Contracepção: uma encíclica do Papa Francisco está a caminho?

FratresInUnum.com, 12 de julho de 2022 – Eletta Cucuzza para ADISTA – [Tradução: FratresInUnum] – Esperada pela (Revista) Civiltà Cattolica, há todos os elementos para pensar que uma nova encíclica do Papa Francisco sobre o tema da bioética está em andamento. Entretanto, esperança mesma dada pela revista, cujos rascunhos passam sempre pelo escrutínio da Santa Sé, constitui uma “prova” de que a hipótese tem uma base real (a revista também imagina o seu título: Gaudium vitae). Antes de reunir outros elementos para confirmar, é preciso dizer que o suposto novo documento pontifício poderia introduzir, em particular, em certas questões como a contracepção e a procriação assistida, mudanças tão significativas quanto indispensáveis. No que diz respeito à contracepção, seria a superação da Humanae Vitae, a encíclica que desde o ano de publicação, 1968, proíbe os crentes de usar métodos artificiais para evitar a gravidez. Uma prescrição não obedecida por muitos casais católicos.

O artigo, assinado pelo jesuíta Jorge José Ferrer, trata do volume – recém-publicado pela LEV, a Editora Vaticano – intitulado “Ética teológica da vida. Escrita, tradição, desafios práticos”. A obra contém as atas de um seminário interdisciplinar promovido pela Pontifícia Academia da Vida há cerca de um ano, onde as intervenções dos participantes responderam a um “texto base” elaborado por um grupo de teólogos e teólogas convocado pela mesma Academia. No capítulo VII do livro, declarações interessantes são dedicadas à contracepção. Diz ele: «Existem, de fato, condições e circunstâncias práticas que tornariam irresponsável a escolha de gerar, como o próprio magistério eclesiástico reconhece, precisamente por admitir “métodos naturais”. Portanto, como ocorre nesses métodos, que já utilizam técnicas e conhecimentos científicos específicos, há situações em que dois cônjuges, que decidiram ou vão decidir aceitar filhos, podem fazer um sábio discernimento no caso concreto, que, sem contrariar a sua abertura à vida, naquele momento, não a prevê. A escolha sábia será implementada avaliando adequadamente todas as técnicas possíveis em referência à sua situação específica e obviamente excluindo as abortivas “. Para sublinhar, “todas as técnicas possíveis”.

Sobre o Seminário, o presidente da Pontifícia Academia pela Vida, Mons. Vincenzo Paglia, deu uma entrevista substanciosa ao L’Osservatore Romano (30/6) e ao Vatican News. A evidência dada ao volume – e ao tema sensível que trata: a ética católica com seus fundamentos evangélicos, tradições teológicas e normas ignoradas – pelos meios de comunicação mais importantes do Vaticano, com o acréscimo da autoridade de Civiltà Cattolica, que gasta nele 12 de suas páginas (edição de 2 a 16 de julho), tem rumores de um tamtam habilmente tocado, que não pode visar apenas à divulgação de uma obra e de um seminário, por mais valiosos que sejam; pelo menos é uma questão de testar o terreno e prepará-lo para a mudança.

E outro “toque de tambor” é representado pelo artigo de 21 de junho passado do Vatican News (“Luciani, a doutrina moral e o olhar do Pastor”) cujo subtítulo enucleava: «As posições de abertura sobre a pílula, expressas quando era bispo de Vittorio Veneto, antes da Humanae Vitae de Paulo VI, encíclica que posteriormente defendeu». É natural perguntar-nos que necessidade havia, precisamente nestes dias, de esclarecer, mais de 50 anos depois, o pensamento de um bispo que, no entanto, era discordante com o do papa da época, Paulo VI. Em suma, uma escolha que parece responder à necessidade de uma reabilitação muito autorizada da pílula anticoncepcional, já que as palavras relatadas no artigo são as de Albino Luciani, que cerca de dez anos depois se tornou papa, embora por apenas 33 dias, em 1978.

Papa Luciani ficou do lado da pílula

Este é o contexto. O longo aprofundamento confiado primeiramente por João XXIII, e depois pelo Papa Paulo VI, a uma comissão de teólogos resultou em um voto consultivo a favor da liberalização da “pílula anticoncepcional de Pincus”. Luciani defendeu sua abertura cautelosa ao uso da pílula, escreve o site do Vaticano, lembrando que a própria natureza bloqueia a ovulação nas mulheres, depois que ela engravida, durante toda a gravidez e nos primeiros meses de amamentação. «Parece que esta interpretação é legítima: a natureza, também através da progesterona – escreveu o bispo – pensa em dar um pouco de descanso à mãe e ao bem da criança (garantir que ela dê à luz a uma gestação de cada vez e à distância). A “progestina” nada mais é do que a progesterona sintética, fabricada em laboratório. Parece que isso não é contra a natureza, se, fabricado em imitação da progesterona natural”, e se a “correta intenção, que é a intenção de trazer ao mundo – ao longo dos anos de fecundidade – o número de filhos que podem ser devidamente sustentados e educados…” for preservado. E, falando da objeção levantada, de que a pílula de progesterona era “contra a natureza”, Luciani acrescentou: «Alguém diz: a natureza estabeleceu que uma mulher ovula todos os meses. Sim, mas a própria natureza suspende a ovulação durante a gestação e lactação e após a menopausa. Devemos ter cuidado para não tomar a “natureza” de forma muito restrita. Por exemplo, a natureza quer que sejamos mais pesados ​​que o ar: no entanto, fazemos bem em viajar de avião, imitando o princípio natural pelo qual os pássaros voam. O Magistério pode certamente interpretar autenticamente as leis naturais. Mas com muita cautela, quando ele tem dados confiáveis ​​em sua mão. No nosso caso, os dados parecem ser tais ou dizemos: é legítimo, ou pelo menos dizemos: não se sabe, é duvidoso. Em caso de dúvida, quem usa a pílula não pode ser acusado de pecado”.

“Seja natural ou artificial”

Outra indicação da mudança para a qual parece se dirigir o pensamento do Papa Francisco sobre a contracepção artificial está contida – novamente no volume publicado pela LEV em 1º de julho – na douta e detalhada intervenção do arcebispo de Lima, Mons. Carlos Castillo Mattasoglio, do qual conhecemos a harmonia decisiva com este pontífice. Suas palavras nesse sentido são lentas e claras, e votam por normas atualizadas que incluam mais as dificuldades que a humanidade enfrenta. Diz ele: «(…) uma Igreja que confia na maturidade humana e espiritual do povo não pode reduzir o comportamento dos crentes a meras fórmulas normativas. É urgente suscitar um discernimento livre e ao mesmo tempo fiel que leve todos a tomarem decisões adequadas e justas, dentro dos limites dos desafios. Não é saudável que a humanidade tenha sempre “espadas de Dâmocles”, ameaçando a condenação sempre que as regras são negligenciadas ou se não agirmos segundo um procedimento preciso, na prática comum de qualquer método, seja natural ou artificial. E, por outro lado, nem é conveniente deixar uma porta aberta para uma facilidade infinita. (…). Permanecer fiel a Deus e à tradição na questão profunda dos mistérios da vida íntima no amor interpessoal e familiar requer atualizações que incluam aspectos novos e complexos emergentes hoje, como consequência da grande crise de época, como as diferentes formas de movimentos populares e maneiras de viver em situações dramáticas. Essa diversidade humana também existiu no mundo bíblico, mesmo que nem sempre tenhamos dado atenção suficiente a tudo isso, justamente por causa de algumas reduções”.

Procriação medicamente assistida

Entre outras reflexões, o seminário da Pontifícia Academia para a Vida abre para uma “avaliação possibilística” da procriação medicamente assistida (PMA) quando não heteróloga. Vamos resumir, confiando no resumo oficial de Civiltà Cattolica. «Na PMA heteróloga e na maternidade de substituição, o próprio corpo reduz-se a um objeto biológico. (…). Mais controversa é a avaliação do PMA homólogo, em particular no “caso simples”, que não prevê a formação de embriões supranumerários. Nesse procedimento, a geração não é separada artificialmente da relação sexual, pois esta é, em si, infértil. Pelo contrário, a técnica disponibiliza uma intervenção que permite remediar a infertilidade, sem suplantar a relação, mas sim possibilitar a geração. Argumenta-se numa das intervenções que um casal que recorre à PMA homóloga consegue o que a relação sexual destes cônjuges não consegue. A técnica na medicina não pode ser rejeitada a priori: deve ser objeto de discernimento, para verificar se cumpre a função de uma forma de cuidado pessoal. Essa avaliação possibilística da AMP se inscreve em uma interpretação antropológica mais ampla da relação entre sexualidade, esposo e geração. O tema apresentado é interessante, pois pretende a intervenção médica como “terapêutica”, permitindo que a relação conjugal dos cônjuges inférteis alcance a plena realização como doadora responsável de uma nova vida, abrindo seu amor à geração de um terceiro. É um raciocínio que, sem dúvida, vai dar origem a muitas discussões». E as discussões são a base para dar passos pra frente.

Imagem publicada no site do L’Osservatore Romano como ilustração da entrevista de Mons. Vincenzo Paglia.

15 comentários sobre “Contracepção: uma encíclica do Papa Francisco está a caminho?

  1. São muitas palavras e visões técnico/médicas e pseudo morais para resumir em um único ponto: vivemos em uma época apóstata, onde o magistério está perdido tentando provar, argumentar e ainda se adaptar à um tipo de homem pós-moderno onde a fé tradicional não tem mais espaço justamente porque foi abandonado pelo mesmo magistério. A humanae vitae foi escrita em 1968 para uma sociedade pós revolucionária. Hoje, 50 anos depois, vem mais revolução e novidade para esse homem moderno que na verdade se tornou o centro da fé.

    As famílias católicas tradicionais e conservadores são abertas à vida, não fazem planos ou cálculos, e por isso são livres, independentes e prósperas, seja de benção, seja de filhos, seja de alegria. Sim, possuem enormes desafios e situações graves como qualquer família que escolheu servir a Deus.

    Que tempos terríveis vivemos!

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    1. É triste estão querendo q a Igreja se torne moderninha ..
      Tá a um passo disso !
      Q Deus nos defenda de mais esse ataque!
      Apostasia a vista !
      Oremos !

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  2. É triste ver como essa “igreja” conciliar foi fundada por globalistas e está a passos largos na destruição do verdadeiro Catolicismo. Entretanto, nos conforta saber que jamais conseguirão a destruição total.

    Que Deus nos mantenha firmes na verdadeira fé e longe da apostasia.

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  3. Sereis como deuses! – diz a velhota e enganadora serpente – escolha, mande, decida, faça o que quiser!

    A pecado começa na ideia consentida.
    Aqueles que seguem o cenpaflam estão errados, se posso decidir quantos e quando ter filhos, porque não posso decidir o método?

    Voltemos a Casti Connubi, rasguem o resto…

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  4. O que me deixa intrigado, é saber que a fonte ou a inspiração para tal “encíclica”, não vem de fontes católicas, as ideias parecem ter saído de uma manual lgbt… ou uma cartilha revolucionária que tende ao erro e com isso levam outros consigo e tudo parece bem! É incrível como tudo parece bem e quase todo mundo o católico fica como” os passarinhos em seus ninhos, esperando a mãe passarinha mastigar a minhoca e por em seus bicos.” Vem aí mais uma enxurrada de erros ensinados como algo bom a ser seguido.

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  5. Depois da “pandemia” da Covid-19, descobrimos que muitos cientistas são receptivos a pressões e grupos de interesses alheios à Ciência e que a grande mídia se presta a encobrir a verdade com a versão mais rendosa, e por isso corremos o risco de termos explicações erradas ou enviesadas de mecanismos como o da nidação para sabermos se a pílula anticoncepcional é ou não abortiva.

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  6. Profetizo, com a autoridade de um escorredor-de-macarrão, que em 2068 os católicos latinos constituirão o “exorcismo-de-fetos”, uma extensão ao sacramental, como a versão católico do aborto.

    Os latinos consistentemente procuram ter uma versão dita “católica” de tudo quanto é coisa estranha, já existe a tabelinha-católica, amanha teremos a pílula-católica, na outra semana será o aborto-católico ministrado por sacerdotxs trans-sexuais.

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  7. A verdade e que a autoridade papal está tao deformada que nem sequer os modernistas se importam com o que o Papa diz ou faz… apenas quem é Catolico de verdade se escandaliza com o que o Papa diz. A maioria dos ditos católicos nunca leu uma enciclica, nao vai ler e, muito menos basear suas ações nela.

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  8. Atualmente tenho a impressão de que querem transformar a Igreja Católica num covil de práticas pagãs, ou, na portadora de alguma religião naturalista, de preferência bem primitiva; naquelas religiões que não pregam moral alguma e se resumem à prática de “sacrifícios” para os deuses mandarem chuva e boas colheitas. “Sacrifícios” dos outros diga-se de passagem, como p. ex., o assassinato de crianças, de virgens, bichos etc., sem nenhum aperfeiçoamento moral e ético.

    Tenho a impressão de que alguém trabalha para que tudo seja “liberado” e “liberalizado” nessa nova religião pagã; de que esse novo deus seja de preferência bem intimista (tipo, só ele e o crente), e, de que esteja preocupado apenas com o fato daquele novilho cevado ter sido sacrificado ou não (e do jeito certo). De preferÊncia precisa ser um sacrifício bem motivado, como p. ex., vencer uma guerra para tomar o territórios de outros países, ou simplesmente conceder a vingança sanguinária sobre o vizinho indiscreto; quem sabe apenas para ver o time do coração do vencer brasileirão, ou transar com mulher do chefe, etc.

    Afinal, tudo será permitido por esse deus pagão, preocupado apenas com a felicidade material dos homens, que afinal de contas poderão ter quantas mulheres quiserem, fazer orgias para agradar a divindade, matar inimigos, fazer abortos a torto e a direito, se refestelar em comilanças sem fim e, enfim, serem felizes aqui nesta terra, desde sacrifiquem um bicho qualquer aí de vez em quando (de preferência um novilho bonito e gordo). De resto, tudo precisa ser liberado, porque essas proibições são anacrônicas e (o novo) deus nos fez para a felicidade, aqui na terra…

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  9. Gilbert Keith Chesterton, The Well and the Shallows, 1935.

    “Por ejemplo, a lo largo de toda la antigüedad, tanto en su etapa primitiva como en la última, existieron formas de idolatría e imágenes de las cuales un cristiano apenas se anima a hablar. «No permitamos que sean siquiera nombradas entre ustedes…»[1]. Los hombres se revolcaron en la mera sexualidad de una mitología del sexo; organizaron la prostitución como un sacerdocio para el servicio de sus templos, hicieron de la pornografía su única poesía, exhibieron emblemas que convirtieron hasta la arquitectura en una especie de frío y colosal exhibicionismo. Se han escrito muchos libros eruditos acerca de todos esos cultos fálicos, y cualquiera puede recurrir a ellos para enterarse de los detalles. Pero lo que a mí me interesa es otra cosa.

    En cierto sentido, todo este pecado antiguo era infinitamente superior, inconmensurablemente superior al pecado moderno. Todos los que han escrito acerca de aquél están de acuerdo en una cosa: era el culto de la fertilidad. Estaba, desafortunadamente, demasiado a menudo entretejido con el culto de la fertilidad de la naturaleza. Por lo menos estaba del lado de la Naturaleza. Estaba del lado de la vida. Ha sido dejado a los últimos cristianos, o mejor, a los primeros cristianos enteramente dedicados a blasfemar y negar el cristianismo, el inventar una nueva clase de adoración del sexo, que no es siquiera una adoración de la vida. Ha sido dejado a los últimos modernistas proclamar una religión erótica que a la vez exalta la lujuria y prohíbe la fertilidad. El nuevo paganismo merece literalmente el reproche de Swinburne, cuando se lamenta sobre el antiguo paganismo: «y no construye el abundante símbolo y no desparrama el banquete paterno». Los nuevos sacerdotes han abolido la paternidad y guardan el festín para ellos mismos. Son peores que los paganos de Swinburne. Los sacerdotes de Priapo y Coyto los precederán en el reino de los cielos.”

    §§§

    Esses novos “sacerdotes” da atual “religião erótica que ao mesmo tempo exalta a luxúria e proíbe a fertilidade” são, “piores que os sacerdotes pagãos”, que os “precederão no Reino dos Céus”, se eles forem para lá.

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