As forças ocultas na Igreja e uma hierarquia que se deixa instrumentalizar (ou é conivente?): em preparação para Conferência de Puebla, Dom Paulo Evaristo Arns apresentou como seu texto de autoria da ONU.

O Estado de São Paulo – Documentos diplomáticos mantidos em arquivos de embaixadas na Santa Sé revelam que a Organização das Nações Unidas (ONU) contou com os esforços do cardeal dom Paulo Evaristo Arns na tentativa de influenciar o papa Paulo VI e a Cúria no Vaticano para que a Igreja fizesse críticas aos regimes militares sul-americanos nos anos 1970.

Documentos obtidos pelo Estado em Roma reforçam as indicações de que Arns atuou em cooperação com ativistas de direitos humanos, exilados e com a ONU para levar à cúpula do Vaticano alertas sobre os regimes militares no Cone Sul. Já se sabia que o cardeal havia atuado para buscar financiamento externo a fim de coletar de informações sobre a tortura no Brasil. Os novos documentos mantidos em Roma apontam, agora, que Arns também aceitou uma proposta da ONU e de órgãos de direitos humanos para levar aos demais cardeais e ao próprio papa uma posição crítica em relação às ditaduras sul-americanas.

Um dos principais focos da ofensiva nos bastidores era a Conferência Episcopal Latino-Americana (Celam) que o papa Paulo VI tinha convocado para outubro de 1978, auge da repressão em diversos países da região.

Adiamento. O evento, que estabeleceria uma linha para a Igreja na região e contaria com a presença do papa e do alto clero, acabaria ocorrendo apenas em 1979. Paulo VI morreu em 1978 e seu sucessor, João Paulo I, ficou apenas 33 dias no cargo, falecendo e abrindo um novo período de transição na Igreja. No dia 15 de outubro daquele mesmo ano, Karol Wojtyla foi eleito e o evento de Puebla (México) foi confirmado para o ano seguinte.

Um dos documentos mantidos em sigilo revela uma reunião entre uma missão da ONU e Arns, no dia 6 de janeiro de 1978, em São Paulo. Do encontro participou o bispo uruguaio Marcelo Mendiharat, exilado no Brasil por causa da perseguição em seu país. O objetivo da reunião era propor que nos encontros preparatórios para Puebla os dois religiosos levassem uma proposta de texto que, no fundo, seria redigido pela ONU. “Sondei o terreno com d. Paulo (a delegação brasileira terá entre 40 e 53 bispos entre os 350 em Puebla) e Mendiharat e os dois estão dispostos a apresentar como seus um texto que nós lhes ofereceremos”, escreveu no dia 17 de janeiro de 1978 um dos representantes da ONU ao resumir a reunião.

Arns, num primeiro estágio, levaria o texto redigido pela ONU à CNBB em abril daquele ano para sua aprovação, como se fosse de sua autoria. “O clero liberal contactado se responsabilizará em mobilizar as conferências episcopais nacionais onde os textos adotados pelas assembleias irão em discussão em Puebla depois das reuniões de trabalho”, indicou a ONU.

Segundo o documento, a missão sugeria que outros funcionários das Nações Unidas buscassem contatos com cardeais que seguiam a mesma tendência de Arns pela América Latina para que adotassem uma posição semelhante, criando uma rede do alto clero capaz de forçar a aprovação de um texto de crítica à situação latino-americana. Essa lista incluía Ricardo Durán Flores de Callao, bispo auxiliar de Lima, o cardeal de Quito, Paulo Munoz, e o arcebispo de La Paz, Manrique.

‘Marxização’. A contraofensiva à missão de Arns foi encabeçada pelo secretário-geral da Celam, Alfonso López Trujillo, bispo auxiliar de Bogotá e conhecido por seu conservadorismo. Sua meta era a de usar o evento para combater o que chamava de “marxização da Igreja” e, principalmente, os defensores da Teologia da Libertação.

Em Roma, fontes confirmam que Trujillo impediria a ida a Puebla de bispos ligados à essa tendência e ainda enviaria a cada participante livros como Cristianismo e Marxismo, de G. Cottier e estudos sobre segurança nacional. O próprio João Paulo II – conhecido por sua posição anticomunista – colocaria seu peso na defesa da visão de Trujillo.

Choque. O texto final seria uma demonstração desse choque entre diferentes alas dentro da Igreja latino-americana e da ação de Arns, que acabou conseguindo incluir referências de peso político. De um lado, a declaração de Puebla admitiu o fato de que os latino-americanos “viviam uma situação de permanente violação da dignidade da pessoa”. “A isso se soma as angústias surgidas pelo abuso de poder, típicos dos regimes de força. Angústias pela repressão sistemática ou seletiva, acompanhada de delação, violação da privacidade, torturas, exílios”, afirmava o documento, sem citar textualmente as ditaduras. Para tratar dos regimes militares, a Igreja preferiu referências indiretas. O texto também destacou as “angústias em tantas famílias pelo desaparecimento de seus seres queridos dos quais não podem ter notícia alguma” e pedia, ao final, que a “Igreja, por um autêntico compromisso evangélico, deve fazer ouvir sua voz, denunciando e condenando estas situações, ainda mais quando os governantes e responsáveis se professam cristãos”.

Mas o texto também trouxe fortes críticas contra os dissidentes, principalmente aqueles que haviam recorrido às armas. A declaração final de Puebla condenaria as “angústias pela violência da guerrilha, do terrorismo e dos sequestros realizados por extremismos de distintos signos que igualmente comprometem a convivência social”. O texto final ainda critica os movimentos de esquerda na região. “As ideologias marxistas se difundiram no mundo dos trabalhadores, estudantes, professores e em outros ambientes com a promessa de uma maior justiça social. Na prática, suas estratégias sacrificaram muitos valores cristãos e humanos.”

Se a ação em Puebla foi a mais emblemática em termos externos, a relação entre Arns e a ONU perdurou por vários anos.

Recluso. Atualmente com 91 anos, Arns – arcebispo emérito de São Paulo – leva desde 2007 uma vida reclusa e dedicada às orações no convento das Irmãs Franciscanas da Ação Pastoral, em Taboão da Serra.

5 comentários sobre “As forças ocultas na Igreja e uma hierarquia que se deixa instrumentalizar (ou é conivente?): em preparação para Conferência de Puebla, Dom Paulo Evaristo Arns apresentou como seu texto de autoria da ONU.

  1. Em 1981, em entrevista à Interview, FHC explicou a Oswaldo Martins: “A esquerda toda aqui em São Paulo tem votação nos bairros de classe média e classe média alta. Eu verifiquei os dados e descobri que os deputados mais combativos tem a grande votação aí, não na grande periferia” (Fernando Henrique Cardoso, Perspectivas – Idéias e atuação política, Ed. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1983, p. 33) E falando com Judith Patarra, o mesmo FHC foi bombástico em declarar que ser intelectual é “ser subservivo” (Ib. p. 45) Tanto FHC quanto Lula vieram, portanto, do mesmo substrato ideológico: a subversão.

    Afinal, FHC e Lula se conheciam desde 1972, em São Paulo, quando ele já atuava no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), financiado por recursos vindos da ONU. O mesmo FHC conta que na transição dos anos 70-80, no esforço de subverter e mudar a sociedade (e sua mentalidade), a Igreja Católica foi uma das esferas escolhidas para — de modo gramsciano, de infiltração lenta e cirúrgica — o germe da subversão agir.
    E naquele contexto (início do processo de redemocratização), investimentos foram feitos para transformar Lula no monstro político que é hoje. O que esteve em jogo nas greves do ABC, onde despontou Lula no cenário brasileiro, foram os primeiros experimentos do amálgama de forças para subverter o Brasil e chegar ao caleidoscópio que primeiro iludiu, e depois absorveu e fez a substância pastosa que hoje transformou a política num jogo de frankesteins.
    De “estranhos morais” que se chocaram naqueles tempos sedutores, chegamos à amoralidade perigosa, preparando terreno para uma ditadura muito mais corrosiva, porque sem rosto, que age por dentro do sistema, manipulando, enganando, destruindo almas, despessoalizando e tornando a sociedade palco de um show bizarro, como indivíduos sem vida dançam narcotizados, os embalos de thriller.
    Naquele período, a Igreja Católica começou então a ser instrumentalizada, e muitos contribuíram para isso. Talvez daí a importância do abraço de Dilma Roussef no Cardeal Arns, justamente no período pré-eleitoral, de uma disputa em São Paulo, onde o PT quer fincar de vez lá, no território governado Dom Paulo, nos anos estratégicos da ascensão de Lula. FHC relembra dizendo que foi “no ABC, e especialmente em São Bernardo” (Ib. p. 78), que se deu “o nascimento do espírito da comunitas de modo muito vivo.” E acrescenta: “e é isso que dá à presença da Igreja o fulgor inegável”. Então, a eleição do candidato do PT ou do PSDB representa apenas dois lados de uma mesma moeda.
    Mas, de novo, enganam-se os que pensam que o bispo instiga e o cardeal comanda. A Igreja Católica fornece apenas a moldura; dentro desta o espírito que frutifica é o da igualdade mística num nós coletivo que dissolve momentaneamente hierarquias”. (Ibidem) O fato é que, desde aqueles tempos em que FHC e Lula panfletavam juntos nas ruas, a Igreja no Brasil foi instrumentalizada para viabilizar um projeto político que tanto FHC quanto Lula estiveram comprometidos desde o início, e que a adesão a Maluf para eleger Haddad significou o passo decisivo “para fortalecer o projeto político, que está dando certo”, conforme afirmou Haddad em entrevista coletiva nos jardins da mansão de Maluf. O que antes era perspectiva, hoje é projeto político que está dando certo.

    A influência vem de fora

    Numa conversa que tive com Fernando Henrique, em sua casa, em 1988, ele me disse que trabalhou nos Estados Unidos “num local chamado Institute for Advanced Study (Instituto de Estudos Avançados)”. E explicou: “Este instituto foi criado na década de 30 para Albert Einstein, por ocasião de sua estada lá, e hoje é um grande instituto de estudos avançados (…) com uma pequena seção de Ciências Humanas, cujo estimulador naquela época era o professor Albert Goldsmidt, que é muito amigo meu, e o José Serra (que trabalhava conosco).

    Fui lá então duas vezes. Passei dois períodos da minha vida lá, no que eles chamam de think bank (Banco do pensamento). Você fica lá, não tem nada a fazer, a não ser uma vez por semestre uma palestra na hora do almoço. Isso supõe que eles recrutam pessoas que tenham capacidade de elaboração intelectual” (Os Caminhos de Fernando Henrique, no Jornal da Tarde, Caderno de Sábado (entrevista), 29.10.1988.)

    O processo não é muito diferente do que aconteceu na Europa, por exemplo, quando também lá as instituições acadêmicas foram tomadas, ainda no início do século XX para a difusão do marxismo.
    Foi assim que FHC foi recrutado por um think bank, para gestar a subversão que anos depois ajudaria a promover, primeiramente via CEBRAP (que “começou fazendo pesquisas sobre a população” ( Brigitte Hersant Leoni, Fernando Henrique Cardoso – O Brasil do Possível, Editora Nova fronteira, Rio de Janeiro, 1997, p. 158), depois como senador, ministro e, enfim, Presidente da República, até entregar muito satisfatoriamente o poder ao presidente-operário, transformado em raposa das raposas, em lobo blindado pela imprensa. E, aos poucos, o lobo foi engolindo, um a um, as víboras da arena política, até chegar aonde está hoje, como uma (ainda faminta por mais poder) ratazana bem sofisticada. Significativo foi ver o afã de Dilma Roussef (a ventríloqua de Lula) em ser a primeira Chefe de Estado a abraçar Bergoglio, no dia seguinte à Missa de inauguração de pontificado. Não é a toa também que o Secretário-Geral da ONU está feliz da vida com a performance do atual Bispo de Roma. Quem sabe na Jornada Mundial da Juventude, conseguem avançar o que queriam na Rio+20. Sempre muito sutilmente.

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  2. Cada vez mais se faz urgente a leitura o livro que o Papa Francisco, quando era Cardeal, claro – agora é outro! :) – não gosta nem um pouco: PODER GLOBAL E RELIGIÃO UNIVERSAL, Juan Claudio Sanahuja, Buenos Aires, Argentina.

    Link para consegui o livro: http://www.ecclesiae.com.br/Temas-Controversos/Poder-Global-e-Religi%C3%A3o-Universal/flypage.tpl.html

    Autor: Juan Claudio Sanahuja

    Descrição: A crise da Igreja é grave. Tenho a impressão de que não se esconde de ninguém que o cataclismo social – que afeta o respeito à vida humana e à família – tem essa triste situação como causa. Michel Schooyans afirma, sem nenhuma dúvida, que a Nova Ordem Mundial, “do ponto de vista cristão, é o maior perigo que ameaça a Igreja desde a crise ariana do século IV”, quando, nas palavras atribuídas a São Jerônimo, “o mundo dormiu cristão e, com um gemido, acordou ariano”.

    (…) Soma-se à atitude vacilante de muitos católicos a ditadura do oliticamente correto, muito mais sutil que as anteriores e que reivindica a cumplicidade da religião, uma religião que por sua vez não pode intervir nem na forma de conduta nem no modo de pensar. A nova ditadura corrompe e envenena as
    consciências individuais e falsifica quase todas as esferas da existência umana.

    A sociedade e o estado excluíram Deus, e “onde Deus é excluído, a lei da organização criminal toma seu lugar, não importa se de forma descarada ou sutil. Isto começa a tornarse evidente ali onde a eliminação organizada de pessoas inocentes – ainda não nascidas – se reveste de uma aparência de direito, por ter a seu favor a proteção do interesse da maioria”.

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  3. É o fim do “diálogo inter-religioso”, ou “interreligioso” – uma das “pastorais” acalentadas pela CNBB? (esta grafa o vocábulo nas duas formas).

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  4. HÁ MUITAS DÉCADAS QUE A IGREJA ESTÁ CONTINUAMENTE INFILTRADA DE COMUNISTAS, MAÇONS E PROTESTANTES.
    Lembram-se do caso do bispo de Kiev que faleceu junto ao grande Pio XII?
    È apenas um dos exemplos muitos existentes por aí, como a Teologia da Libertação que se originou fraudulentamente de interpretações tendenciosas do Vaticano II e se transformou numa formidável força de conversão de milhões de pessoas no Brasil e mundo afora no marxismo, usando partidos políticos como o PT, assim como do PSDB de que se difere por ser gramsciano, e ele do esquema stalinista, agressivo, de militancia ativa e desordeira e ainda usa a bandeira de cinco pontas vermelha que é o pentagrama satânico.
    Desde D Hélder que a Igreja no Brasil vem se juntando aos marxistas, havendo alguns bispos junto a ele que lhes deram imensa força, como D Arns, D Casaldáliga, D Balduíno, Dom José M Pires e outros da CNBB ou dos que permaneceram silentes ante a infiltração comunista etc., e que colaboraram substancialmente nas eleições do PT, de igual forma os dissensos Boff/Betto e Cia e centenas de sacerdotes Brasil afora e grande número de leigos que cairam nas farsas de amor preferencial aos pobres via teorias subversivas dos marxistas, especialistas em mudarem de forma sutil as mentes das pessoas.
    Creio que esses que se comportaram como raposas foram os grandes estímulos de ascensão e ainda de manutenção dos comunistas no Brasil.
    Não foi à toa que Dilma foi abraçar o “compañero” D Arns, que enviou a seu comparsa Fidel Castro a carta: “Meu queridíssimo Fidel”…
    Coube ao magnífico, mas odiado papa Bento XVI mostrar ao mundo os putrefatos intestinos de todos que cultuavam os comunistas e pretensos cuidados pelos marginalizados – Cuba, Coreia do Norte, China que o digam – daí ser execrado pela grande imprensa mundial atribuindo-lhe todo tipo de calúnias e difamações possiveis.

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