Igreja anti-militante.

Por FratresInUnum.com, 28 de maio de 2020 – Atribui-se ao General Carl Clausewitz a famosa ideia de que “a maior vitória sobre o inimigo é fazê-lo desistir de lutar”. Mas, nas atuais condições de guerra assimétrica, não se trata mais de conseguir tal objetivo, mas de obter algo muito mais diabólico: a vítima não deve apenas desistir de lutar, mas deve introjetar o discurso do inimigo como se fosse o seu próprio discurso, deve ela mesma criminalizar a sua auto-defesa e se auto-impôr a mordaça e a prisão. Deve não somente conformar-se com sua destruição, mas procurá-la como um valor.

É esta a atitude psicológica da esmagadora maioria de padres e bispos durante essa quarentena. A rendição voluntária, espiritualmente ressignificada, entendida como valor intrínseco, elevada ao nível da virtude heróica… No fundo, a covardia moralmente transfigurada na máxima coragem e imolação.

Os fieis não conseguem entender. Para eles, defender a fé, a liberdade de culto, o direito de receber os sacramentos está acima de tudo. Nenhuma precaução, por necessária que seja, deveria, em sua mente, obscurecer o fato de que os bens sobrenaturais estão – desculpem-nos a redundância – sobre os bens naturais.

O colaboracionismo complacente e educadíssimo dos bispos foi muito bem respondido ontem pelo governo paulista com a notícia de que as Igrejas serão contempladas no encerramento da quarentena, apenas na última fase, a começar em 20 de julho — serão, ao todo, 120 dias, 4 meses, um terço do ano em que os fieis serão totalmente privados dos sacramentos, encontrando em quase todos os seus pastores palavras de rechaço teologicamente escoradas, como se solicitar a assistência sacramental fosse uma heresia ou, no mínimo, uma falta de sentido social.

Em outras palavras, quanto mais a cúpula da Igreja for subserviente ao poder do Estado, mais o Estado avançará sobre os seus direitos que, em última análise, são os direitos de seus fieis. Não houve período anterior na história em que o poder político fosse tão invasivo a ponto de suprimir ou pretender regular o culto público. Mas o punhal, desta vez, foi abraçado voluntariamente pela própria vítima: não se trata tanto de um homicídio, mas de um suicídio politicamente oportuno, da desistência compulsiva a sobreviver.

A Igreja Católica sempre foi vítima de perseguições ao longo da história. Os protestantes, desde o século XVI, passando pelos revolucionários do século XVIII, infligiram-lhe a maior campanha de difamação de todos os tempos. Acusada das maiores atrocidades, mesmo quando a documentação histórica o desmente, a Igreja teve a sua reputação inteiramente manchada justamente por causa de uma tímida autodefesa, a qual deu lugar, na pena dos teólogos modernos, a um meaculpismo vergonhoso, que fez a Igreja vestir a camisa-de-força da culpa e da vergonha oficialmente, assumindo a posição de vilã. Ante o mentiroso triunfalismo iluminista, cuja imagem de superioridade intelectual foi estupidamente sustentada até o dia de hoje, a verdadeira superioridade científica, humanitária e sobretudo espiritual, efetivamente demonstrada na prática pelo brilhantismo excepcional de bons cristãos, ficou completamente obnubilada pela narravista vitoriosa.

A hierarquia católica, em toda sua postura durante a pandemia, dá a impressão de se prostituir de maneira ilimitada ao capricho de ditadores desqualificados que a querem manter de todos os modos submissa, como uma escrava masoquista, disposta a lhes satisfazer todos os gostos. E exige de seus fieis o silêncio cúmplice, a passividade de quem desistiu de ser aquilo que é: Ecclesia militans, Igreja militante.

Enfatize-se que não estamos, de forma alguma, negando a preocupação justa e legítima de se previnir a doença, sobretudo para proteção daqueles mais vulneráveis. O que se deve lamentar é o lockdown completo em praticamente toda a Igreja do Brasil, em que não se busca conciliar a saúde da alma com a do corpo. Quantas pessoas se estão perdendo eternamente nestes dias? Quantos se sentindo abandonados? Quantos que não retornarão, justamente porque não conservam em sua alma a fortaleza da fé e precisam da assistência de pastores que se recolheram deliberadamente, confessando-se não essenciais para a vida de ninguém, apresentando-se como desnecessários e irrelevantes?

Se os governantes pensam não precisar dos sacramentos e o fazem com a quase total sujeição dos bispos, nós lhes mostraremos, como o profeta Daniel ante o ídolo de Nabucodonosor, que não lhes dobraremos os nossos joelhos.

Importa-nos não rendermos os nossos braços e guerrearmos por Nosso Senhor e por Nossa Senhora. Eles são os nossos testemunhos! E é por causa deles que nunca desistiremos, mesmo que os nossos pastores nos tenham deixado sozinhos. Eles receberão a justa recompensa por sua omissão, que não será a recompensa dos pastores, mas o castigo dos mercenários.

16 comentários sobre “Igreja anti-militante.

  1. Estava eu pensando se os médicos, enfermeiros, técnicos e outros tbem fizessem como a Igreja se acorvadando e saindo do cenário… como ficaria a situação?! Só o corpo precisa de acompanhamento?! E a alma não existe???!!! Será q a Igreja q tem um rebanho entregue em suas mãos não teme o juízo de Deus?! Vão dar contas a Ele porque muitas almas estão se perdendo… q triste exemplo a Igreja está dando… Lamentável!!!

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  2. Caro autor,
    Obrigada por se prestar a dar voz a este grito de horror diante desta traição q nos remete ao grande engano sedutor profetizado como a prova para o rebanho fiel.Não é?
    Estamos sob a gestão do medo por falta de fé na Verdade as nações receberão a parte q lhes cabe na grande Apostasia.
    O escândalo desta epidemia é justamente o serviço q presta a apostasia. Creio q ser isto o castigo dos soberbos chamado de eficácia do erro.

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  3. OK, estão evidentes os desmandos dos pastores!

    Ao povo católico, cabe fazer o seguinte Exame de Consciência:

    Em que eu sou culpado nessa crise toda da Igreja?

    Como eu tenho contribuído para esta situação de coisas?

    Eu tenho ajudado de alguma forma estes bispos e padres que agem e são verdadeiros lobos?

    Eu tenho procurado me instruir nas verdades eternas e resistir a toda potestade contrária aos mandamentos de Deus?

    Tenho frequentado Igrejas heréticas e auxiliado o seu sustento com dinheiro e outros bens mais?

    Tenho ajudado padres e bispos inimigos da fé católica?

    Tenho frequentado cultos profanadores e pecaminosos como Missa Nova e Liturgias da Palavra?

    Tenho buscado pureza e santidade aonde elas não existem?

    Em que as consequências de meus atos contribuem para a desedificação da Igreja e da fé verdadeira?

    Só existe lobo porque existem ovelhas. Tenho sido ovelha de lobos ou ajudado outros a serem?

    Que culpa eu tenho nesta crise da Igreja?

    Tenho favorecido as reformas proibidas ou sido conivente com as mesmas?

    Tenho ajudado padres e bispos hereges a se manterem no exercício do ministério?

    Que tipo de padres e bispos eu tenho apoiada? Por quanto tempo?

    Ato de Contrição…

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  4. Lamentável nossa Igreja aceitar essa intromissão!!! Mas os verdadeiros cristãos sabem q nunca conseguirão exterminar com Ela!!! Rezemos e façamos penitência para q continuemos firmes na Fé .

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  5. Se tudo isto apontado não se resumisse nas profecias de Fátima seria uma prova de que a aparição N.Senhora seria uma lenda.
    Ao gerar a apostasia dentro da Igreja, por conseguinte, é gerada também a covardia, mero corolário de tudo.

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  6. Ótima análise. É triste, mas muitos mais enxergarão a realidade: estão órfãos. A igreja pós moderna (i.é: a igreja conciliar) faliu.

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  7. A presente “mentalidade” concernente à dispensação dos sacramentos explica-se facilmente: por décadas, nos seminários, ensinou-se que é preciso esvaziar (!) os sacramentos do que dizem ser o seu “valor mágico”; segundo essa visão, os sacramentos sao entendidos, pelos fiéis, como espécies de “magia do clero”. O fiel vai à igreja e, sem compromisso algum de vida, ou, mais precisamente, sem empenho algum na “luta pela construção do reino que também é nosso”, participa da “magia” dos sacramentos recebendo-os dos ministros ordenados. Em vista disso, para se superar essa perspectiva “primitiva” e “magica” seria preciso desconstruir os sacramentos da sua pretensa condição “mágico-individualista” e recolocar a “práxis sacramental” sob outra perspectiva, “adulta” e “consciente”, a saber, horizontal, isto é, sem um “ministro-mago” específico que detenha o poder de dispensar os sacramentos, esvaziando-os de qualquer “virtus” intrínseca “in re”. Por outras palavras, é a “comunidade” que “celebra” os sacramentos; alguém da comunidade exerce a “presidência” ou “funcionaliza” o que ela “celebra”. E o que a comunidade celebra? A si mesma! Celebra as suas “dores e alegrias”. Os sacramentos seriam, em última instância, simbolos, nao mais dos mistérios de Cristo, como queria Lutero, mas simbolos da comunidade, a qual, no fundo, é o próprio Cristo: um Cristo impessoal, transpessoal, imanente, oculto no homem, e maximizado ou potencializado na congregacao reunida. É o culto do homem. Nao podemos esquecer que Paulo VI, em seu discurso de encerramento do “Concílio”, declarou que a Igreja, doravante, tinha “o culto do homem”.

    Ademais, convem lembrar que a análise marxista, empregada na eclesiologia (?!), levou a apontar o clero como “expropriador” dos fieis ao reservar para si os “meios de produção”, os sacramentos. Eis ai também, expressamente, uma tese fundamental do calvinismo seja no que respeita aos sacramentos, seja no que respeita ao papel historico da Sé de Roma em relação às Igrejas particulares no Ocidente: Roma teria expropriado a liberdade das igrejas locais.

    Essa digressão um tanto longa quer dizer o seguinte: houve uma depressão valorativa da importância dos sacramentos. Os bispos dao voz a tal mentalidade.

    Nao deve espantar que embora tantos bispos não professem expressamente as monstruosidades acima descritas, no entanto sao tributários da mentalidade geral que as instilou no clero.

    Nao importa a origem da doença. Muitas patologias conjugam agentes diversos. O que importa é que o “concílio” desemboca justamente nisso: uma igreja que se proclamou não-necessária e que tira as consequências dessa premissa.

    Operatio sequitur esse.

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    1. Se vc mora em Imperatriz, reze em casa o Terço. É melhor. Talvez esses padres nem acreditem muito em Missas e Sacramentos mesmo ou em coisas sobrenaturais.

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  8. Eu só queria saber de uma coisa: tem algum sacerdote incomodado com essa situação de Católicos ficarem sem poder assistir Missas e receber sacramentos? A impressão q dá é q somente os leigos tão sofrendo com isso (única exceção q me lembro é o Pe. Paulo Ricardo).

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  9. Parabéns pela fala corajosa que reflete a mais dura e triste realidade do nosso tempo. Parte considerável da hierarquia rendeu-se a César, virando as costas para os fiéis e sua missão. Tempos vergonhosos.

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  10. Boa noite.
    Embora em comentário anterior tenha elogiado a coragem e a lucidez do artigo, de maneira a pacificar minha consciência perante Deus, informo que embora tenha compreendido a metáfora contida no seguinte trecho:
    “A hierarquia católica, em toda sua postura durante a pandemia, dá a impressão de se prostituir de maneira ilimitada ao capricho de ditadores desqualificados que a querem manter de todos os modos submissa, como uma escrava masoquista, disposta a lhes satisfazer todos os gostos.” Não a achei de bom gosto e jamais a incluiria em um texto de minha autoria, embora considere o restante do texto muito bom com uma ou outra pequena ressalva.
    Abraço.

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