O milagre de Saint Nicholas du Chardonnet (V)

Para melhor compreensão, leia também os artigos anteriores da série sobre a tomada da Igreja de Saint Nicholas du Chardonnet.

Mas a polícia e o judiciário deixaram bem claro que estão relutantes em tomar qualquer ação direta. Monsieur Jean Guitton, um proeminente escritor católico, membro da Academia Francesa e amigo íntimo do Papa Paulo VI, foi apontado como mediador. Mas os tradicionalistas não sairão ao menos que se lhes ofereça uma igreja própria. Após oito anos de exílio, eles estão determinados a rezar em igrejas de agora em diante. Se forem expulsos, simplesmente ocuparão outra igreja, e o processo legal terá que começar novamente – a Catedral de Notre Dame foi mencionada.

Porta lateral da Igreja de Saint Nicholas du Chardonnet

Asseguraram-me que, se eu quisesse experimentar a verdadeira atmosfera de uma paróquia tradicionalista, eu deveria ir à noite – o que explica o motivo de, às 6:15 PM, eu sair da estação de metrô Maubert-Mutalité para ouvir os sinos de Saint Nicholas chamando os fiéis para rezar. Mesmo em dias de semana há missa às 8, 12, 17 horas (seguida de Vésperas e Benção) e 18:30. Entrei na igreja durante a Benção bem em tempo de ouvir o Papa Paulo VI ser rezado pelo nome. Isso também foi feito durante as celebrações de Sexta-feira Santa em Ecône, onde estive quatro dias antes. Um coral verdadeiramente maravilhoso estava cantando – descobri depois que eles se reuniram espontaneamente; eles cantam nas Vésperas, Benção e na Missa todos os dias e aos domingos em várias Missas. Toda noite seus membros ficam até tarde a praticar e expandir seu repertório já impressionante – o aspecto mais marcante do coral (além de seu talento) é a sua juventude.

A igreja suja e dilapidada que existia antes da ocupação foi transformada – com amor e a fundo. A igreja foi lavada e estátuas de mármore que aparentavam quase pretas de imundice estão agora positivamente resplandecendo de brancura. Há flores em todas as capelas laterais, velas queimando diante das imagens, o altar-mor em particular está incandescente com velas e quase encoberto de flores. O altar-mor em todas as igrejas é o símbolo de Cristo, e nessa Semana Santa é o mais dramático símbolo da ressurreição da fé da Igreja de Cristo em Saint Nicholas. O altar parecia realmente estar morto, abandonado para sempre, a nunca ser usado novamente, e aqui estava ele, triunfantemente ressuscitado, radiante de luz e alegria Pascal – com a mesa  Cranmeriana [ndt: referência ao Arcebispo Cranmer, idealizador da reforma litúrgica na Inglaterra após o cisma de Henrique VIII] e seu palanque colocados de lado, competentemente simbolizando a derrota da Igreja Conciliar.

A missa começou. Foi celebrada pelo próprio Mons. Ducaud-Bourget. Cantada, e belamente cantada. No Sanctus, em particular, o eterno canto preencheu e ecoou pelos arcos dessa antiga igreja, como fizera por séculos. O Concílio podia nunca ter ocorrido.

Uma senhora andava, de capela em capela, regando os vasos de flores com amável cuidado. A todo segundo um indivíduo ou um grupo de pessoas vinha até a igreja. Alguns ficavam para a missa, outros apenas rezavam por alguns momentos antes de sair. Muitos eram jovens, mas alguns eram velhos – e quão felizes essas pessoas velhas eram. Aqui estava a fé em que foram educados a conhecer e a amar; aqui estavam suas devoções tradicionais inteiramente intocadas. Dentro da igreja de Saint Nicholas du Chardonnet é como se o tempo permanecesse ainda em 1962.

Um grupo de seminaristas de Ecône entrou por alguns minutos. Eles deixaram o seminário para sua folga de Páscoa. Eram um lembrete encorajador de que o ressurgimento tradicionalista na França não é um fenômeno temporário dependente de alguns poucos padres velhos. Para cada padre velho que permaneceu fiel à Missa de sua ordenação existia um jovem padre ou um seminarista pronto para juntar-se a ele, e eventualmente substituí-lo. E para cada pessoa velha que claramente tem Saint Nicholas como o céu na terra existe um jovem que descobriu o que a fé Católica foi um dia, e não está determinado a aceitá-la de outra forma.

Fiéis rezam na Igreja de Saint Nicholas

E o milagre de Saint Nicholas du Chardonnet – ele continuará? “Reze por nós. Reze por nós para que isso continue”, disse uma senhora, agarrando meu braço em seu fervor. “Peça a todos que rezem por nós”.

Como uma nota de rodapé irônica nessa reportagem, e um sinal significante dos tempos em que vivemos, descobri ao ler a edição de 9 de abril do The Tablet, após meu retorno a Londres, que o Cardeal Marty convidou todo Anglicano que estiver visitando a França para receber a Santa Comunhão nas igrejas Católicas se eles não puderem recebê-la numa igreja Anglicana. Parece que o Cardeal Arcebispo de Paris precisa de nossas orações muito mais que os tradicionalistas membros de seu rebanho.

Continua.