional, mas evita insistir nela. Ao fazer isso, permite uma reflexão mais ampla. Há um clima novo para o debate. Não há mais medo da autocensura. O silêncio do Papa é libertador — festeja o sociólogo Luiz Alberto Gomes de Souza, diretor do Programa de Ciência e Religião da Universidade Candido Mendes.
Conservadores inquietos
Ao advertir que a Igreja já disse o que tinha de falar, sem explicar exatamente o que, Francisco inquieta os setores conservadores, cujas lutas encontravam eco nas pregações de João Paulo II e Bento XVI. Ontem mesmo, o site Frates in Unum, um dos mais expressivos dessa corrente no Brasil, lamentava que, “às vésperas da legalização da prática do aborto no Brasil”, a JMJ tenha feito “poucas referências a este crime abominável, que brada ao Céu e clama a Deus por vingança”.
Os conservadores, que se juntam aos evangélicos na resistência cristã aos projetos que avançam na legalização do aborto, não escondem a frustração por não terem ouvido de Francisco uma condenação enfática: “Da boca do Santo Padre, o pedido de proteção à ‘vida, que é dom de Deus, um valor que deve ser sempre tutelado e promovido’. E até agora foi só. Nenhuma outra palavra mais contundente que poderia mudar o triste cenário em nosso país”. E arrematam: “A esperança de um pronunciamento de última hora foi vã”.
— O Papa disse que vivemos num mundo laico, secular. Há liberdade para várias posições. Agora, outra coisa é querer impor uma posição para toda a sociedade — rebate Luiz Alberto.
O movimento gay, sempre reticente com a Igreja, viu nas palavras do Papa um adversário a menos a ser enfrentado no cenário político:
— Ele não chegou a defender a união civil. Mas, só em não nos atacar, já é positivo. O Papa separa os católicos das correntes de Marcos Feliciano e Silas Malafaia, que ficam agora isoladas — reflete o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno Silva Fonseca.
Por Manoel Gonzaga Castro – Fratres in Unum.com | Acabou da Jornada Mundial de Juventude. O Papa já está de volta ao Vaticano. Tudo transcorreu na mais perfeita harmonia: COL (Comitê Organizador Local), Prefeitura e Governo do Estado do Rio e Governo Federal. O evento foi considerado um sucesso, apesar de problemas de infraestrutura e do “lapso” Guaratiba, que gerou a mudança de última hora dos últimos eventos da JMJ para Copacabana.
Os meios de comunicação fizeram uma enorme e benevolente cobertura. Já não se ouve mais os ataques de outrora à Igreja. Tudo é humildade e simpatia. Até as novelas foram retiradas do ar para dar espaço aos belos gestos do Papa Francisco.
No entanto, é cristalina a oposição entre os valores pregados pela Igreja e a agenda do governo petista (do qual são aliados os governos municipal e estadual do Rio). Diga-se o mesmo dos meios de comunicação, em especial, da Rede Globo de Televisão.
E é óbvio: tal harmonia não seria gratuita. Ela tem o seu preço.
Silêncio comprometedor
Durante sua visita ao Rio de Janeiro, o Papa Francisco repetiu por várias vezes aos jovens o apelo: “ide contra a corrente”, sem medo.
Porém, os assuntos polêmicos – que separam os sujeitos citados acima – foram tratados como tabu. Já observava o respeitado vaticanista Sandro Magister: “O êxito midiático do qual goza [Francisco] tem um motivo e um custo: seu silêncio sobre as questões políticas cruciais do aborto, eutanásia e casamento homossexual”.
A esperança de um pronunciamento de última hora foi vã.
Contudo, a postura contemporizadora de Francisco já era conhecida na Argentina. Quando da polêmica envolvendo a legislação sobre o casamento gay em nosso país vizinho, o então Cardeal Bergoglio liderava a ala “não polemizadora” da Conferência Episcopal. À época, fora vencido por Dom Hector Aguer, arcebispo de La Plata e seu desafeto, que estava à frente da corrente que pretendia defender abertamente os direitos de Deus e o bem dos homens.
Trata-se, em última análise, de uma extensão da atitude proposta por João XXIII no discurso de abertura do Concílio Vaticano II: “A Igreja sempre se opôs a estes erros; muitas vezes até os condenou com a maior severidade. Agora, porém, a esposa de Cristo prefere usar mais o remédio da misericórdia do que o da severidade. Julga satisfazer melhor às necessidades de hoje mostrando a validez da sua doutrina do que renovando condenações”.
Bem… os resultados desse modus operandi falam por si. Não à toa, a mente dos católicos tem mudado consideravelmente nas últimas décadas. A adesão aos valores cristãos e sua defesa há tempos já não é a mesma. A passividade dos fiéis e das autoridades, eclesiásticas e civis, chega ao ponto de meia-dúzia de revoltados quebrarem imagens de santos confortavelmente, diante de uma multidão (e da polícia) que assiste tudo passivamente. Desgraçadamente, mostra-se longínqua para nós a hipótese de vermos a Arquidiocese do Rio ou a CNBB solicitando ao Ministério Público que tome as devidas providências para punir os delinquentes.
Todavia, os parceiros de organização da viagem pontifícia e do espetáculo da Jornada não dormem nem se silenciam: enquanto o governo federal caminha a passos largos para implantar na prática o aborto no Brasil, em particular com o famigerado e nefasto PLC 3/2013, a Rede Globo fala abertamente sobre o aborto em uma de suas novelas atualmente no ar.
Os parceiros da JMJ jogam sujo: de um lado, bombardeiam ideologicamente os fiéis com sua dramaturgia e artistas, os “santos” modernos e descolados, modelos a serem imitados pela juventude, transformando os valores do povo brasileiro. De outro, o governo implementa gradativamente sua agenda política pró-aborto, pró-gayzismo, anti-família e amoral, com seus nefastos projetos de lei e manobras políticas. E o contra-ataque nesta guerra, a resposta católica? Um ensurdecedor silêncio, muita simpatia e dancinhas…
Não por acaso há muita gente rindo, satisfeitíssima.
Rede Globo parceira. Uma raríssima entrevista exclusiva.
Mas um episódio exporia ainda mais nitidamente o que falamos sobre o relacionamento dos homens da Igreja e seus parceiros de Jornada Mundial da Juventude.
Que Camarotti se beneficia das indiscrições dos cardeais brasileiros (a cobertura do conclave que o diga) e goza de trânsito livre nos corredores de suas cúrias não é nenhuma novidade.
Mas conseguir uma entrevista exclusiva com um Papa, enquanto veículos do mundo inteiro chupam dedo, é algo curiosíssimo. Seria o preço cobrado por uma cobertura amplamente positiva da viagem papal? Ou dos artistas, coreógrafos e diretores cedidos pela Globo para as cerimônias da Jornada (algumas das quais, notaram vários leitores do Fratres, com a cara do Criança Esperança)?
Queremos crer que nossos homens da Igreja não se sujeitam a esse tipo de maquinação.
PS.: Enquanto concluíamos a redação deste artigo, foi divulgada a entrevista que o Papa concedeu aos demais jornalistas, provavelmente constrangido pela exclusiva dada à Globo, em seu avião. Não há o que comentar. A íntegra publicamos a seguir:
Pergunta – Nestes quatro meses, o senhor criou várias comissões. Que tipo de reforma tem em mente? O sr. quer suprimir o banco do Vaticano? Papa Francisco – Os passos que eu fui dando nestes quatro meses e meio vão em duas vertentes. O conteúdo do que quero fazer vem da congregação dos cardeais. Eu me lembro que os cardeais pediam muitas coisas para o novo papa, antes do conclave. Eu me lembro de que tinha muita coisa. Por exemplo, a comissão de oito cardeais, a importância de ter uma consulta externa, e não uma consulta apenas interna.
Isso vai na linha do amadurecimento da sinodalidade e do primado. Os vários episcopados do mundo vão se expressando em muitas propostas que foram feitas, como a reforma da secretaria dos sínodos, que a comissão sinodal tenha característica de consultas, como o consistório cardinalício com temáticas específicas, como a canonização.
A vertente dos conteúdos vem daí. A segunda é a oportunidade. A formação da primeira comissão não me custou pouco mais de um mês. Pensava em tratar a parte econômica no ano que vem, porque não é a mais importante. Mas a agenda mudou devido a circunstâncias que vocês conhecem.
O primeiro é o problema do IOR [banco do Vaticano], como encaminhá-lo, como reformá-lo, como sanear o que há de ser sanado. E essa foi então a primeira comissão.
Depois, tivemos a comissão dos 15 cardeais que se ocupam dos assuntos econômicos da Santa Sé. E por isso decidimos fazer uma comissão para toda a economia da Santa Sé, uma única comissão de referência. Notou-se que o problema econômico estava fora da agenda. Mas essas coisas atendem.
Quando estamos no governo, vamos por um lado, mas, se chutam e fazem um golaço por outro lado, temos de atacar. A vida é assim. Eu não sei como o IOR vai ficar. Alguns acham melhor que seja um banco, outros que seja um fundo, uma instituição de ajuda. Eu não sei. Eu confio no trabalho das pessoas que estão trabalhando sobre isso.
O presidente do IOR permanence, o tesoureiro também, enquanto o diretor e o vice-diretor pediram demissão. Não sei como vai terminar essa história. E isso é bom. Não somos máquinas. Temos de achar o melhor. A característica de, seja o que for, tem de ter transparência e honestidade.
Uma fotografia do sr. deu a volta ao mundo, quando o sr. desceu as escadas do helicóptero, carregando sua mala preta. Artigos de todo o mundo comentaram o papa que sai com sua própria mala. Foram levantadas hipóteses também sobre o conteúdo da mala. Por que o sr. saiu carregando a maleta preta, e não seus colaboradores? E o sr. poderia dizer o que tinha dentro?
Não tinha a chave da bomba atômica. Eu sempre fiz isso, Quando viajo, levo minhas coisas. E dentro o que tem? Um barbeador, um breviário (livro de liturgia), uma agenda, tinha um livro para ler, sobre Santa Terezinha. Sou devoto de Santa Terezinha. Eu sempre levei a minha maleta. É normal. Temos de ser normais. É um pouco estranho isso que você me diz que a foto deu a volta ao mundo. Mas temos de nos habituar a sermos normais, à normalidade da vida.
Por que o senhor pede tanto para que rezem pelo senhor? Não é habitual ouvir de um papa que peça que rezem por ele.
Sempre pedi isso. Quando era padre, pedia, mas nem tanto nem tão frequentemente. Comecei a pedir mais frequentemente quando passei a bispo. Porque eu sinto que, se o Senhor não ajuda nesse trabalho de ajudar aos outros, não se pode. Preciso da ajuda do Senhor. Eu de verdade me sinto com tantos limites, tantos problemas, e também pecador. Peço a Nossa Senhora que reze por mim. É um hábito, mas que vem da necessidade. Sinto que devo pedir. Não sei
Na busca por fazer essas mudanças, o sr. disse que existem muitos santos que trabalham no Vaticano e outros um pouco menos santos. O sr. enfrenta resistências a essa sua vontade de mudar as coisas no Vaticano? O sr. vive num ambiente muito austero, de Santa Marta. Os seus colaboradores também vivem essa austeridade? Isso é algo apenas do sr. ou da comunidade?
As mudanças vêm de duas vertentes: do que pediram os cardeais e também o que vem da minha personalidade. Você falou que eu fico na Santa Marta. Eu não poderia viver sozinho no palácio, que não é luxuoso. O apartamento pontifício é grande, mas não é luxuoso. Mas eu não posso viver sozinho. Preciso de gente, falar com gente. Trabalhar com as pessoas. Porque, quando os meninos da escola jesuíta me perguntaram se eu estava aqui pela austeridade e pobreza, eu respondi: “Não, por motivos psiquiátricos.”
Psicologicamente, não posso. Cada um deve levar adiante sua vida, seguir seu modo de vida. Os cardeais que trabalham na Cúria não vivem como ricos. Têm apartamentos pequenos. São austeros. Os que eu conheço têm apartamentos pequenos.
Cada um tem de viver como o Senhor disse que tem de viver. A austeridade é necessária para todos. Trabalhamos a serviço da igreja. É verdade que há santos, sacerdotes, padres, gente que prega, que trabalha tanto, que vai aos pobres, se preocupa de fazer comer os pobres. Têm santos na Cúria. Também têm alguns que não têm muitos santos. E são estes que fazem mais barulho. Uma árvore que cai faz mais barulho do que uma floresta que nasce. Isso me dói. Porque são alguns que causam escândalos. São escândalos que fazem mal. Uma coisa que nunca disse: a Cúria deveria ter o nível que tinha dos velhos padres, pessoas que trabalham. Os velhos membros da Cúria. Precisamos deles. Precisamos o perfil do velho da Cúria.
Sobre resistência, se tem, ainda não vi. É verdade que aconteceram muitas coisas. Mas eu preciso dizer: eu encontrei ajuda, encontrei pessoas leais. Por exemplo, eu gosto quando alguém me diz :”Eu não estou de acordo”. Esse é um verdadeiro colaborador. Mas, quando vejo aqueles que dizem “ah, que belo, que belo” e depois dizem o contrario por trás, isso não ajuda.
O mundo mudou, os jovens mudaram. Temos no Brasil muitos jovens, mas o senhor não falou de aborto, sobre a posição do Vaticano em relação ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil foram aprovadas leis que ampliam os direitos para estes casamentos em relação ao aborto. Por que o senhor não falou sobre isso?
A igreja já se expressou perfeitamente sobre isso. Eu não queria voltar sobre isso. Não era necessário voltar sobre isso, como também não era necessário falar sobre outros assuntos. Eu também não falei sobre o roubo, sobre a mentira. Para isso, a igreja tem uma doutrina clara. Queria falar de coisas positivas, que abrem caminho aos jovens. Além disso, os jovens sabem perfeitamente qual a posição da igreja.
E a do papa?
É a da Igreja, eu sou filho da Igreja.
Qual o sentido mais profundo de se apresentar como o bispo de Roma?
Não se deve andar mais adiante do que o que se fala. O papa é bispo de Roma e por isso é papa, o sucessor de Pedro. Não é o caso pensar que isso quer dizer que é o primeiro. Não é esse o sentido. O primeiro sentido do papa é ser o bispo de Roma.
O sr. teve sua primeira experiência multidinária no Rio. Como se sente como papa, é um trabalho duro?
Ser bispo é belo. O problema é quando alguém busca ter esse trabalho, assim não é tão belo. Mas, quando o Senhor chama para ser biso, isso é belo. Tem sempre o perigo e o pecado de pensar com superioridade, como se fosse um príncipe. Mas o trabalho é belo. Ajudar o irmão a ir adiante. Têm o filtro da estrada.
O bispo tem de indicar o caminho. Eu gosto de ser bispo. Em Buenos Aires, eu era tão feliz. Como padre, era feliz. Como bispo, era feliz e isso me faz bem.
E ser papa?
Se você faz o que o Senhor quer, é feliz. Esse é meu sentimento.
Igreja no Brasil está perdendo fieis. A Renovação Carismática é uma possibilidade para evitar que eles sigam para as igrejas pentecostais?
É verdade, as estatísticas mostram. Falamos sobre isso ontem com os bispos brasileiros. E isso é um problema que incomoda os bispos brasileiros.
Eu vou dizer uma coisa: nos anos 1970, início dos 1980, eu não podia nem vê-los. Uma vez, falando sobre eles, disse a seguinte frase: eles confundem uma celebração musical com uma escola de samba.
Eu me arrependi. Vi que os movimentos bem assessorados trilharam um bom caminho. Agora, vejo que esse movimento faz muito bem à igreja em geral. Em Buenos Aires, eu fazia uma missa com eles uma vez por ano, na catedral. Vi o bem que eles faziam.
Neste momento da igreja, creio que os movimentos são necessários. Esses movimentos são um graça para a igreja. A Renovação Carismática não serve apenas para evitar que alguns sigam os pentecostais. Eles são importantes para a própria igreja, a igreja que se renova.
A igreja sem a mulher perde a fecundidade? Quais as medidas concretas? O senhor disse que está cansado. Há algum tratamento especial neste voo?
Vamos começar pelo fim. Não há nenhum tratamento especial neste voo. Na frente, tem uma bela poltrona. Escrevi para dizer que não queria tratamento especial.
Segundo, as mulheres. Uma igreja sem as mulheres é como o colégio apostólico sem Maria. O papal da mulher na igreja não é só maternidade, a mãe da família. É muito mais forte. A mulher ajuda a igreja a crescer. E pensar que a Nossa Senhora é mais importante do que os apóstolos! A igreja é feminina, esposa, mãe.
O papel da mulher na igreja não deve ser só o de mãe e com um trabalho limitado. Não, tem outra coisa. O papa Paulo 6° escreveu uma coisa belíssima sobre as mulheres. Creio que se deva ir adiante esse papel. Não se pode entender uma igreja sem uma mulher ativa.
Um exemplo histórico: para mim, as mulheres paraguaias são as mais gloriosas da América Latina. Sobraram, depois da guerra (1864-1870), oito mulheres para cada homem. E essas mulheres fizeram uma escolha um pouco difícil. A escolha de ter filhos para salvar a pátria, a cultura, a fé, a língua.
Na igreja, se deve pensar nas mulheres sob essa perspectiva. Escolhas de risco, mas como mulher. Acredito que, até agora, não fizemos uma profunda teologia sobre a mulher. Somente um pouco aqui, um pouco lá. Tem a que faz a leitura, a presidente da Cáritas, mas há mais o que fazer. É necessário fazer uma profunda teologia da mulher. Isso é o que eu penso.
Queremos saber qual a sua relação de trabalho com Bento 16, não a amistosa, a de colaboração. Não houve antes uma circunstância assim. Os contatos são frequentes?
A última vez que houve dois ou três papa, eles não se falavam. Estavam brigando entre si, para ver quem era o verdadeiro. Eu fiquei muito feliz quando se tornou papa. Também, quando renunciou, foi, pra mim, um exemplo muito grande. É um homem de Deus, de reza. Hoje, ele mora no Vaticano.
Alguns me perguntam: como dois papas podem viver no Vaticano? Eu achei uma frase para explicar isso. É como ter um avô em casa. Um avô sábio. Na família, um avô é amado, admirado. Ele é um homem com prudência. Eu o convidei para vir comigo em algumas ocasiões. Ele prefere ficar reservado. Se eu tenho alguma dificuldade, não entendo alguma coisa, posso ir até ele.
Sobre o problema grave do Vatileaks [vazamento de documentos secretos], ele me disse tudo com simplicidade. Tem uma coisa que não sei se vocês sabem: Em 8 de fevereiro, no discurso, ele falou: “Entre vocês está o próximo papa. Eu prometo obediência”. Isso é grande.
O sr. falou com os bispos brasileiros sobre a participação das mulheres na igreja. Gostaria de entender melhor como deve ser essa participação. O que sr. pensa sobre a ordenação das mulheres?
Sobre a participação das mulheres na igreja, não se pode limitar a alguns cargos: a catequista, a presidente da Cáritas. Deve ser mais, muito mais. Sobre a ordenação, a igreja já falou e disse que não. João Paulo 2° disse com uma formulação definitiva. Essa porta está fechada. Nossa senhora, Maria, é mais importante que os apóstolos. A mulher na igreja é mais importante que os bispos e os padres. Acredito que falte uma especificação teológica.
Nesta viagem, o sr. falou de misericórdia Sobre o acesso aos sacreamentos dos divorciados, existe a possibilidade de mudar alguma coisa na disciplina da igreja?
Essa é uma pergunta que sempre se faz. A misericórdia é maior do que o exemplo que você deu. Essa mudança de época e també tantos problemas na igreja, como alguns testemunhos de alguns padres, problemas de corrupção, do clericalismo A igreja é mãe. Ela cura os feridos. Ela não se cansa de perdoar.
Os divorciados podem fazer a comunhão. Não podem quando estão na segunda união. Esse problema deve ser estudado pela pastoral matrimonial. Há 15 dias, esteve comigo o secretário do sínodo dos bispos, para discutir o tema do próximo sínodo. E posso dizer que estamos a caminho de uma pastoral matrimonial mais profunda. O cardeal Guarantino disse ao meu antecessor que a metade dos matrimônios é nula. Porque as pessoas se casam sem maturidade ou porque socialmente devem se casar. Isso também entra na Pastoral do Matrimônio.
A questão da anulação do casamento deve ser revisada. É complexa a questão pastoral do matrimônio.
Em quatro meses de Pontificado, pode nos fazer um pequeno balanço e dizer o que foi o pior e o melhor de ser Papa? O que mais lhe surpreendeu neste período?
Não sei como responder isso, de verdade. Coisas ruins, ruins, não aconteceram. Coisas belas, sim. Por exemplo, o encontro com os bispos italianos, que foi tão bonito. Como bispo da capital da Itália, me senti em casa com eles. Uma coisa dolorosa foi a visita a Lampeduse [ilha que recebe imigrantes africanos], me fez chorar. Me fez bem. Quando chegam estes barcos, que os deixam a algumas milhas de distância da costa e eles têm de chegar (à costa) sozinhos, isso me dói porque penso que essas pessoas são vítimas do sistema sócio-econômico mundial.
Mas a coisa pior é o nervo ciático, é verdade, tive isso no primeiro mês. É verdade! Para uma entrevista, tive de me acomodar numa poltrona e isso me fez mal, era dolorosíssimo, não desejo isso a ninguém. O encontro com os seminaristas religiosos foi belíssimo. Também o encontro com os alunos do colégio jesuíta foi belíssimo. As pessoasconheci tantas pessoas boas no Vaticano. Isso é verdade, eu faço justiça. Tantas pessoas boas, mas boas, boas, boas.
Tem a esperança de que esta viagem ao Brasil contribua para trazer de volta os fiéis? Os argentinos se perguntam: não sente falta de estar em Buenos Aires, pegar um ônibus?
Uma viagem do papa sempre faz bem. E creio que a viagem ao Brasil fará bem, não apenas a presença do Papa. Eles (os brasileiros) se mobilizaram e vão ajudar muito a igreja. Tantos fiéis que foram se sentem felizes. Acho que será positivo não só pela viagem, mas pela jornada, um evento maravilhoso. Buenos Aires, sim, sinto falta. Mas é uma saudade serena.
O que o senhor pretende fazer em relação ao monsenhor Ricca e como pretende enfrentar toda esta questão do lobby gay?
Sobre monsenhor Ricca, fiz o que o direito canônico manda fazer, a investigação prévia. E nessa investigação não tem nada do que o acusam. Não achamos nada. É a minha resposta.
Quero acrescentar uma coisa a mais sobre isso. Tenho visto que muitas vezes na igreja se buscam os pecados da juventude, por exemplo. E se publica.
Abuso de menores é diferente. Mas, se uma pessoa, seja laica ou padre ou freira, pecou e esconde, o Senhor perdoa. Quando o Senhor perdoa, o Senhor esquece.
E isso é importante para a nossa vida. Quando vamos confessar e nós dizemos que pecamos, o senhor esquece e nós não temos o direito de não esquecer. Isso é um perigo.
O que é importante é uma teologia do pecado. Tantas vezes penso em São Pedro, que cometeu tantos pecados e venerava Cristo. E esse pecador foi transformado em Papa.
Vocês vêm muita coisa escrita sobre o lobby gay. Eu ainda não vi ninguém no Vaticano com um cartão de identidade dizendo que é gay. Dizem que há alguns. Acho que, quando alguém se vê com uma pessoa assim, devemos distinguir entre o fato de que uma pessoa é gay e formar um lobby gay, porque nem todos os lobbys são bons. Isso é o que é ruim.
Se uma pessoa é gay e procura Deus e tem boa vontade, quem sou eu, por caridade, para julgá-lo? O catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser discriminados por causa disso, mas integrados na sociedade. O problema não é ter essa tendência. Não! Devemos ser como irmãos. O problema é o lobby dessa tendência, da tendência de pessoas gananciosas: lobby político, de maçons, tantos lobbies. Esse é o pior problema.
A opção pela missionariedade do discípulo sofrerá tentações. É importante saber por onde entra o espírito mau, para nos ajudar no discernimento. Não se trata de sair à caça de demônios, mas simplesmente de lucidez e prudência evangélicas. Limito-me a mencionar algumas atitudes que configuram uma Igreja “tentada”. Trata-se de conhecer determinadas propostas atuais que podem mimetizar-se em a dinâmica do discipulado missionário e deter, até fazê-lo fracassar, o processo de Conversão Pastoral.
1) A ideologização da mensagem evangélica. É uma tentação que se verificou na Igreja desde o início: procurar uma hermenêutica de interpretação evangélica fora da própria mensagem do Evangelho e fora da Igreja.
Um exemplo: a dado momento, Aparecida sofreu essa tentação sob a forma de assepsia. Foi usado, e está bem, o método de “ver, julgar, agir”. A tentação se encontraria em optar por um “ver” totalmente asséptico, um “ver” neutro, o que não é viável. O ver está sempre condicionado pelo olhar. Não há uma hermenêutica asséptica. Então a pergunta era: Com que olhar vamos ver a realidade? Aparecida respondeu: Com o olhar de discípulo. Assim se entendem os números 20 a 32. Existem outras maneiras de ideologização da mensagem e, atualmente, aparecem na América Latina e no Caribe propostas desta índole. Menciono apenas algumas:
a) O reducionismo socializante. É a ideologização mais fácil de descobrir. Em alguns momentos, foi muito forte. Trata-se de uma pretensão interpretativa com base em uma hermenêutica de acordo com as ciências sociais. Engloba os campos mais variados, desde o liberalismo de mercado até a categorização marxista.
b) A ideologização psicológica. Trata-se de uma hermenêutica elitista que, em última análise, reduz o “encontro com Jesus Cristo” e seu sucessivo desenvolvimento a uma dinâmica de autoconhecimento.
Costuma verificar-se principalmente em cursos de espiritualidade, retiros espirituais, etc. Acaba por resultar numa posição imanente autorreferencial. Não tem sabor de transcendência, nem portanto de missionariedade.
c) A proposta gnóstica. Muito ligada à tentação anterior. Costuma ocorrer em grupos de elites com uma proposta de espiritualidade superior, bastante desencarnada, que acaba por desembocar em posições pastorais de “quaestiones disputatae”. Foi o primeiro desvio da comunidade primitiva e reaparece, ao longo da história da Igreja, em edições corrigidas e renovadas. Vulgarmente são denominados “católicos iluminados” (por serem atualmente herdeiros do Iluminismo).
d) A proposta pelagiana. Aparece fundamentalmente sob a forma de restauracionismo. Perante os males da Igreja, busca-se uma solução apenas na disciplina, na restauração de condutas e formas superadas que, mesmo culturalmente, não possuem capacidade significativa. Na América Latina, costuma verificar-se em pequenos grupos, em algumas novas Congregações Religiosas, em tendências para a “segurança” doutrinal ou disciplinar. Fundamentalmente é estática, embora possa prometer uma dinâmica para dentro: regride. Procura “recuperar” o passado perdido.
2) O funcionalismo. A sua ação na Igreja é paralisante. Mais do que com a rota, se entusiasma com o “roteiro”. A concepção funcionalista não tolera o mistério, aposta na eficácia. Reduz a realidade da Igreja à estrutura de uma ONG. O que vale é o resultado palpável e as estatísticas. A partir disso, chega-se a todas as modalidades empresariais de Igreja. Constitui uma espécie de “teologia da prosperidade” no organograma da pastoral.
3) O clericalismo é também uma tentação muito atual na América Latina. Curiosamente, na maioria dos casos, trata-se de uma cumplicidade viciosa: o sacerdote clericaliza e o leigo lhe pede por favor que o clericalize, porque, no fundo, lhe resulta mais cômodo. O fenômeno do clericalismo explica, em grande parte, a falta de maturidade adulta e de liberdade cristã em boa parte do laicato da América Latina: ou não cresce (a maioria), ou se abriga sob coberturas de ideologizações como as indicadas, ou ainda em pertenças parciais e limitadas.
Em nossas terras, existe uma forma de liberdade laical através de experiências de povo: o católico como povo. Aqui vê-se uma maior autonomia, geralmente sadia, que se expressa fundamentalmente na piedade popular. O capítulo de Aparecida sobre a piedade popular descreve, em profundidade, essa dimensão. A proposta dos grupos bíblicos, das comunidades eclesiais de base e dos Conselhos pastorais está na linha de superação do clericalismo e de um crescimento da responsabilidade laical.
Poderíamos continuar descrevendo outras tentações contra o discipulado missionário, mas acho que estas são as mais importantes e com maior força neste momento da América Latina e do Caribe.
Quero pedir-lhes um favor, um jeitinho… Rezem por mim; rezem por mim, preciso! Que Deus lhes abençoe. Que Nossa Senhora Aparecida lhes proteja. Adeus até quando eu voltar, em 2017!