Por Edward Pentin, National Catholic Register, 12 de fevereiro de 2020 | Tradução: FratresInUnum.com – A Exortação Apostólica publicada recentemente confirma que, no pontificado do papa Francisco, a política tem prioridade sobre a religião. Ao mesmo tempo em que mantém o pé no acelerador da “ecologia integral”, ele pisou no freio da agenda religiosa do Sínodo.
Os cardeais Burke, Müller e Sarah (e seu co-autor, Bento XVI), bem como os poucos prelados que defenderam fervorosamente o celibato sacerdotal, têm motivos para comemorar. Agora eles podem ignorar os promotores do sacerdócio a baixo custo, especialmente os bispos Fritz Löbinger, Erwin Kräutler e seus parceiros no “caminho sinodal” alemão. Schluss! Não há abertura para viri probati ou “diaconisas”.
O Papa Francisco reconhece que devem ser feitos esforços para que as comunidades mais isoladas da Amazônia não fiquem privadas da Eucaristia e dos sacramentos da Reconciliação e Unção dos enfermos (números 86 e 89). Ele também admite que a vida e o ministério sacerdotal não são monolíticos (nº 87). No entanto, ele afirma que a solução se sustenta no sacramento das Ordens Sagradas que configura o sacerdote a Cristo (n° 87), que é o Esposo da comunidade que celebra a Eucaristia e é representado pelo celebrante (n° 101). Ao fazê-lo, ele encara os dois principais argumentos daqueles que se opõem ao sacerdócio de padres casados.
O Papa propõe como solução rezar pelas vocações sacerdotais e dirigir as vocações missionárias para a Amazônia (n° 90). Ele ainda reclama do absurdo que é o fato de que mais padres dos países amazônicos estejam indo para os Estados Unidos e Europa do que para missões em seus próprios países! (nota 132).
Como havia sido anunciado nos últimos dias, não há sequer uma menção indireta à possibilidade de ordenar homens casados que sejam líderes comunitários. Em vez disso, Francisco insiste no fato de que não se trata apenas de facilitar uma maior presença de ministros ordenados que podem celebrar a Eucaristia, mas de promover um encontro com a Palavra de Deus e o crescimento em santidade por meio de vários tipos de serviços pastorais. Isso pode ser desenvolvido por leigos (n° 93), como o bispo Athanasius Schneider argumentou judiciosamente com base em sua própria experiência lidando com a falta de padres na Rússia soviética.
Devido à mesma configuração do sacerdote a Cristo, Esposo da comunidade, e à ampla e generosa obra missionária já realizada por mulheres nas áreas de batismo, catequese e oração (n° 99), o Papa Francisco encerra a discussão sobre a ordenação de mulheres afirmando que seria uma forma de reducionismo “clericalizar” as mulheres, na crença de que elas obteriam um status mais alto na Igreja somente se admitidas nas Ordens Sagradas (nº 100). Pelo contrário, as mulheres contribuem na Igreja à sua maneira, tornando presente a terna força de Maria, a Mãe (n. 101).
Se tem alguém que deve estar pelo menos em parte satisfeito, é o Cardeal Walter Brandmüller. Ele denunciou o Instrumentum Laboris do Sínodo da Amazônia, alegando que era um convite à apostasia, na medida em que entendia a “inculturação” como uma renúncia à pregação do Evangelho e a aceitação das religiões pagãs como um caminho alternativo de salvação. Seu recado pelo visto chegou a Santa Marta.
“Querida Amazônia” se dissocia do conceito de “inculturação” promovido pela Teologia Indígena – liderada principalmente pelos Padres Paulo Suess e Eleazar López – e adota a versão light da constituição conciliar Gaudium et Spes. A última abordagem da inculturação consiste em uma mera adaptação do Evangelho à compreensão de todos, expressando a mensagem de Cristo em termos apropriados a cada cultura (nota 84).
Trata-se, portanto, de uma inculturação que, embora não rejeite nada de bom que existe na cultura amazônica, faz dela um objeto de redenção (n ° 67), leva à plenitude, à luz do Evangelho (n° 66), e quer enriquecê-lo pelo Espírito Santo através do poder transformador do Evangelho (n ° 68).
Isso obriga a Igreja a adotar em relação às culturas uma atitude confiante, mas também atenta e crítica (nº 67). Acima de tudo, exige que ela não se envergonhe de Jesus Cristo (n. 62), nem se limite a transmitir aos pobres uma mensagem puramente social em vez da grande mensagem de salvação (n. 63), pois esses povos têm o direito de ouvir o Evangelho. Sem essa evangelização, a Igreja se tornaria uma mera ONG e abandonaria o mandato de pregar a todas as nações (nº 64). Em vez dos missionários da Consolata e outros que se gabam de não batizarem ninguém em 60 anos, o documento apresenta São Turíbio de Mogrovejo e São José de Anchieta como modelos de grandes evangelizadores da América Latina (n ° 65).
Ao contrário do que foi dito acima, numa tentativa aberta, mas fracassada, de se justificar pelos cultos idólatras escandalosos à Pachamama nos Jardins do Vaticano e na Basílica de São Pedro, o Papa Francisco declara que, no contexto de uma espiritualidade inculturada, é de alguma maneira possível que símbolos indígenas, mitos carregados de significado espiritual e festivais religiosos cobertos de significado sagrado, sejam usados sem necessariamente incorrer em idolatria (nº 79).
O cardeal Brandmüller todavia tem outro motivo para se indignar, além dessa defesa infrutífera do culto a Pachamama. Citando abundantemente sua encíclica Laudato Si, o Papa Francisco reafirma sua visão de mundo “Teilhardiana” e da Nova Era, de um universo no qual “tudo está conectado” (nº 41). Os louvores ao misticismo indígena que leva os aborígines não apenas a contemplar a natureza, mas a sentirem-se intimamente ligados a ela a ponto de considerá-la como mãe (n ° 55). De fato, a Mãe Terra é mencionada duas vezes na exortação (Nº 42).
Uma referência passageira a Deus Pai como Criador de todos os seres do universo é insuficiente para dissipar o sabor “panteísta” de tais passagens, uma vez que segue uma citação de um verso da poetisa Sui Yun sobre “comunhão com a floresta” (diga-se de passagem que essa poetisa Peruana é conhecida pelo caráter desinibido e erótico de suas criações: “minha poesia é genital”, afirma ela) (n ° 56).
No entanto, o aspecto mais defeituoso do documento é sua total adesão aos postulados e à agenda da Teologia da Libertação em sua versão ecológica reciclada por Leonardo Boff e assumida pelos documentos do Sínodo.
Numa clara manifestação de “clericalismo” (já que o Magistério da Igreja não tem autoridade em questões científicas ou econômicas) e, acima de tudo, indo contra o desejo de progresso da grande maioria da população Amazônica, a exortação pós-sinodal assume, sem o necessário discernimento, um diagnóstico catastrófico e mentiroso de ONGs ambientais e partidos de esquerda sobre a suposta devastação da Amazônia: a floresta está sendo destruída (nº 13); a construção de usinas hidrelétricas e hidrovias está prejudicando os rios (nº 11); a região enfrenta um desastre ecológico (nº 8); as populações estão sendo dizimadas lentamente pelos novos colonizadores (nota 13) ou forçadas a migrar para cidades onde encontrariam a pior forma de escravização (nº 10).
Segundo o Papa, é preciso se sentir ultrajado (nº 15) e possuir um saudável senso de indignação (nº 17). Nesse contexto, não é nada amenizante que o comunista chileno Pablo Neruda e Vinicius de Moraes, autor brasileiro de um famoso poema intitulado “Senhores barões da terra”, que advogam pela luta armada, estejam entre os poetas-profetas que denunciam os males do desenvolvimento econômico. [1]
Pior ainda, as soluções alternativas propostas pelo Papa Francisco correspondem aos sonhos coletivistas mais avançados dos antropólogos neo-marxistas, que vêem a vida tribal da selva como um modelo para o mundo futuro.
De acordo com o documento, o “bom viver” dos indígenas expressa a verdadeira qualidade de vida (nos 8, 26 e 71) e é o cumprimento da utopia da harmonia pessoal, familiar, comunitária e cósmica, expressa, por sua vez, pela abordagem comunitária da existência e estilo de vida austero e simples (n ° 71): “Tudo é compartilhado; os espaços privados – típicos da modernidade – são mínimos … Não há espaço para a noção de um indivíduo separado da comunidade ou da terra ”(nº 20).
Nesse quesito, o povo indígena tem muito a nos ensinar (n ° 71), e os cidadãos devem se permitir ser “reeducados” por eles, pois é através deles que Deus quer que abraçemos sua misteriosa sabedoria (n ° 72 )
Dadas essas fantasias eco-tribalistas e coletivistas do Papa Francisco, não é de admirar que ele seja o líder para quem as correntes esquerdas radicais de todo o mundo estão se voltando!
Em resumo, essa estranha exortação pós-sinodal – que se recusa a citar o Documento Final do Sínodo dos Bispos que o motivou – representa, ao mesmo tempo, uma aceleração sócio-econômica e um freio eclesiológico que deixará tanto Gregos como Troianos insatisfeitos.
Mas não há dúvida de que os mais insatisfeitos serão os prelados e especialistas no campo alemão que investiram longas horas de trabalho intelectual e centenas de milhares de Euros em uma assembléia sinodal que acabou dando à luz a um pássaro aleijado, incapaz de voar porque uma de suas asas foi amputada.
Caberá aos historiadores resolver o enigma das razões que levaram o Papa Francisco a interromper a tão divulgada abertura aos padres casados. Seria para “evitar um cisma, ou pior ainda, uma desestabilização [do pontificado] que teria sido fatal”, como sugere Franca Giansoldati, de Il Messagero? Ou é só um passo atrás agora, na esperança de pegar impulso para avançar dois passos adiante em breve? (A referência na nota 120 à proposta do Sínodo de desenvolver um “rito amazônico” nos obriga a permanecer vigilantes, principalmente quando o autor do documento é claramenre “ardiloso”).
Como dizem os Franceses: quem viverá verá.
Mas para aqueles entre nós, que nos esforçamos por um ano inteiro para bloquear a agenda revolucionária do Sínodo para a região da Amazônia (incluindo o site panamazonsynodwatch.info, que um analista americano chamou de “centro da resistência”), temos algumas razões para satisfação.
Mesmo que Francisco tenha dado seu aval à Leonardo Boff, pelo menos ele jogou os gerentes da Löbinger, Kräutler & Suess no Tibre.